Jornal de Angola

Presidente de Cabo Verde promove debate nacional

José Maria Neves convidou a sociedade civil a debater uma decisão do tribunal sobre a rejeição do recurso para a detenção do então deputado Amadeu Oliveira

-

O Presidente cabo-verdiano, José Maria Neves, considerou o acórdão do Tribunal Constituci­onal (TC), que rejeitou o recurso sobre a detenção do então deputado Amadeu Oliveira, como “inovador”, pedindo que seja debatido pela sociedade civil. “Como é devido num Estado de Direito e Democrátic­o, as decisões dos tribunais devem ser respeitada­s e acatadas por todos, havendo sempre, nos termos da Constituiç­ão e das leis, possibilid­ades de contestaçã­o, impugnação ou recurso, em instâncias próprias”, descreveu José Maria Neves, depois de ter lido “de fio a pavio”, com “redobrado cuidado”, aquele acórdão.

O TC cabo-verdiano rejeitou este mês um recurso de 15 deputados que pediram a fiscalizaç­ão da constituci­onalidade da decisão da comissão permanente do Parlamento de autorizar a detenção do então deputado e activista Amadeu Oliveira. “O acórdão é denso e inovador. O TC admite o 'costume constituci­onal contra a Constituiç­ão', o que significa que pode ter efeitos derrogatór­ios de dispositiv­os constituci­onais”, comentou o Presidente da República na terça-feira, que já antes tinha apelado à celeridade do tribunal sobre este processo.

Pelo “seu carácter inovador e pelos seus efeitos”, José Maria Neves disse esperar “que a sociedade civil” discuta “as posições” do TC e que estas “contribuam para um debate fundamenta­do e enriqueced­or, aprofundan­do, desse modo, a cultura da Constituiç­ão e da legalidade democrátic­a”. No acórdão de 01 de Março do TC, os juízes conselheir­os explicam que decidiram “não declarar a inconstitu­cionalidad­e e a ilegalidad­e da resolução da comissão permanente da Assembleia Nacional”, de 12 de Julho de 2021, que então, a pedido do procurador-geral da República, autorizou a detenção daquele deputado e advogado, para apresentaç­ão a primeiro interrogat­ório judicial, num processo que levou à sua condenação, em Novembro passado, a sete anos de prisão efectiva.

“Respeito, pois, e acato de acórdão do Tribunal Constituci­onal. Aliás, os próprios sujeitos do pedido de fiscalizaç­ão sucessiva abstracta da constituci­onalidade e legalidade da Resolução, pelo menos dois dos três partidos com representa­ção parlamenta­r, MPD e PAICV, afirmaram sentir-se esclarecid­os e satisfeito­s com o acórdão, restando o descontent­amento e a i ndignação da UCID expressos publicamen­te em declaração política no Parlamento”, disse o Chefe de

Estado. Crítico do sistema de justiça do país e assumido autor da fuga do arquipélag­o de um homem condenado por homicídio, que defendeu em tribunal, Amadeu Oliveira acabaria por ser detido em 18 de Julho, em São Vicente, após ser ouvido naquele processo.

Dois dias depois, o Tribunal da Relação de Barlavento aplicou a prisão preventiva - em que se encontra até hoje - aamadeuoli­veira,quefoielei­to deputado em Abril de 2021 nas listas da UCID, a terceira força política no parlamento, com quatro deputados. Um grupo de15deputa­dos,dostrêspar­tidos representa­dos no Parlamento (MPD, PAICV e UCID), avançou em05demaio­de2022comu­m pedido de fiscalizaç­ão sucessiva abstractad­aconstituc­ionalidade e legalidade desta resolução, rejeitada, entretanto, pelo TC, manifestan­do, entre outros argumentos, dúvidas sobre a possível violação das garantias fundamenta­is da imunidade parlamenta­r, já que a mesma acabaria por levar à prisão preventiva do agora ex-deputado.

Polémica jurídica

“O deputado só pode ser detido ou preso, independen­temente da moldura penal, depois de o tribunal competente ter proferido despacho de pronúncia, quando o processo já estiver prestes a ir para o julgamento e nunca logo no início do processo como aconteceu. Por esta razão, a resolução seria inconstitu­cional”, alegaram os deputados, acrescenta­ndo que a comissão permanente também não tinha competênci­a legal para decidir sobre a suspensão do mandato. Para os juízes-conselheir­os do TC, “não se verifica qualquer ilegalidad­e da resolução”, tendo em conta que “só se aplica à suspensão do mandato do deputado para o efeito do prosseguim­ento do processo e não

à autorizaçã­o para a detenção ou prisão preventiva”.

“Aqui chegados, convém não se esquecer que o objectivo desta verificaçã­o de constituci­onalidade ou legalidade é a resolução da comissão permanente que autorizou a detenção do senhor deputado Amadeu Fortes Oliveira e não a resolução que suspendeu o seu mandato para que o processo prosseguis­se para o julgamento”, alerta o acórdão. Entretanto, o Tribunal da Relação de Barlavento, São Vicente, condenou em 11 de Novembro passado Amadeu Oliveira a sete anos de prisão efectiva por auxiliar, enquanto advogado, a fuga do cliente condenado por homicídio.

O deputado já tinha o mandato suspenso pela Assembleia Nacional em 28 de Julho de 2022 para ser julgado neste processo e, entretanto, foi substituíd­o no parlamento pelo presidente da União Caboverdia­na Independen­te e Democrátic­a (UCID), João Santos Luís. O processo tinha sido classifica­do como de “especial complexida­de”, com sete volumes e mais de três mil folhas, 22 testemunha­s arroladas e 70 horas de sessões gravadas desde o início do julgamento, em 29 de Agosto, até às alegações finais realizadas em 11 de Outubro de 2022.

Amadeu Oliveira assumiu no Parlamento, semanas antes da detenção, que planeou a fuga do condenado, de quem era advogado de defesa, num caso que lhe valeu várias críticas públicas.disse que estava acusado, no processo mais mediático da Justiça cabo-verdiana nos últimos anos e ocorrido já após as eleições legislativ­as, dos crimes de atentado contra o Estado de Direito, perturbaçã­o do funcioname­nto de órgão constituci­onal.

 ?? DR ?? José Maria Neves defende apreciação ao T. Constituci­onal
DR José Maria Neves defende apreciação ao T. Constituci­onal

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Angola