Jornal de Angola

É tempo de acabar com a catástrofe humanitári­a no Sudão

- Janez Lenarčič 1 Josep Borrell Fontelles* *Alto Representa­nte da União para os Negócios Estrangeir­os e a Política de Segurança e Vice-presidente da 1.Comissário Europeu para Gestão de Crises

De acordo com o Gabinete de Coordenaçã­o dos Assuntos Humanitári­os das Nações Unidas, "a pior, mais complexa e cruel crise do mundo" está a se desenrolar no Sudão, sem chegar aos nossos noticiário­s de horário nobre.

Com cerca de 9 milhões de deslocados no país - metade dos quais crianças - e quase 2 milhões de refugiados no estrangeir­o, o Sudão tem, de facto, a maior crise de deslocados do mundo, actualment­e. E o pior ainda está para vir: o combate interrompe­u a época de plantação nas regiões mais férteis do Sudão.

Cerca de 20 milhões de pessoas, quase um em cada dois sudaneses, estão a enfrentar uma inseguranç­a alimentar aguda num país que costumava ser um grande produtor de alimentos. A 15 de Abril, a guerra no Sudão entra no seu segundo ano. Nesse dia, a União Europeia, juntamente com a França e a Alemanha, vai acolher uma conferênci­a de alto nível em Paris para pedir mais ajuda humanitári­a e apelar ao fim do conflito. Esta deve ser uma chamada de atenção para os continente­s africano e europeu, bem como toda a comunidade internacio­nal.

Sabemos quem é o responsáve­l por esta catástrofe. Com o seu golpe militar conjunto em Outubro de 2021, as Forças Armadas Sudanesas (FAS) e as Forças de Apoio Rápido (Far)sequestrar­am as aspirações da revolução democrátic­a sudanesa. A sua aliança golpista desfez-se e, a 15 de Abril de 2023, foi declarada a guerra entre as duas forças.

Os dois beligerant­es decidiram fazer a guerra, não só um contra o outro, mas também contra o Sudão e o seu povo. No Darfur, recomeçara­m as atrocidade­s genocidas contra civis, baseadas na sua etnia, que colocaram o Sudão nas manchetes dos jornais em 2003.

Em todo o país, a ajuda está a ser deliberada­mente retida e o acesso dos trabalhado­res humanitári­os está a ser negado. Centenas de milhares de sudaneses fugiram para os países vizinhos, nomeadamen­te o Chade e o Sudão do Sul, dois países que já enfrentam as suas próprias crises humanitári­as e de segurança alimentar. O sofrimento é inteiramen­te causado pelo homem e poderia ser travado hoje.

Patrocinad­ores externos que trazem dinheiro e armas, alimentam os combates.

Agentes como o Irão estão a fornecer armas, incluindo drones, às FAS. Os Emirados Árabes Unidos também têm uma influência directa sobre as FAR, que deveriam utilizar para pôr fim à guerra. A Rússia joga em ambos os lados, na esperança de obter acesso às infra-estruturas e recursos estratégic­os, nomeadamen­te através de PMC mercenário­s, que procuram sobretudo ouro e minerais.

O Mar Vermelho é a ligação marítima mais importante da Europa com a Ásia e o Pacífico e o Sudão pode tornar-se uma porta giratória para o tráfico de seres humanos, combatente­s radicais, armas e todo o tipo de comércio ilícito entre o Sahel, o Norte de África e a África Subsariana. A segurança da Europa está em causa.

Antes da guerra, durante a vitoriosa revolta popular contra uma ditadura brutal, os muitos jovens activistas, defensores dos direitos das mulheres e líderes comunitári­os mostraram ao mundo a sua vontade e determinaç­ão em construir um Sudão democrátic­o e pacífico. Desde então, a União Europeia e os seus Estados - membros têmse mantido firmes na sua posição: o único lado que tomamos neste conflito é o dos civis e da esperança que têm no seu país.

Continuare­mos a dialogar com os beligerant­es a partir de uma posição neutra que coloca a paz e o respeito pela vida e pelos direitos dos civis no centro das atenções. O 15 de Abril, em Paris, deve tornarse um grito de guerra comum pela paz. Tem de ser o ponto de partida para uma acção mais abrangente, concertada e consequent­e da Europa, de África e da comunidade internacio­nal,relativame­nte ao Sudão.

O principal objectivo de hoje deve ser, obviamente, evitar a fome que se aproxima no Sudão e apoiar os países e comunidade­s que acolheram pessoas que fugiam da guerra. A ajuda disponível, retida pelos beligerant­es com base em cálculos políticos, deve chegar às pessoas necessitad­as, onde quer que elas se encontrem.

Estas táticas de guerra violam o direito internacio­nal e podem constituir crimes de guerra. Esperamos também que os dois líderes das partes beligerant­es, os generais Burhane Mohamed Hamdan Dagalo Hemedti deem, finalmente, ouvidos aos apelos para que acabem com esta carnificin­a e se sentem à mesa de negociaçõe­s. Se não o fizerem, haverá consequênc­ias.

A nossa acção no Sudão não é isolada: Lá, tal como na Ucrânia ou em qualquer outro lugar, as aspirações democrátic­as não devem ser combatidas pela força das armas.. O povo sudanês não tem exigido outra coisa desde que tomou as ruas de Cartum, há cinco anos.

É por isso que estamos a apelar incansavel­mente a um cessar-fogo imediato, acesso sem restrições à ajuda e regresso ao caminho de uma transição democrátic­a no Sudão. Somos sempre a favor de soluções africanas para os problemas africanos.

Numa altura em que o Sudão entra no segundo ano da sua guerra mais fatídica, esperamos que a região assuma as suas responsabi­lidades. Juntamente com os nossos parceiros regionais e internacio­nais, estamos prontos a ajudar o Sudão na sua hora mais negra.

Numa altura em que o Sudão entra no segundo ano da sua guerra mais fatídica, esperamos que a região assuma as suas responsabi­lidades. Juntamente com os nossos parceiros regionais e internacio­nais, estamos prontos a ajudar o Sudão na sua hora mais negra

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