Em 100 anos saberemos
E, afinal, o suposto antivax radical Jair Bolsonaro vacinouse ou não contra a Covid? “Sigilo de 100 anos por razões de segurança do presidente e da sua família”. Numa rede social, um apoiante, meio desconfiado, perguntou-lhe: “Presidente, por que em todos os assuntos polémicos, você põe sigilo de 100 anos? Existe algo para esconder?”. Bolsonaro respondeu. “Em 100 anos saberá”
Sem futuro na vida militar, Jair Bolsonaro pulou, em 1988, para a política a defender a ditadura, a tortura, os extermínios e tudo o mais que sugerisse sangue e morte. Para os propagar, usou participações em talk shows onde regurgitava as suas opiniões, sem contraditório, gerando um misto de horror e riso nos espetadores, mas arregimentando, em paralelo, um nicho de adeptos suficiente para se ir elegendo deputado por anos.
Em 2018, entretanto, por força de um conjunto de fatídicas circunstâncias já aqui enumeradas, esse nicho tornou-se um buraco de 55,13% dos eleitores do Brasil. E o mau militar, fã de ditadores, torturadores e homicidas que antes servia de mero entretenimento tragicómico, subiu a rampa do Planalto.
Pelo menos, pensou-se, por força da função agora terá de enfrentar o contraditório. Mas não.
Começou, já antes de eleito, por fugir dos debates: foi aos dois primeiros, mas ao terceiro, quando surgiu o adversário mais competitivo, Haddad, decidiu começar a faltar. “Não participará em mais nenhum”, anunciava, a 22 de Agosto de 2018, o coordenador de campanha. Passados 16 dias, a célebre facada de Juiz de Fora tornou-se o álibi perfeito.
Na presidência, escolheu três formas de se comunicar: em entrevistas a pivôs domados de canais amigos; por lives no Facebook; e ao vivo, mas só defronte de uma horda de seguranças e fãs acéfalos, que hostilizam o primeiro jornalista que se intrometa.
Muito de vez em quando, durante uma motociata, uma lanchaciata ou umjeguiata(as ações de campanha de moto, de lancha ou de jegue que vem fazendo ao longo do mandato em vez de trabalhar), um ou outro repórter conseguiu gritar uma pergunta avulsa por trás da horda de seguranças e fãs acéfalos sobre a desvalorização recorde da moeda,
a recomendação de remédios sem eficácia contra a Covid ou os cheques recebidos pela primeiradama de um notório corrupto.
E Bolsonaro lá respondeu, finalmente, à imprensa. Nestes termos: “Cala a boca!”, “Vocês atrapalham o Brasil!”, “Vá para a p****...”, “Minha vontade é encher a tua boca de porrada!”, “Você tem uma cara terrível de homossexual”.
A única solução para se confrontar Bolsonaro é, então, pelo “acesso à informação”, lei aprovada por Dilma em 2011 “para aproximar a Administração Pública do cidadão”.
Os jornais tentaram saber, pela lei, quantas reuniões o presidente teve com uma dupla de pastores evangélicos que distribuía verbas para a Educação aos municípios em troca de barras de ouro. Resposta do Planalto: “Por razões de segurança do presidente e da sua família, decretamos sigilo de 100 anos sobre o tema”.
Eo Filho 03, líder do ministério do ódio, o gabinete anexo à sala presidencial onde se fabricam fake news, quantas vezes se reuniu com o pai presidente? “Sigilo de 100 anos”.
O ex-ministro da Saúde, general Eduardo Pazuello, participou em manifestação pró-bolsonaro, o que é vedado a militares na ativa, qual o ponto da situação do seu processo? “Sigilo de 100 anos”.
E, afinal, o suposto antivax radical Jair Bolsonaro vacinou-se ou não contra a Covid? “Sigilo de 100 anos por razões de segurança do presidente e da sua família”.
Numa rede social, um apoiante, meio desconfiado, perguntou-lhe: “Presidente, por que em todos os assuntos polémicos, você põe sigilo de 100 anos? Existe algo para esconder?”. Bolsonaro respondeu. “Em 100 anos saberá”.