Jornal de Angola

Procurando, à frente dos meus olhos…

- Tazuary Nkeita

A história que hoje vou contar aconteceu, comigo, num dia de grande azáfama, mas pode servir de lição a todos quantos querem abandonar o doce lar materno, à procura de excelentes oportunida­des, no exterior, que julgam nunca vir a obter, aqui, quando Angola tem o melhor para lhes oferecer à frente dos olhos, a um palmo do nariz e na palma da mão.

“L’angola c’est le meilleur pays au monde, hein!” - Angola é o melhor país do mundo, não duvide -, é o que mais gosto de dizer, na brincadeir­a, quando recebo, ou visito, amigos. E muitos acreditam quando lhes mostro imagens que arrasam; da Marginal de Luanda, Talatona, Mussulo, Barra do Kwanza, Malanje, Lubango, Kwanza Norte, Namibe, Benguela, Huambo, as Lundas e as suas estatuetas maravilhos­as, e por aí fora. Outros também duvidam, dizendo que o país não tem perspectiv­as. E não lhes faltam fortes argumentos, apesar de tantas oportunida­des e potenciali­dades, em abstracto, porque o concreto é a lição de hoje…

O relógio já tinha soado o sinal de alerta para o esperado encontro, às 18h00, e eu ainda não tinha terminado um dos meus “hobbies”, passatempo­s, ao fim da tarde. As plantas continuava­m a ser atacadas ferozmente por pragas de insectos, pequenos como mosquitos mas capazes de fazê-las secar e morrer, se não tomasse precauções imediatas. É um trabalho sistemátic­o que não me deixa dormir tranquilo, até assegurar bons resultados. Ver as plantas do meu jardim morrer debilitada­s pela seiva, pelo caule e pelas folhas é o mesmo que ver os mais célebres “milionário­s”, e toda a economia, cair na desgraça. Ataca o coração e tira o sono!

Feita a jardinagem desse dia, estava livre para um outro compromiss­o. O feriado do 8 de Março tinha passado, mas continuava o persistent­e namoro para a procura de melhores oportunida­des no mercado:

“Estou despachada…”, dizia a mensagem caída no meu telefone. O encontro continuava marcado para as 18:00 e não podia perdê-lo nem perdê-la, digo, a oportunida­de! O segredo é a alma do negócio. Estava atrasado e teria de me desculpar, sem dizer o que fazia.

No bolso julgava ter o telefone e na mão direita transporta­va um balde com os resíduos e instrument­os do trabalho que garantia a tão cobiçada beleza e o cresciment­o saudável das plant a s d o r i c o j a r d i m. A pequena tesoura com que cortava os caules secos e as ervas daninhas era um deles. Larguei a tesoura, com a intenção de pegar o telefone e escrever, rapidament­e, a resposta mais habitual de quem não quer perder a mais excelente das oportunida­des.

“Estou a caminho, só mais dez minutos!”

Sabia perfeitame­nte que nem trinta minutos seriam suficiente­s para me aprontar e sair de casa, mas não tive escolha. É assim que todos fazem e, verdade seja dita, todos gostam de se entreter com histórias banais, como o caos no trânsito, os acidentes de percurso e outros tantos episódios para alimentar a ideia de que “o repouso e o pôr do sol” vão ser lindos como nunca, num outro tempo ou num lugar mais distante à nossa espera.

Tudo de bom era fácil de se imaginar ao começo, mas, na realidade, o pior estava a acontecer. Muito mais tarde…

A pressa de sair de casa era tanta que depois de guardar a tesoura, já não sabia onde tinha poisado o raio do telefone!! E agora? Como confirmar o enc ontro? Passaram- s e quarenta minutos e continuava à procura do maldito meio de comunicaçã­o com a outra parte, envolvida no negócio.

“Será que o telefone caiu no balde do lixo?”, e nada mais fiz senão procurá-lo entre a areia, folhas e caules secos, atacados pela praga das moscas e insectos que os matavam dia a dia. Foi uma verdadeira agonia, comparável ao que as rádios e TV’S diziam nesse dia a propósito do inocente Kevin Strickland, o homem que passou 40 anos numa prisão por um crime que não havia cometido. Subitament­e, toda a alegria de estar no mais lindo dos jardins se transformo­u em tristeza e depressão pela oportunida­de perdida e já fora do meu alcance.

“Trimmm….”, continuava sem respirar de ansiedade quando finalmente descobri o telefone em frente do meu nariz, caído num dos vasos que tinha as folhas mais lindas e volumosas. Do outro lado da linha, fazia-se um absoluto silêncio. Ninguém respondia à chamada. O meu sonho estava desfeito! Tinha a certeza de que fazê-la esperar mais de 40 minutos, depois de me dizer que “estava despachada”, também lhe pareceu ficar detida durante mais de 40 anos. A espera foi insuportáv­el.

Tudo por falta de visão, tudo por culpa de mim mesmo. O telefone, a tesoura, estavam visivelmen­te colocados em frente dos meus olhos, ao alcance das minhas mãos, mas fui incapaz de os ver na hora certa e fazer acontecer os meus sonhos!

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