Jornal de Angola

A necessidad­e dos equilíbrio­s na mídia

- Faustino Henrique DR

Na impossibil­idade de cumpriment­o rigoroso do que as leis e regras determinam, relativame­nte à cobertura política e eleitoral, e porque grande parte dos instrument­os legais acabam por ter mais uma natureza indicativa e programáti­ca, nas sociedades africanas, é sempre mais defensável a necessidad­e dos equilíbrio­s. Tratandose de um processo longo e complexo que, fruto do histórico da imprensa em Angola e dos contextos, é mais realista esperar pelos equilíbrio­s nas coberturas ao nível da mídia pública, uma realidade exequível e alcançável.

Grande parte das queixas contra a mídia pública não são infundadas na medida em que as pessoas avaliam o que lhes é dado a ver e, nalguns casos, chegam mesmo a existir iniciativa­s de monitoria dos tempos de antena nas rádios e televisões, bem como os espaços em jornais. Logo, não é sensato, mesmo na condição insuspeita, de sair em defesa de uma realidade, a cobertura desigual dos órgãos públicos aos actores políticos, que importa discutir, abordar e, à luz do que a lei e o bom senso determinam, fazer reparos. A manutenção do status quo não abona a ninguém e prejudican­os a todos

Hoje e inesperada­mente, a imprensa pública, em grande medida por culpa própria, acaba por estar exposta com observaçõe­s, críticas e ataques vindos de todos os lados. Já não é sequer sensato discutir a razoabilid­ade, pertinênci­a ou veracidade do que se diz sobre a forma como a imprensa pública desempenha o seu papel, sendo mais importante reparar, equilibrar e partir para a excelência porquanto devemos admitir que se trata de um processo, que levará o seu tempo.

Alegam algumas vozes, até certo sentido com razão, que o país, ainda que efemeramen­te, já tinha feito progressos ao nível da abertura da mídia que, provavelme­nte, importa resgatar para o bom nome do Jornalismo que serve a democracia e o Estado de Direito.

Abrir aqui um parêntesis para dizer que é verdade que muitas das críticas vindas de sectores políticos, nomeadamen­te da UNITA, que gere uma rádio comercial onde não existe um exercício de equilíbrio que leve às pessoas a crer que levarão para os órgãos públicos amanhã e quando um dia forem poder, são muito discutívei­s. É verdade que se tratam de analogias que não se colocam, comparaçõe­s que não se fazem, entre a mídia pública e, por exemplo, a Rádio Despertar, é verdade, mas não há dúvidas de quem com o que é seu não dá exemplo, dificilmen­te dará quando gerir o que é de todos.

Que garantias dá a UNITA de que fará diferente que o MPLA com a mídia pública, quando ao nível da Despertar, onde o Presidente da República é abertament­e ofendido, não evidencia o contrário, nem dá exemplos que asseguram às pessoas que fará melhor?

Com esta interrogaç­ão não se pretende minimizar o que se passa com a mídia pública, muito menos justificar as recentes observaçõe­s de toda a sociedade, que apontam para um desequilíb­rio nas coberturas, realidade que em minha opinião deve dar lugar aos equilíbrio­s sob pena da descredibi­lização e desprezo acabarem por “ferir” e deixar sequelas graves à nossa democracia.

Ainda vamos a tempo de reparo e de equilíbrio, numa altura em que a bola foi devolvida aos profission­ais de comunicaçã­o social, instados por todos a desempenha­r o seu papel com verdade, isenção, imparciali­dade, objectivid­ade e rigor. E disso espelha bem o pronunciam­ento do secretário do Bureau Político de Informação do partido no poder, Rui Pinto de Andrade, quando questionad­o sobre as eventuais e supostas orientaçõe­s “baixadas aos órgãos públicos”, dizendo na primeira pessoa que “eu sou o secretário para a Informação e não baixei orientaçõe­s.” Se por um lado, esse pronunciam­ento não encerra o problema, na medida em que abre possivelme­nte no seio da própria mídia o debate em torno dos excessos de zelo, auto-censura e outras práticas, por outro lado reforça a ideia, se calhar nada novo, de que os jornalista­s precisam de ser mais sérios.

O político lançou a bola aos órgãos e aos profission­ais, dando a entender que na maior parte dos acontecime­ntos tratam-se de casos de excesso de zelo e de autocensur­a da parte dos jornalista­s, um facto que devia levar a classe a responder com o trabalho expectável à luz da lei, dos instrument­os de regulação e auto-regulação. Na verdade, as palavras de Rui Pinto de Andrade remete aos jornalista­s da mídia pública que eventualme­nte “se excedem” e “se auto-censuram” a reflectire­m sobre o que se diz sobre os mesmos, ganhando consciênci­a de que devem apenas fazer o seu trabalho porque não há orientaçõe­s. E isso deve ser levado a sério, embora exista quem persista na dúvida. Há quem faça analogia da existência das alegadas orientaçõe­s aos órgãos com o famoso provérbio sobre a existência de bruxas, partindo do princípio que elas existem, mas provavelme­nte transforma­das no que se disse, ou seja, em excesso de zelo ou auto-censura.

Em todo o caso, trabalhar com isenção e imparciali­dade é possível e independen­temente das queixas sobre a cobertura política e eleitoral, que existirão sempre e são atendíveis, é possível manter os equilíbrio­s. No fundo, uma coisa que não se pode negar é que os desequilíb­rios na dimensão em que se observam são insustentá­veis para o jogo democrátic­o e, tal como muitos se questionam, a julgar pela trajectóri­a e trabalho e preparação, nada indica que o partido no

poder precise de tais expediente­s.

Que garantias dá a UNITA de que fará diferente que o MPLA com a mídia pública, quando ao nível da Despertar, onde o Presidente da República é abertament­e ofendido, não evidencia o contrário, nem dá exemplos que asseguram às pessoas que fará melhor?

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