Jornal de Angola

Advogados apresentar­am ontem as questões prévias

Audiência foi marcada pela observação de questões prévias, momento em que os advogados aproveitar­am para solicitar a presença de altos funcionári­os do Estado para ajudar a esclarecer assuntos ligados à condição de alguns arguidos

- Gabriel Bunga |

O primeiro dia do julgamento do designado "caso Lussati", decorrente da operação Caranguejo, conduzida pela PGR, ficou marcado, ontem, pelas questões prévias, onde os advogados começaram a pôr em prática a estratégia para conduzirem o processo a favor dos seus constituin­tes, e se mostraram confiantes.

Nos termos da Lei Processual Penal, os advogados apresentam ao tribunal aquel as questões que podem impedir o conhecimen­to do mérito da causa. O advogado Jorge Golfo Afonso, que representa o arguido Joaquim José Armando, foi o mais polémico por levar mais de uma hora a apresentar várias questões, tendo "enfurecido" o juiz.

Por várias vezes o juizpresid­ente da causa teve de parar o advogado e esclarecer que era necessário ser sintético e ter em conta o número elevado de advogados a intervir no processo, sendo certo que estão acima dos 40. A atitude do advogado Jorge Golfo Afonso deixou a plateia irritada, que pediu em uníssono, ao advogado para parar. O juiz-presidente usou do seu poder soberano para interrompe­r a audiência, conseguind­o um intervalo de uma hora.

Ojornaldea­ngola, no entanto, tentou ouvir o advogado Jorge Golfo Afonso, mas este disse que não estava em condições de prestar declaraçõe­s à imprensa. O mesmo deixava transparec­er as emoções fortes, uma vez que se apresentav­a visivelmen­te trémulo. A audiência, iniciada no período da manhã, prolongou-se noite a dentro.

O "caso Lussati" surge na sequência da implementa­ção da política de combate à corrupção e má gestão da coisa pública, pelo Presidente da República, João Lourenço, desde 2017, altura em que assumiu a liderança do Estado angolano.

Presença de declarante­s

Anastácia de Melo, advogada de Pedro Mulhongo, justificou que solicitou a presença do actual ministro de Estado e chefe da Casa Civil do Presidente da República, Adão de Almeida, apenas por este estar presente no período da bancarizaç­ão dos salários do pessoal afecto à Casa de Segurança do Presidente da República. A ideia, esclareceu, é perceber com a ajuda do ministro de Estado porque

o seu cliente não recebe os ordenados até à data, apesar de as suas contas estarem desbloquea­das. Fez saber que a situação se agrava pelo facto de o seu constituin­te

ser "arguido solto" e encontra-se a trabalhar.

"As famílias estão a passar por sérias necessidad­es", enfatizou a advogada. Os defensores justificar­am que

a presença dos antigos titulares do Ministério das Finan

ças, assim como a da actual

ministra Vera Daves, tem a ver pura e simplesmen­te pelo facto de a instituiçã­o ser a responsáve­l pela gestão das receitas e despesas públicas. Nesta ordem, é justificad­a, também, a presença da presidente do Tribunal de Contas, Exalgina Gamboa, por a instituiçã­o que dirige ter a missão de fiscalizar as contas do Estado.

Durante a sessão do exercício das questões prévias, ficou claro que o recurso,

por solicitaçã­o, de altos titulares de cargos públicos responde à necessidad­e de esclarecer situações à volta do processo, mas que estão fora do âmbito processual ligado directamen­te à matéria em julgamento. A natureza j urídica, em substância, quanto ao que está sob julgamento, não remete para as figuras convocadas na condição de declarante­s.

Os advogados de defesa pretendem, assim, com a

presença no julgamento de altas figuras resolver pontos prévios, para se avançar com as questões directamen­te ligadas ao processo em julgamento. Foram solicitado­s, para efeito, o antigo ministro de Estado e chefe da Casa de Segurança do Presidente da República, Pedro Sebastião, da presidente do Tribunal de Contas, Exalgina Gamboa, do ministro de Estado e chefe da Casa Civil do Presidente da República, Adão de Almeida, dos antigos ministros das Finanças, desde 2008, nomeadamen­te Pedro de Morais, Carlos Alberto Lopes, Armando Manuel, Archer Mangueira e a actual ministra das Finanças, Vera Daves.

Apontaram, nas alegações, que os antigos e actuais altos funcionári­os de Estado arrolados, apesar de não estarem ligados ao processo, estão em condições de esclarecer determinad­as situações. Com a mesma perspectiv­a, foi solicitada, também, a Direcção Principal de Pessoal e Quadro das FAA, para juntar ao relatório do grupo Executivo ALFA de cadastrame­nto presencial e recolha de dados biométrico­s na Casa Militar do Presidente da República.

A apresentaç­ão de questões prévias foi marcada por momentos de tensão entre advogados e o corpo de júri liderado pelo juiz Andrade da Silva.

Júlio Laurindo Chongolola é outro cidadão que esteve no CCT, tendo reconhecid­o que o início do julgamento do "caso Lussati" foi muito esperado pela sociedade. "Para aquilo que é a nossa expectativ­a como cidadãos, haverá muita coisa que vai ser descoberta ao longo desta sessão de julgamento, e esperamos que tudo decorra conforme a lei", sublinhou.

A sociedade angolana espera que se reponha a legalidade. Na verdade, é uma soma muito avultada, e isto é para desincenti­var aqueles cidadãos que, quando forem indicados para um cargo público, sejam desestimul­ados a enveredare­m por essa prática", disse.

Os advogados Yuri Pascoal e Osvaldo Carlos Salupune entendem que o Ministério Público cometeu várias irregulari­dades na fase de instrução preparatór­ia, e é por essa razão que a fase de questões prévias, operada em sessão de julgamento, está a levar muito tempo.

Os arguidos Pedro Lussati, Fernando Moisés Dumbo e mais 47 elementos são acusados de crimes de peculato, associação criminosa, recebiment­o indevido de vantagens, participaç­ão económica em negócios e abuso de poder.

Os arguidos ainda são acusados de fraude no transporte ou transferên­cia de moeda para o exterior do país, introdução ilícita de moeda estrangeir­a no mercado nacional, comércio ilegal de moeda, proibição de pagamentos em numerário, retenção de moeda, falsificaç­ão de documentos, branqueame­nto de capitais e assumpção ou atribuição de falsa identidade.

Os 49 réus e seus mandatário­s judiciais comparecer­am ontem no Centro de Convenções de Talatona (CCT), num ambiente de calma e tranquilid­ade. As partes arrolaram um número de testemunha­s, contadas acima de 200 pessoas. Por razões de exiguidade do espaço de julgamento, a sala de audiência da Secção Criminal do Tribunal de Comarca de Luanda - Palácio D. Ana Joaquina, foi indicado o Centro de Convenções de Talatona para dar lugar as audiências públicas.

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CONTREIRAS PIPAS | EDIÇÕES NOVEMBRO Centenas de pessoas, entre familiares e amigos dos arguidos, assistiram o primeiro dia do julgamento do “caso Lussati”

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