As crónicas, a sociedade e os leitores
Ano após ano, tenho pensado muito em como, enquanto cronista interessado em falar sobre temas da actualidade, puder satisfazer um espectro cada vez maior de leitores. Talvez fosse óptimo abordar diferentes temas e de maior interesse público: é preciso abrir o leque de possibilidades e, por isso, não me admiraria que alguns de vocês (sem sacanices) aparecessem aqui com as suas luzes e as suas sombras, para servirem-nos de espelho e podermos aumentar as opções que escolher, no rio da vida.
Se de um modo um pouco cínico eu penso nisso é porque, entre outras coisas, um dos grandes dilemas com que se confrontarão os comentadores dos programas de televisão e os cronistas de jornais, como este (e outros), será o de como, neste ano de eleições gerais, ter o suficiente tino, coragem e lucidez de, mesmo pertencendo a um partido político específico, - ao seu partido do coração, ao seu partido das matas, ao seu partido das trafulhices ou, ainda, ao seu partido que agora faz parte de uma frente patriótica, tanto faz -, ser capaz de registar, documentar, narrar, analisar e ou interpretar a complexidade do mundo e da Angola de hoje, evitando a parcialidade e o “instinto básico”, para sobreviver e ou para aparecer.
Na verdade, martelando um pouco mais o prego à madeira, sucede com os cronistas o mesmo que ao cidadão comum: não há um só assunto de interesse público, tema por debater e analisar, problema social por resolver, lei por retocar e ou regulamento por afinar sobre o qual não exista uma data de opiniões, critérios de especialistas, sugestões, dados científicos ou experiências sociais comprovadas (umas mais conhecidas do que outras) que, de serem divulgadas, nos levariam a alcançar uns pontos de equilíbrio, consensos mais sólidos e um “contrato” que, em longo prazo, nos permitiria – utópicos que continuamos a ser - viver numa melhor e mais bela harmonia social.
Acontece, porém, que não sei bem por que carga de água, onde é que e, também, quando foi que, entre nós, começaram a disseminaremse, ao ponto de tornar-se predominante, ao menos, as três tendências nada úteis: a primeira dela é a que se caracteriza por tendermos a caucionar e a valorar tendências comportamentais, de atitudes, de fixação de signos e símbolos culturais que, sendo elas próprias se não residuais ao menos discutíveis, conseguem ser hegemónicas a tal ponto de laminar todas as outras pelo simples facto de estarem à margem das classes económicas, sociais e políticas mais poderosas.
A segunda destas tendências que se instalaram como cancro entre nós é a de geralmente bem aceite de mentir, de ocultar com fins nímios, de dizer meias verdades, de falar do que não é o essencial evitando o que, de modo responsável, deveria e deve ser falado e discutido seriamente entre várias pessoas, ou mesmo no seio de uma comunidade específica – associações de profissionais liberais, colectivo de artistas, ordens, agrupamento de vizinhos, partidos políticos, entre outras - e optar pelo silêncio, a tendência a aparentar mais do que a ser e a assumir o que se é.
O que penso ser a terceira tendência é a da falta de lealdade. Claro, se sabemos ou presumimos que os nossos interlocutores estão a mentir, não ser assertivos ou inclusive, não estão a actuar de boa-fé, agravado que, que podem estar a fingir, que podem “simular comportamento”, que podem nos mentir é muito difícil, então, sermos leais uns aos outros porque cada um parte de bases erróneas e têm uma ideia preconcebida do outro que não pode ser das melhores e, por conseguinte, a priori, não estamos preparados para ter essa conversa franca que precede à confiança que podemos e devemos ter uns com os outros.
2022 é um ano que, de certa forma, faz-me recordar o ano de 1992. Há “tantíssimas” coisas em jogo que, eu estou curioso em lidar com as personagens reais e fictícias (na e para além da política) que virão povoar cada crónica: quem sabe se não seria bom fazer circular ideias que são vossas, trouxer o lado mais útil e necessário de todos à luz dos holofotes, contribuir para que as ideias relevantes de gente brilhante ou, também, gente decadente ressoem aqui.
Será interessante apercebermo-nos qual é o efeito ao tornar público e dissecar os nossos vícios, os nossos fantasmas, as nossas caricaturas, os nossos infinitos dilemas, as nossas improváveis virtudes (idem aspas), mas, também, tudo o que têm no seu avesso: saber bem como é que estas pessoas pensam e como funciona, qual a trajectória profissional que têm e qual o respectivo background intelectual: interessa-me as atitudes dos seres que me rodeiam, elas ajudam-nos a compreender a sociedade em que estamos.
Será interessante apercebermo-nos qual é o efeito ao tornar público e dissecar os nossos vícios, os nossos fantasmas, as nossas caricaturas, os nossos infinitos dilemas, as nossas improváveis virtudes (idem aspas), mas, também, tudo o que têm no seu avesso: saber bem como é que estas pessoas pensam e como funciona, qual a trajectória profissional que têm e qual o respectivo intelectual