INS colecta menos de 90 unidades de sangue e Luanda gasta 300 por dia
A situação preocupa os responsáveis de instituições sanitárias do país, por sentirem incapacidade para dar respostas a todos os casos que chegam aos hospitais
O Instituto Nacionalde Sangue (INS) colecta apenas, em média, cerca de 80 a 85 bolsas de sangue por dia, números considerados insuficientes para atender à procura nas unidades sanitárias do país, como considerou a sua directora.
Deodeth Machado, que falava no quadro das comemorações do Dia Mundial do Dador de Sangue, que hoje se assinala, realçou, por exemplo, que só a província de Luanda, capital do país, consome, diariamente, mais de 300 unidades do produto.
Em exclusivo ao Jornalde Angola, a directora do INS avançou que as 80 ou 85 unidades têm sido disponibilizadas, maioritariamente, por dadores familiares, longe da meta indicada pela Organização Mundial da Saúde (OMS), que defende que pelo menos um por cento da população de um país deve ser dador voluntário.
A responsável do INS informou que o país tem, actualmente, um total de 16.650 dadores de sangue, sendo dez mil familiares, correspondendo 83%, e 6.650 voluntários.
Este défice de dadores voluntários no país deve-se, em grande medida, à pouca cultura da doação de sangue. “Por isso, o INS tem estado a trabalhar de forma afincada com os órgãos de comunicação social para alertar a população sobre a importância deste gesto na redução de muitas mortes, ocorridas nos hospitais, centros e postos de saúde do país.
“Só os humanos podem e devem doar, e quem o faz, de forma regular, ajuda a salvar mais de uma vida”, enfatizou Deodeth Machado, para acrescentar que é importante a mobilização de mais dadores voluntários, por serem estes que quase sempre cumprem com todos os requisitos estabelecidos pela OMS.
Sobre os requisitos, a directora do INS destacou a idade acima dos 18 anos, peso além dos 60 quilos, boa saúde, sem comportamentos de risco, não serem usuários de drogas, nem anémicos.
Quanto à regularidade da doação, a especialista em Hemoterapia explicou que os homens devem doar pelos menos trimestralmente e as mulheres a cada quatro meses por ano. No caso das senhoras, não podem estar grávidas nem a amamentar.
“Muitas vezes, esses requisitos só são cumpridos na íntegra por parte de dadores voluntários, porque são pessoas que doam sem presão, de forma descontraída e fazem-no de coração, porque não sabem a quem vão doar, é simplesmente uma boa acção”.
A especialista em Hemoterapia explicou que o limite estabelecido pela OMS, para que cada pessoa doe sangue é de 450 mililitros por sessão de doação. E cada unidade ou bolsa de sangue pode ser usada para transfundir quatro pacientes, se forem adultos e cinco, caso sejam crianças.
Distribuição nas unidades de saúde
Questionada sobre o processo de distribuição às várias unidades do país, Deodeth Machado explicou que Angola tem 193 serviços de hemoterapia, sendo o órgão reitor o INS, que, além da colheita, em grande medida, realiza os despistes da malária, hepatite A, HIV/SIDA e outras doenças sexualmente transmissíveis.
O INS fornece sangue e abastece, directamente, os hospitais Pediátrico David Bernardino, Américo Boavida, Josina Machel e Geral de Luanda, assim como o Centro Nacional de Oncologia, por serem unidades com muitas valências, que realizam cirurgias de grande complexidade e precisarem de mais bolsas de sangue.
Os demais centros provinciais de hemoterapia trabalham de forma autónoma, embora existam algumas unidades hospitalares que, também, fazem este serviço de recolha de sangue e apenas levam o produto aos centros para serem devidamente testados.
É o mesmo que está a acontecer com o Hospital Américo Boavida, que, aos poucos, tem já feito as suas próprias colheitas de sangue. “Por isso, estamos a formar mais técnicos de Hemoterapia e a melhorar algumas condições de trabalho, para que as tarefas comecem a ser descentralizadas e diminuir a procura no INS, que, assim, pode ter um stock considerado para atender situações de pico”.
Problemática da venda nos hospitais
Sobre o processo de comercialização de sangue em várias unidades de saúde, a médica disse ser um assunto muito complexo de se abordar, tendo em conta que, apesar de se afirmar a existência do problema, nunca se denunciou, oficialmente, ao INS.
“Nós não recebemos, nem de forma institucional nem individualmente, mesmo que no anonimato, alguma queixa sobre a comercialização de sangue nos hospitais protagonizada por algum técnico”, disse Deodeth Machado.
A directora realçou que a instituição só pode agir com denúncias e provas da existência do problema. Desta forma, as pessoas que praticam tais acções já teriam sido encaminhadas às autoridades competentes para serem responsabilizadas criminalmente.
“Trata-se de um crime, porque uma transfusão de sangue descuidada pode ser um canal para que alguém morra ou seja infectado por várias doenças”, chamou a atenção, para acrescentar que “só se deve transfundir o produto devidamente testado e que se tenha respeitado o período de janela, para se evitar o transporte de qualquer infecção”.
Sangue da rua desaconselhado
Durante o período de janela no processo de doação de sangue, a directora explicou que leva-se algum tempo determinado para ver se não escapa nada. “Se algum produto estiver infectado e for doado, hoje, deve-se respeitar este intervalo, porque algumas doenças se manifestam depois de um tempo. Se assim não for, a pessoa que receber o sangue, mesmo dando primariamente negativo, corre sérios riscos de ser contaminado”.
Por isso, em desrespeito a esse conjunto de normas de procedimentos, Deodeth Machado considerou que o sangue comprado nas ruas é um grande risco para quem o recebe. Em função da possível existência de sangue a ser comercializado em locais impróprios, a directora ressaltou a importância de se ter dadores informados e voluntários, conscientes e com responsabilidade do acto que praticam.
“Não é só do nada que nos países mais desenvolvidos, os dadores são 100% voluntários”, destacou a médica.
Mais sobre a data
O Dia Mundial do Dador de Sangue é comemorado, anualmente, a 14 de Junho, com o objetivo de homenagear todos os dadores e consciencializar os não-dadores sobre a importância deste acto, que é responsável pela salvação de milhares de vidas.
A data foi criada por iniciativa da Organização Mundial da Saúde, em 2014, e o dia escolhido é uma homenagem ao nascimento de Karl Landsteiner ( 14 de Junho de 1868 - 26 de Junho de 1943), um imunologista austríaco que descobriu o factor Rh e várias diferenças entre os diversos tipos sanguíneos.