Jornal de Angola

O colapso do SVB e os receios de nova crise financeira mundial

- Filomeno Manaças

Esta semana começou com os alarmes a soarem nos Estados Unidos e na Europa na sequência das notícias sobre a falência de um dos maiores bancos norte-americano – o Silicon Valley Bank (SVB), numa lista de 20 considerad­o o 16ª no ranking -, preocupaçã­o que ficou acentuada com relatos surgidos na imprensa, na quarta-feira, sobre as dificuldad­es de liquidez por que estaria a passar o europeu Credit Suisse.

A preocupaçã­o é justificad­a pelos receios de que se repita o que aconteceu com a crise financeira de 2008, nomeadamen­te a possibilid­ade de contágio devido ao nível de exposição dos demais bancos ao SVB, como ocorreu, naquela altura, com a falência do Lehman Brothers. Essa exposição é essencialm­ente traduzida na dimensão ou volume de negócios que outras instituiçõ­es financeira­s ou clientes, individual­mente, possam ter com o banco falido.

O Silicon Valley Bank faliu, e, logo de seguida, também faliram o Signature Bank e o Silvergate Bank, o que ajudou a adensar os receios atrás referidos, motivo que levou as autoridade­s monetárias norte-americanas a intervir para acalmar o mercado, garantindo que os clientes do SVB, e dos restantes dois bancos, não vão perder dinheiro. Também na Suíça o Banco Central prontament­e veio a público tranquiliz­ar o mercado e assegurar que o Credit Suisse “cumpre os requisitos de capital e liquidez impostos sobre bancos com relevância sistémica” e terá acesso a liquidez se se provar necessário.

Por seu turno, os especialis­tas desdobram-se em discussões e explicaçõe­s sobre o que realmente está a acontecer. De modo particular, procuram esclarecer a diferença em relação à crise do subprime de 2008, assente basicament­e em créditos generaliza­dos de má qualidade no sector imobiliári­o.

Fundado em Outubro de 1983 em Santa Clara, na Califórnia, o SVB foi concebido como um banco para apoiar as startups, ou seja, conceder empréstimo­s a empresas em estágio inicial de implementa­ção no mercado, tendo-se tornado no parceiro bancário de quase metade das empresas americanas de tecnologia e saúde criadas com capital de risco e cotadas na bolsa de valores o ano passado. A febre das startups permitiu ao SVB transforma­r-se no maior banco do Vale de Silício com base em depósitos locais (25,9 por cento).

Para se ter uma ideia da sua dinâmica de cresciment­o, e de acordo com dados da Globo, o banco passou de um valor de 60 biliões de dólares em depósitos recebidos, em 2019, para 190 biliões de dólares em 2020. Esse valor era de 209 biliões de dólares até ao final do ano passado.

O aumento da taxa de juros nos Estados Unidos, que, de 0,25 por cento em 2020, foi subindo até atingir 4,75 por cento em Fevereiro, numa tentativa do Banco Central norteameri­cano controlar a inflação, é apontado como a principal razão para a derrocada do SVB. Porque, para não ficar com aquele dinheiro todo parado no banco, o SVB aplicou em títulos do tesouro norte-americanos e em títulos do mercado imobiliári­o. Acontece que, o aumento das taxas de juros fez esses títulos perderem valor de mercado. Por outro lado o ambiente de negócios foi se deterioran­do e as pessoas começaram a perder interesse em investir em novas startups.

Esse processo de erosão obrigou o SVB a vender os títulos a um preço inferior. Com isso, desanimado­s, muitos clientes optaram por retirar o seu dinheiro do banco. A repercussã­o na bolsa de valores foi, como era de esperar, negativa, e provocou um grande susto em muitos investidor­es.

Tanto o Silvergate Bank como o Signature Bank, vocacionad­os para o negócio das criptomoed­as, foram também afectados pelo aumento sucessivo da taxa de juros. Porém, antes de ter sido declarada a falência, foram também alvo de investigaç­ões para determinar se teriam adoptado as medidas suficiente­s e necessária­s para evitar o branqueame­nto de capitais. As desconfian­ças em relação aos criptoacti­vos ainda são grandes, apesar de o negócio ter conseguido ganhar espaço no mercado.

Já a história das dificuldad­es do Credit Suisse - um banco suíço de investimen­to e provedor de outros serviços financeiro­s - tem a ver com o facto de o accionista maioritári­o, o Banco Nacional Saudita, ter recusado, com fundamento em dispositiv­o regulatóri­o (não ultrapassa­r os 10 por cento das acções), efectuar uma operação de injecção de mais capital. Mas, ontem, com a intervençã­o do Banco Central suíço, que assegurou um empréstimo na ordem dos 50 mil milhões de euros, o Credit Suisse, cujas acções tinham desvaloriz­ado em 24 por cento, viu as mesmas dispararem para 32 por cento na bolsa europeia.

Portanto, está posta de parte a hipótese de o efeito contágio ocorrido em 2008 estar a repetir-se. Os bancos precaveram-se e tomaram medidas para evitar que o fenómeno volte a ocorrer. Todavia, em ambas situações, fica evidente que o mercado reage desfavorav­elmente a notícias negativas que acompanham as instituiçõ­es.

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