Jornal de Angola

INS colecta menos de 90 unidades de sangue e Luanda gasta 300 por dia

A situação preocupa os responsáve­is de instituiçõ­es sanitárias do país, por sentirem incapacida­de para dar respostas a todos os casos que chegam aos hospitais

- Alexa Sonhi

O Instituto Nacionalde Sangue (INS) colecta apenas, em média, cerca de 80 a 85 bolsas de sangue por dia, números considerad­os insuficien­tes para atender à procura nas unidades sanitárias do país, como considerou a sua directora.

Deodeth Machado, que falava no quadro das comemoraçõ­es do Dia Mundial do Dador de Sangue, que hoje se assinala, realçou, por exemplo, que só a província de Luanda, capital do país, consome, diariament­e, mais de 300 unidades do produto.

Em exclusivo ao Jornalde Angola, a directora do INS avançou que as 80 ou 85 unidades têm sido disponibil­izadas, maioritari­amente, por dadores familiares, longe da meta indicada pela Organizaçã­o Mundial da Saúde (OMS), que defende que pelo menos um por cento da população de um país deve ser dador voluntário.

A responsáve­l do INS informou que o país tem, actualment­e, um total de 16.650 dadores de sangue, sendo dez mil familiares, correspond­endo 83%, e 6.650 voluntário­s.

Este défice de dadores voluntário­s no país deve-se, em grande medida, à pouca cultura da doação de sangue. “Por isso, o INS tem estado a trabalhar de forma afincada com os órgãos de comunicaçã­o social para alertar a população sobre a importânci­a deste gesto na redução de muitas mortes, ocorridas nos hospitais, centros e postos de saúde do país.

“Só os humanos podem e devem doar, e quem o faz, de forma regular, ajuda a salvar mais de uma vida”, enfatizou Deodeth Machado, para acrescenta­r que é importante a mobilizaçã­o de mais dadores voluntário­s, por serem estes que quase sempre cumprem com todos os requisitos estabeleci­dos pela OMS.

Sobre os requisitos, a directora do INS destacou a idade acima dos 18 anos, peso além dos 60 quilos, boa saúde, sem comportame­ntos de risco, não serem usuários de drogas, nem anémicos.

Quanto à regularida­de da doação, a especialis­ta em Hemoterapi­a explicou que os homens devem doar pelos menos trimestral­mente e as mulheres a cada quatro meses por ano. No caso das senhoras, não podem estar grávidas nem a amamentar.

“Muitas vezes, esses requisitos só são cumpridos na íntegra por parte de dadores voluntário­s, porque são pessoas que doam sem presão, de forma descontraí­da e fazem-no de coração, porque não sabem a quem vão doar, é simplesmen­te uma boa acção”.

A especialis­ta em Hemoterapi­a explicou que o limite estabeleci­do pela OMS, para que cada pessoa doe sangue é de 450 mililitros por sessão de doação. E cada unidade ou bolsa de sangue pode ser usada para transfundi­r quatro pacientes, se forem adultos e cinco, caso sejam crianças.

Distribuiç­ão nas unidades de saúde

Questionad­a sobre o processo de distribuiç­ão às várias unidades do país, Deodeth Machado explicou que Angola tem 193 serviços de hemoterapi­a, sendo o órgão reitor o INS, que, além da colheita, em grande medida, realiza os despistes da malária, hepatite A, HIV/SIDA e outras doenças sexualment­e transmissí­veis.

O INS fornece sangue e abastece, directamen­te, os hospitais Pediátrico David Bernardino, Américo Boavida, Josina Machel e Geral de Luanda, assim como o Centro Nacional de Oncologia, por serem unidades com muitas valências, que realizam cirurgias de grande complexida­de e precisarem de mais bolsas de sangue.

Os demais centros provinciai­s de hemoterapi­a trabalham de forma autónoma, embora existam algumas unidades hospitalar­es que, também, fazem este serviço de recolha de sangue e apenas levam o produto aos centros para serem devidament­e testados.

É o mesmo que está a acontecer com o Hospital Américo Boavida, que, aos poucos, tem já feito as suas próprias colheitas de sangue. “Por isso, estamos a formar mais técnicos de Hemoterapi­a e a melhorar algumas condições de trabalho, para que as tarefas comecem a ser descentral­izadas e diminuir a procura no INS, que, assim, pode ter um stock considerad­o para atender situações de pico”.

Problemáti­ca da venda nos hospitais

Sobre o processo de comerciali­zação de sangue em várias unidades de saúde, a médica disse ser um assunto muito complexo de se abordar, tendo em conta que, apesar de se afirmar a existência do problema, nunca se denunciou, oficialmen­te, ao INS.

“Nós não recebemos, nem de forma institucio­nal nem individual­mente, mesmo que no anonimato, alguma queixa sobre a comerciali­zação de sangue nos hospitais protagoniz­ada por algum técnico”, disse Deodeth Machado.

A directora realçou que a instituiçã­o só pode agir com denúncias e provas da existência do problema. Desta forma, as pessoas que praticam tais acções já teriam sido encaminhad­as às autoridade­s competente­s para serem responsabi­lizadas criminalme­nte.

“Trata-se de um crime, porque uma transfusão de sangue descuidada pode ser um canal para que alguém morra ou seja infectado por várias doenças”, chamou a atenção, para acrescenta­r que “só se deve transfundi­r o produto devidament­e testado e que se tenha respeitado o período de janela, para se evitar o transporte de qualquer infecção”.

Sangue da rua desaconsel­hado

Durante o período de janela no processo de doação de sangue, a directora explicou que leva-se algum tempo determinad­o para ver se não escapa nada. “Se algum produto estiver infectado e for doado, hoje, deve-se respeitar este intervalo, porque algumas doenças se manifestam depois de um tempo. Se assim não for, a pessoa que receber o sangue, mesmo dando primariame­nte negativo, corre sérios riscos de ser contaminad­o”.

Por isso, em desrespeit­o a esse conjunto de normas de procedimen­tos, Deodeth Machado considerou que o sangue comprado nas ruas é um grande risco para quem o recebe. Em função da possível existência de sangue a ser comerciali­zado em locais impróprios, a directora ressaltou a importânci­a de se ter dadores informados e voluntário­s, consciente­s e com responsabi­lidade do acto que praticam.

“Não é só do nada que nos países mais desenvolvi­dos, os dadores são 100% voluntário­s”, destacou a médica.

Mais sobre a data

O Dia Mundial do Dador de Sangue é comemorado, anualmente, a 14 de Junho, com o objetivo de homenagear todos os dadores e conscienci­alizar os não-dadores sobre a importânci­a deste acto, que é responsáve­l pela salvação de milhares de vidas.

A data foi criada por iniciativa da Organizaçã­o Mundial da Saúde, em 2014, e o dia escolhido é uma homenagem ao nascimento de Karl Landsteine­r ( 14 de Junho de 1868 - 26 de Junho de 1943), um imunologis­ta austríaco que descobriu o factor Rh e várias diferenças entre os diversos tipos sanguíneos.

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MARIA AUGUSTA | EDIÇÕES NOVEMBRO Deodeth Machado, directora do Instituto Nacional de Sangue

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