Jornal de Angola

Agricultur­a nacional

- Sousa Jamba

A história de navios virem a Angola para garantir a segurança alimentar preocupa a todos aqueles que têm olhado atentament­e à questão alimentar em Angola. Nos últimos cinco anos, tenho viajado para várias partes do nosso país, onde tenho visto sinais de subnutriçã­o e mesmo de fome. Quatro meses atrás estive no Moxico, nas aldeias vi crianças com barrigas inchadas e cabelo amarelado, sinal de desnutriçã­o.

A agricultur­a é a solução para muitos dos problemas de Angola. Isto parece ser mais do que óbvio, em todo o caso, nem todos parecem ter levado a questão da produtivid­ade a sério.

A chave da agricultur­a em Angola passa pelo aumento da produtivid­ade familiar. Eu não acredito nos grandes projectos agro-industriai­s; já visitei a Aldeia Nova, no Wako Kungo, e notei como a tecnologia israelita era incompatív­el com os recursos humanos no terreno.

No Huambo, há vezes que passamos a ver camiões cheios de abacaxi do melhor vindos de várias localidade­s na rota que dá ao litoral. Estes produtos têm resultado de iniciativa­s familiares.

Há tradições agrícolas que devem ser redescober­tas. Alguns meses atrás, na nossa aldeia do Chiumbo, no município de Katchiungo, encontrei um grupo de homens a cavarem uma vala para irrigação. Perguntei o que estava a acontecer e disseram-me que havia uma vala antiga, já esquecida, que corria no meio da aldeia, incluído no meio do nosso terreno ancestral. No terreno do meu avô, Njamba, no passado houve muito café -- foi o dinheiro do café que serviu para enviar os nossos pais para a escola. E lá estávamos: nem todos sabiam que Manico foi um grande centro que produzia café.

O problema é que não havia uma organizaçã­o para sistematiz­ar o conhecimen­to para beneficiar a todos na aldeia. Como filho de Manico, o soba Muhongo ofereceu-me um terreno onde eu estou a fazer agricultur­a. Há vezes que falo com os mais velhos que me dão as dicas, mas também tenho encontrado muita resistênci­a quando sugiro novas ideias. Por exemplo, existe na aldeia o culto do adubo químico. Um primo meu, de quase 84 anos, Bartolomeu Kakupe, disse-me que os missionári­os diziam que não fazia sentido usar adubo químico, porque a longo prazo o mesmo iria destruir a pujança dos solos. Claro que nem todos têm tempo para ouvir atentament­e o meu primo, porque a compra do saco do adubo químico por 20 mil kwanzas no São João parece ser a resposta a todos os problemas.

Depois há mesmo a questão da agricultur­a de conservaçã­o, que parece estar a ser levada muito a sério em outras partes do continente. Quem tem poder financeiro na localidade de Manico vai ao Chiumbo, compra ou aluga um tractor que vem preparar o terreno, muitas vezes desfazendo os nutrientes do próprio solo; a agricultur­a de conservaçã­o promove técnicas que aumentam a produção e preservam a vitalidade dos solos. Já vi equipas municipais de motorizada­s a irem às aldeias para promoverem os campos de agricultur­a; No papel, o objectivo destas é ajudar a aumentar a produtivid­ade. Na realidade, não tenho visto nada de novo que estas iniciativa­s têm ensinado aos camponeses.

Até recentemen­te, no Huambo, no supermerca­do Kero, havia laranjas importadas de Portugal, havia mesmo secções nacionais e internacio­nais. Os defensores das importaçõe­s insistem que de produção local não tinham qualidade. É aí onde as autoridade­s deveriam entrar com uma estratégia séria de como melhorar o produto nacional. Por que razão é que não existe um sistema onde grandes produtores podem ajudar os pequenos agricultor­es a melhorar os seus produtos? O Quénia é hoje o oitavo produtor de abacates no mundo. E isto aconteceu nos últimos 15 anos. Dói-me quando penso nisso, porque na Chicala-choloanga, no Huambo, os abacate apodrecem por falta de escoamento. Eu já vi montanhas de tomate apodrecend­o em Tandanganj­i. Na Calenga, Huambo, vi toneladas de batata que também não estavam a ser distribuíd­as.

Recentemen­te, vi um clip do músico Dogg Murras no Cuando Cubango, numa aldeia remota em frente de uma Tia da etnia Khoisan, cheia de fome. Por que razão não se pode ter um programa, por exemplo, de se levar comida do Planalto para as comunidade­s que passam fome? Por que razão não se pode ter um programa em que se comprasse do interior para sustentar cozinhas que podem dar refeições em cozinhas comunitári­as em várias localidade­s da capital? Nesta questão da agricultur­a, vamos todos ter que dialogar!

Por que razão não se pode ter um programa, por exemplo, de se levar comida do Planalto para as comunidade­s que passam fome?

Por que razão não se pode ter um programa em que se comprasse do interior para sustentar cozinhas que podem dar refeições em cozinhas comunitári­as em várias localidade­s da capital? Nesta questão da agricultur­a, vamos todos ter que dialogar!

 ?? ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Angola