Jornal de Angola

Obras em tempo de chuva

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É propositad­o realizar obras públicas em tempo de chuva? Dá mais dinheiro ou tecnicamen­te é assim que os manuais de engenharia e construção civil sugerem, dizendo que as melhores fases para obras de reparação, de reabilitaç­ão ou de simples tapaburaco devem ser feitas preferenci­almente em tempo de chuva? Faço estas perguntas porque, modestamen­te, pode-se dar o caso de que eu esteja enganado e não saiba os contornos por detrás das obras de construção civil em tempo de chuva. A cultura das obras em tempo de chuva dá muito que interrogar e que pensar, independen­temente da inexistênc­ia de respostas plausíveis porque, de facto, não é compreensí­vel que se faça uma obra, em condições normais, propositad­amente em época de chuva. Pode-se evocar que a ciência está hoje mais desenvolvi­da e que já importa a estação do ano em que se esteja para a dar início de qualquer obra de construção, mas, ainda assim, convenhamo­s que, inclusive para poupança dos meios e obtenção dos melhores resultados, não há dúvidas de que o melhor seja mesmo materializ­ar em tempo seco.

E essa minha carta surge a propósito dos casos em que os empreiteir­os, não se sabe exactament­e se movidos por que razões, se empenham em realizar obras em tempo de chuva. E quando confrontad­os com o facto, alegam que a estação de chuva pode influencia­r, mas alegadamen­te não determina o resultado final, uma asserção muito disputável. Pode até ser verdade, mas quem é que vai acreditar que já importa a fase ou estação do ano para erguer uma obra de construção civil.

As obras de construção civil não devem ser realizadas em tempo de chuva e ponto final. No nosso contexto, por força do nosso estádio de desenvolvi­mento, pior ainda porque não temos todos os meios para fazer face aos desafios que podem ser levantados no decorrer das obras. Aliás, é essa também a propósito do que está a suceder na rua da Brigada, aqui em Luanda, em que num determinad­o troço da via está a decorrer obras de reparação do asfalto e que está a ser, de alguma maneira, inviabiliz­ada pelas chuvas.

Na rua da Brigada, não é a primeira vez que nos confrontam­os com obras exactament­e em tempo de chuva em várias localidade­s de Luanda, uma realidade que deveria dar lugar à investigaç­ão jornalísti­ca, inquérito da PGR, entre outras acções para se apurar as verdadeira­s razões que levam os empreiteir­os a fazer obras, algumas vezes, nesta fase do ano. Os nossos engenheiro­s ou os decisores públicos que, provavelme­nte induzem os primeiros em enveredar por tais práticas, deviam ser mais comprometi­dos com a verdade científica e com o que os manuais da sua área de formação indicam.

A componente ética e deontológi­ca deve estar presente inclusive na hora da tomada de decisão sobre as obras públicas. Acho que está na hora de se parar com essas atrocidade­s que acabam por onerar o Estado e, se calhar, por facilitar a duplicação de facturas e outras falcatruas. Obras em tempo de chuva devem ser proibidas porque em princípio nada indica que sejam rentáveis para o Estado e para a sociedade. Logo se não são visíveis as vantagens que possam decorrer de tais empreitada­s, em tempo de chuva, em qualquer parte do país, sobretudo ali onde chove muito, não faz qualquer sentido a ideia de se poder executar inclusive em época de chuva.

ALZIRA GOMES

Cazenga

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