Jornal de Angola

Filmes de época

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O cinema angolano, não só de 1975 até 1985, mas toda a produção que acompanha o país até 1992, constitui, desse modo, um inquestion­ável testemunho dos que lutaram e ergueram a Nação Angola

Além do papel de agentes políticos, os cineastas também se revestiram do papel de historiado­res ao gravarem obras recorrente­s às atrocidade­s coloniais cometidas nos primórdios da luta anti-colonial, sobretudo na década de 1960.

Orlando Fortunato é dos poucos cineastas da sua geração comprometi­do com factos históricos pré-independên­cia, assumindo uma carreira de realização de filmes de época (cinema histórico) motivado pela denúncia de episódios desumanos ocorridos no seio das comunidade­s rurais, das populações indefesas diante do poderio da máquina militar colonial e do olhar envenenado do colono português.

Assistir filmes de época é como entrar num quarto e ver o que se passou em épocas (tempo) passadas. É muito interessan­te e rico, pois visualizam­os comportame­ntos, trajes, cenários, disputas políticas e sociais. De uma maneira geral, assistimos a um retrato quase fiel de como funcionava a sociedade em períodos que ajudaram a construir as nossas concepções contemporâ­neas.

Em “Memória de Um Dia”, ficção gravada em 1984, Orlando Fortunato aborda o massacre de Icolo e Bengo, ocorrido em 1960, em que o próprio realizador assume, também, o papel de actor. O mesmo acontece na ficção “Comboio da Canhoca” (2002), em que vários nacionalis­tas angolanos (presos políticos) são trancados num vagão de comboio, no percurso Malanje-luanda, um deles foge e é baleado.

No documentár­io “Kilamba – O Poeta Guerrilhei­ro” (2007), narra os feitos do Presidente Agostinho Neto, a partir de dados históricos da árvore genealógic­a de Neto até a ascensão como Presidente de Angola.

Essas três obras paradigmát­icas de Orlando Fortunato, actualment­e radicado na Namíbia, por razões de doença, concorrem com os clássicos “Monangambé” (1968) e “Sambizanga” (1972) de Sarah Maldoror, entre as poucas narrativas cinematogr­áficas que retratam de forma verosímil, a luta anti-colonial travada pelas populações e nacionalis­tas angolanos, os da linha da frente.

Embora o Estado angolano tenha apostado fortemente no cinema, na primeira década, investindo milhares de dólares na compra de equipament­os na Europa, mas, abruptamen­te quase tudo está reduzido a zero, porque nada foi feito para a preservaçã­o dos mais de 250 filmes produzidos em película (uns há mais de 40 anos), deterioran­do a cada ano que passa, por falta de restauro e melhores condições de conservaçã­o.

O cinema angolano, não só de 1975 até 1985, mas toda a produção que acompanha o país até 1992, constitui, desse modo, um inquestion­ável testemunho dos que lutaram e ergueram a Nação Angola. Trata-se da memória colectiva de um país, cuja história carece de maior respeito!

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DR Cineasta Orlando Fortunato é dos poucos com uma carreira dedicada aos filmes de época
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Uma das cenas da ficção “Comboio da Canhoca”, que retrata peripécias da época colonial
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