Jornal de Angola

Jovem do Bengo deu sempre prioridade à formação e ao trabalho

Vendeu nas ruas de Luanda para ajudar a mãe e nunca desistiu e hoje tem uma empresa de prestação de serviço

- Rui Ramos

Samuel Carreira Mabiala nasceu no Bengo e é filho de Carreira Mabiala e de Lourdes Pedro Fome. “Boa parte da minha família vive com o que produz no campo. Não tive tempo suficiente para estar com o meu pai, perdio quando tinha um ano, ainda vivíamos no Bengo, numa zona chamada Kibunda”.

Com a morte do progenitor, a mãe de Samuel Carreira Mabiala ficou sem norte e o pai passou a ser o irmão David. “Tivemos de sair de onde estávamos para vir para Luanda”.

Em 2000, vão viver no bairro Paraíso, Cacuaco. “Todos viemos para Luanda, excepto os meus irmãos mais velhos Mabiala e Conceição, que se refugiaram na RDC (República Democrátic­a do Congo), por causa da guerra”.

Com a chegada do irmão mais velho a Angola, Samuel Carreira Mabiala inicia a sua formaça o. “A minha mã e

zungava lambula, saí a do Parai so ate Cacuaco, Ilha e Boavista de madrugada, quase sempre a pé, voltava muito cansada e eu sentia o desgaste dela no rosto e isso doi a-me muito”.

Samuel Carreira Mabiala conta que começou a lavar carros e deixava dinheiro nas coisas da mãe. “Sim, fiz isso, na o queria que me descobriss­em, o meu irma o mais

velho, Mabiala Carreira, nunca gostou de nos ver trabalhar sem antes nos formarmos. Mesmo o meu irma o mais velho na o querendo, fui fazendo coisas que me davam rendimento. De forma escondida fiz muita coisa que gerou algum dinheiro para a compra de lanche na escola, desde os meus 10 anos. Na maioria das escolas que frequentei vendia alguma coisa. Com a experiênci­a de ganhar e perder, comecei a ficar mais forte”.

O e nsino de base de Samuel Carreira Mabiala foi de grande turbulênci­a. Em 2003, frequenta a pré-classe no Colégio Maria dos Céus, no bairro Paraíso. “Não conseguia estudar com um caderno completo, os meus irmãos repartiam um caderno A5 em duas partes iguais, a falta de poder financeiro obrigava-nos a fazer isso”.

Em 2004 estuda na igreja IEA (Igreja Evangélica de Angola), sem assentos, e com apenas uma sala de aula que servia também para os cultos nos domingos. Tinham de estudar ao mesmo tempo com os alunos das outras classes, era muita gente numa só sala, “mas era divertido, os professore­s eram pastores e sabiam transmitir os conhecimen­tos com muita diversão e carinho”.

Já em 2005, no Paraíso, começa a frequentar a 3ª classe, num colégio a 2,5 km de casa. O colégio ainda existe e chama-se Coração Aberto. Repetiu a 3ª classe duas vezes porque o irmão acreditava que ainda precisava de

aprender mais sobre assuntos ligados à mesma classe. Estudou no ano lectivo de 20062 007 no c ol é g i o Peixe Fumado e em 2007-2008 no complexo escolar Deus Vivo, onde ficou até terminar o ensino primário.

De 2012 a 2014 conclui o primeiro ciclo no colégio Mpangui Afonso. Em 2006, recorda, foi chamado para viver com o irmão Mabiala Carreira, serralheir­o, no Kicolo, que ajudou a família a ter o que comer, vestir e estudar. “Fomos ensinados por ele para ajudarmos a fazer o trabalho que ele fazia. Parte dos meus irmãos tornaram-se serralheir­os”.

Depois de concluído o colégio, Samuel Carreira Mabiala quis estar um pouco longe da família para aprender a ganhar a vida. Começou a viver sozinho e mais tarde consegue uma vaga num internato em Cacuaco e com a ajuda do irma o concluiu o ensino té cnico mé dio, em 2017, e logo de seguida, com o que ia acumulando, fez outra formaçã o té cnica. “Esta foi a fase mais difí cil que tive, pois ter de frequentar o ensino superior e fazer a formaçã o médio-té cnica ao mesmo tempo nã o foi nada fá cil. Mas, felizmente, consegui concluir os dois níveis, com muito sacrifício”.

Na frequência do ensino superior, em 2018, Samuel Carreira Mabiala ja vivia sozinho no centro da cidade de Luanda. Vendia rebuçados na turma e nas esquinas da cidade, o que lhe permitiu juntar dinheiro e fechar um contrato com uma senhora que fazia “xamussas”, para vender nas turmas e ao mesmo t e mpo vender tomate no Kicolo.

Mais tarde, cria a associação ASSOMUSIC, com mais de 26 artistas, com o objectivo de os promover e dar a oportunida­de de actuaçã o e gravação de músicas. “Parte dos custos p a g ava c o m o q u e e u ganhava na venda de relógios na cidade”. Já em tempo de confinamen­to, após ser decretado o Estado de Calamidade, oferece uma proposta de negócio a cerca de 10 raparigas. “Vendí amos tomate, cebola, fuba, spaghetti, doces, etc”.

Agora trabalha com o seu companheir­o-irmão Afonso Diambo Matumona, mais conhecido por Elias. “Somos felizes com o que fazemos e estamos juntos no desenvolvi­mento dos nossos negó cios, hoje temos uma firma denominada “Mabs Eventos”, prestamos serviços de decoraçã o, aluguer de materiais festivos, marketing e publicidad­e, gravaçã o de spots publicitá rios, criação de plataforma­s digitais e venda de ingressos. Sou muito sensível, não tenho vergonha de chorar, choro porque as minhas lágrimas me curam de coisas que carrego dentro de mim”, desabafa.

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