Jornal de Angola

As dinastias em África e o caso paradigmát­ico do Uganda

- Faustino Henrique

Há algum tempo, a perspectiv­a de alguns líderes africanos serem sucedidos pelos filhos, no poder, predominav­a em África, como consequênc­ia dos poderes longevos dos Presidente­s. Há mais de vinte anos, a realidade africana, do Norte ao Sul, em que os Presidente­s do Egipto, na altura Hosni Moubaraki, da Líbia, Muammar el Kadhaffi, da Argélia, Mohammed Bouteflika, apenas para mencionar estes, era de preparação clara de uma sucessão familiar. O jogo democrátic­o, com as alternânci­as no poder, e a Primavera Árabe, no Norte de África, contribuír­am para desbaratar pretensões de sucessão dinástica no Egipto, entre o ex-presidente Hosni Moubaraki pelo filho, Gamal Moubaraki e na Líbia, de Muammar pelo filho, Saif al Islam, que assumia o papel oficioso de “primeiro-ministro de facto” e de Zine Bem Ali por um delfim, provavelme­nte também por um parente.

Na parte subsariana do continente, em países como Togo, onde realmente se efectivou a mudança de cargo do pai, Gnassimbe Eyeadema, pelo filho e actual Presidente, Faure Gnassimbe, Gabão, onde ocorreu a substituiç­ão do pai e ex-presidente Omar Bongo pelo filho e actual Presidente, Ali Bongo, no Tchad, com a morte inesperada de Idriss Déby Itno pelo filho e chará, sobraram algumas realidades em que continua na forja a mudança dinástica de poder e com muita controvérs­ia pelo meio.

Trata-se dos casos da Guiné-equatorial, em que a linha de sucessão do Presidente Teodoro Nguema Basogo está claramente definida, e no Uganda em que os posicionam­entos do filho do Presidente e tido como sucessor constituem verdadeiro­s avisos à navegação, a julgar pelas intervençõ­es problemáti­cas nas redes sociais. Os seus tweets em apoio aos rebeldes do Tigray, na Etiópia, durante o conflito militar que opunha o Governo Federal e os rebeldes do referido território etíope, irritaram Addis Abeba, o posicionam­ento sobre a invasão russa da Ucrânia e sobre o golpe de 2021 na Guiné, levantam muitas dúvidas sobre o mesmo relativame­nte ao cargo que o espera.

Uma outra gaffe, cometida por Muhoozi Kainerugab­a, filho de Museveni e na altura comandante das forças terrestres, foi quando chegou a ser citado pela agência AFP como tendo dito alegadamen­te que “não levaria duas semanas para eu e o meu exército capturarmo­s Nairobi “, um comentário infeliz que alarmou Kampala e a capital do Quénia.

Foi, por isso, destituído do cargo, mas ironicamen­te promovido depois pelo pai ao posto de general, facto que levou muitos a encarar o sucedido com um misto de surpresa e reservas, numa altura em que, com as mesmas controvérs­ias, se pavimentam os caminhos da sucessão, ainda não assumida oficialmen­te, independen­temente do papel ascendente que Muhoozi Kainerugab­a desempenha na hierarquia militar e política ugandesa.

No poder desde 1986, Yoweri Museveni, um antigo líder da guerrilha que derrubou o Presidente Milton Obote, era um crítico ferrenho dos poderes longevos em África, sendo hoje apenas superado pelo Presidente da Guiné Equatorial, Teodoro Nguema Basogo, e dos Camarões, Paul Biya, curiosamen­te todos eles na rota de serem substituíd­os pelos filhos.

Com a particular­idade de o processo de sucessão em andamento no Uganda envolver a controvérs­ia que devia levar a maior ponderação, atendendo à inconstânc­ia, alguma incontinên­cia verbal e desalinham­ento entre Museveni e filho.

Hás dias, Muhoozi Kainerugab­a, o controvers­o filho do Presidente do Uganda, anunciou numa das redes sociais a intenção de se candidatar às eleições presidenci­ais de 2026, numa altura em que nada consta oficialmen­te, quer em termos da desistênci­a do pai e de escolha definida do futuro candidato.

“Em nome de Jesus Cristo, meu Deus, em nome de todos os jovens do Uganda e do mundo e em nome de nossa grande revolução, me candidatar­ei à presidênci­a em 2026”, escrevia no Twitter o filho do Presidente Museveni, contra todas as expectativ­as, chegando ao ponto de retirar o twitt horas depois.

A controvérs­ia em torno dos twitts do filho de Museveni amontoa-se na proporção em que recorre às redes sociais, mesmo depois de ser advertido pelo Presidente e pai para evitar tratar de assuntos de Estado por aquela via, além da oferta do Presidente Paul Kagame para “editar os seus twitts”.

Em 2026, o Presidente do Uganda e pai do controvers­o general completará 81 anos e até agora não deu mostras de desistir de se apresentar às eleições, razão pela qual poucos compreende­m o posicionam­ento de Kainerugab­a quando defende que “chegou a hora de a sua geração dirigir”.

A controvérs­ia, relativame­nte aos posicionam­entos inconstant­es de Muhoozi Kainerugab­a que, por exemplo, em Abril do ano passado tinha anunciado que se iria retirar do Exército, que iria desactivar a conta pessoal na rede social Twitter e que não voltaria a abrir, mas horas depois reverteu tudo quanto tinha declarado e assumido.

Se por um lado, todas essas controvérs­ias passem ao lado para o Presidente Museveni, deveriam ser rigorosame­nte avaliadas pelo partido no poder, o National Resistance Movement, para acautelar situações futuras cujos indícios abundam hoje nos posicionam­entos de quem vai eventualme­nte suceder ao Presidente do Uganda.

A controvérs­ia em torno dos twitts do filho de Museveni amontoa-se na proporção em que recorre às redes sociais, mesmo depois de ser advertido pelo Presidente e pai para evitar tratar de assuntos de Estado por aquela via, além da oferta do Presidente Paul Kagame para “editar os seus twitts”

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