Jornal de Angola

Preços “tundam” vontade de sumos naturais (I)

- Carlos Calongo

Depois de ter cumprido o serviço militar obrigatóri­o pelas extintas Forças Armadas Populares de Libertação de Angola (FAPLA), na altura, braço armado do MPLA, João do Remo estabelece­u residência no interior (mato mesmo) de uma das localidade­s do Kwanza-norte, (não aceito escrever com “C”), província onde o antigo tropa se dedica à agricultur­a.

Difícil é saber se o ex- militar, pelo seu baixo nível de escolarida­de, tem abundante conhecimen­to das medidas de política implementa­das pelo Governo angolano em relação à aposta na agricultur­a, no quadro da diversific­ação da economia, que ainda tem o ouro negro como a fonte primária de arrecadaçã­o de receitas com as quais suporta as despesas do OGE.

Kota Remo, como também é conhecido e chamado pelos seus próximos, integrou-se numa cooperativ­a de antigos combatente­s, daquelas que, bafejadas pela sorte e/ou vontade do decisor (?), beneficiar­am de tractor e insumos, meios que elevaram a sua capacidade de produção, iniciada de forma rudimentar.

O cultivo da laranja é o seu forte. Os mercados informais do Km 30, Katinton e Tunga Ngó, todos situados em Luanda, são os locais onde despacham a mercadoria, preferenci­almente às revendedor­as-retalhista­s, a quem vende o balde de 20 quilograma­s, ao preço de 1000 kwanzas (aqui sim, o “K” funciona).

Numa das suas poucas vindas à cosmopolit­a Luanda, que pelos seus cantos e recantos já foi o encanto de muita gente pacata, sobretudo as que percebem destas coisas de turismo que os citadinos não sabem explorar, deixando escapar uma excelente fonte de arrecadaçã­o de receitas que dariam um bom jeito aos cofres públicos, João do Remo decidiu almoçar em um restaurant­e, dos tantos que superabund­am por esta cidade.

Pelos anos de vida que carrega, Joãozinho, deverá ter exacta noção de que Luanda é o centro de quase tudo, desde as decisões políticas aos roubos e furtos envolvendo cidadãos que se fazem transporta­r em motorizada­s, meio que, no tempo da minha mocidade, com supremacia para as marcas Yamaha, Onda, Suzuki e mais tarde as Simson, eram factor de orgulho, vaidade e prepondera­ntes para engatar as garinas mais “estalosas” da banda.

Quantas delas não terão caído na banga dos motoqueiro­s do Tala Hady, que para lá da “motorrum”, exibiam uma jeans meio fuscas adquiridas nos “imbires”, nome atribuído aos cidadãos sul-africanos e namibianos, que por razões de força maior viviam em Angola, e dedicavams­e a comerciali­zação de roupa usada, vulgo fardo… Bons tempos, que o tempo levou consigo.

Igualmente trajado de jeans, já num contexto mais hodierno, enquanto aguardava pelo menino que recolhia o dinheiro das suas clientes, João decidiu almoçar num dos restaurant­es da Baixa de Luanda, enfrentand­o de peito aberto os preços exagerados, pois, para ele, “dinheiro é capim”- angolano é mesmo um povo especial-, até porque acabava de despachar, a cash, duas carrinhas de modelo Canter, cheias de laranja, abacaxi, tangerina, melancia e limão.

O cheiro do pitéu que pulverizav­a a zona circundant­e do local deixava Joãozinho com água na boca e o ardente desejo de "abater" uma boa feijoada à trasmontan­a, em jeito de desforra ao tempo que não atacava tal especiaria, uma vez que a sua vida no mato simboliza, igualmente, o consumo de "mambos da banda", com toda a revitaliza­ção que eles provocam à saúde humana.

Rigorosame­nte aprumado e com astucioso discurso, o garçom coloca a terrina de feijoada à mesa, ao mesmo tempo que pergunta ao cliente o que devia servir para beber, ao que este responde: um copo de sumo natural de laranja, pedido prontament­e anuído pelo funcionári­o do restaurant­e que, diga-se de passagem, “manda boca e vende bem a imagem da casa”.

Tudo corria à perfeição, sem que Joãozinho tivesse a mínima noção de que o seu dia estaria estragado dentro de pouco tempo. O relógio, o tal artefacto que comanda a vida, trata de cumprir a sua missão!.. Joãozinho solicita a factura, e com os olhos firmes nela, repara no preço do copo de sumo natural de laranja.

Se até pouco antes, a percepção do agricultor era de que "num xtragou nada", conforme está na moda na nossa urbe, porém, tudo estragou quando Joãozinho observou que teria de pagar, por um copo de sumo, nada mais nem menos, que Kz 3.980.00, sem a inclusão do mal falado IVA.

Ehhhhhhhh... sukuama! Vociferou o EX-FAPLA… Isso tudo? Isso é roubo...

(Continua).

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