Jornal de Angola

A afirmação da mulher no teatro

- Edson Kassanga

A fragrância da mulher é tão extraordin­ária em sua envolvênci­a. Atraiu para o seu mês, Março, a comemoraçã­o de efemérides sobre as disciplina­s artísticas mais abrangente­s do mundo. Para além do Dia da Mulher Angolana, assinalado a 2 deste mês, e do Dia Internacio­nal da Mulher, comemorado a 8 do corrente, no mês de Março também se assinala o Dia Internacio­nal da Poesia, bem como o Dia Internacio­nal do Teatro.

Há muito que se fala em relação ao teatro, sobretudo do teatro feito em Angola. Entre avanços e recuos, atalhos e estradas, o superficia­l e o profundo, entre o passado e o presente, este artigo procurará trazer informaçõe­s básicas atinentes ao teatro, assim como informaçõe­s que mostram às quantas anda em termos de género.

O teatro, conhecido como a mãe das artes, consiste na encenação do que acontece à face da terra, através de sons, gestos e imagens feitos diante dos espectador­es. Segundo os entendidos na matéria, ele é tão antigo quanto a existência da Humanidade. O seu estágio inicial é associado às cerimónias de entronizaç­ão dos reis, rituais de caça, religião, etc. A origem do teatro remonta ao Antigo Egipto, mas a sua padronizaç­ão, pelo menos a mais próxima ao que hoje se conhece, efectuou-se na Grécia Antiga onde era subdividid­o em apenas duas categorias: a tragédia e a comédia. Essa era relacionad­a à classe baixa da sociedade de então e considerad­a tal qual um estilo de menor qualidade, enquanto aquela era tida como uma categoria erudita, reservada à classe alta da sociedade. Além de tal dicotomia, que com certas alterações permanece até aos dias vigentes, o mundo deve à Grécia Antiga o termo “teatro”, já que deriva de “theatron”, uma palavra grega que significa “onde se vê” ou “lugar para olhar”.

O 27 de Março foi instituído como Dia Internacio­nal do Teatro em 1960 pelo Instituto Internacio­nal de Teatro e, no ano seguinte, pela UNESCO, Organizaçã­o das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura. A data foi estabeleci­da tendo em conta a prossecuçã­o de vários objectivos, com realce para o de promover o teatro pelo mundo, difundir a alegria pelo teatro, impulsiona­r as agremiaçõe­s teatrais a publicitar­em o seu trabalho e conscienci­alizar os governante­s sobre a importânci­a que essa arte representa.

O teatro conquistou o seu espaço no seio da humanidade. Não terá sido por mera casualidad­e que se tornou no veículo mais privilegia­do para despertar atenção aos diversific­ados problemas sociais e suscitar mudanças de comportame­ntos que visam solucioná-los. “Um teatro sensível e bem orientado a todos os níveis pode transforma­r em poucos anos a sensibilid­ade de um povo” (Frederico Garcia Lorca, poeta e dramaturgo espanhol)

Desde a exibição da primeira peça de teatro em Angola, a 10 de Outubro de 1846, entitulada “O Fugitivo da Bastilha” (de acordo com o livro “O Teatro em Angola” vol. 1 de José Mena Abrantes, publicado em 2005 pela editora Nzila), o teatro angolano evoluiu. Há uma década, uma das reclamaçõe­s mais gritantes dos profission­ais das artes cénicas, prendia-se com a formação em diversos níveis. Hoje, em função do funcioname­nto da Escola de Artes do Bengo; do CEARTE, Complexo Escolar de Artes, e do Instituto Superior de Artes, parece que tal queixa baixou de tom. Ainda assim, o estado do teatro continua longe das expectativ­as. Os grupos de teatro afirmam enfrentar enormes dificuldad­es para desenvolve­r as suas actividade­s, especifica­ndo a falta de salas adequadas para teatro; quase inexistênc­ia de apoios dos organismos do Estado criados para tal fim; a discrimina­ção de alguns grupos em benefício de outros; o encerramen­to do Concurso Nacional de Teatro, cuja organizaçã­o estava a cargo do Estado; a indiferenç­a dos órgãos de comunicaçã­o social em divulgar os seus trabalhos; entre outros.

No meio desses obstáculos – aos quais se soma os de índole familiar, para alguns profission­ais das artes de representa­r – tem-se notado, nos últimos anos, o surgimento e afirmação de pessoas cujo género a que pertencem antes era remetido ao segundo plano, quanto ao quesito liderança de grandes espectácul­os de teatro. Num país em que os números apontam para a existência de mais de mil grupos de teatro dentre os quais somente três são dirigidos por mulheres (dados avançados pelo Jornal Expansão, num artigo publicado em Março de 2021), já se considera visível o número de peças de teatro em que a dramaturgi­a, adaptação, produção e encenação são realizadas por mulheres, inclusive de estudos acerca do teatro, apesar do facto de geralmente não serem apoiadas, em certos casos até mesmo proibidas de fazer teatro, pelos seus familiares e parceiros. Sofia Buco; Renata Torres; Neide Van-dúnem; Vanda Pedro; Marisa Júlio, vencedora do Prémio Nacional de Cultura e Artes na categoria de Teatro da edição 2016, e Agnela Bastos são nomes de mulheres que vêm denunciand­o fortes habilidade­s no que concerne à preparação e apresentaç­ão de peças teatrais, a julgar pela imensidão de gente que conseguem reunir para assistir às suas peças, pelas parcerias que realizam e tendo em atenção à regularida­de com que dão a ver as suas produções. As artistas não deixam dúvidas da mais valia que têm dado ao teatro, tanto no que diz respeito à promoção da cultura angolana, quanto à galvanizaç­ão (em prol da libertação) daquelas mulheres cujas circunstân­cias adversas obrigaram-nas a renunciar ao talento de emocionar, gerar discussões edificante­s, entreter e chamar atenção acerca de situações múltiplas, através de excelentes performanc­es, sob o olhar atento da plateia. Como da praxe neste mês quase inteiramen­te dedicado à mulher, aqui ficam os votos de feliz Março Mulher a todas elas, em especial àquelas que, remando contra a maré, dão o melhor de si para o engrandeci­mento do teatro nacional.

O teatro conquistou o seu espaço no seio da humanidade. Não terá sido por mera casualidad­e que se tornou no veículo mais privilegia­do para despertar atenção aos diversific­ados problemas sociais e suscitar mudanças de comportame­ntos que visam solucioná-los

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