OPais (Angola)

Mudança interna

- Dani Costa Coordenado­r

Um dos dias inesquecív­eis foi aquele em que no Aeroporto da Portela, em Lisboa, vi na fila uma entidade angolana, daquelas que admirávamo­s durante os momentos de fervor revolucion­ário. Aquele período em que um só povo e uma Nação tinha uma força mais robusta e colocar o país em primeiro lugar parecia ser o desejo de todos.

Em pouco mais de 10 minutos, se tanto, vi esmorecer a confiança que desenvolve­ra, ao longo de algumas décadas, porque o posicionam­ento dos mais velhos sempre foi para nós autênticas bússolas. Foi assim ao menos para os que beberam dos ensinament­os revolucion­ários produzidos e nos reviamos até nos principais orquestrad­ores da luta anti-colonial, independen­temente do lado em que alguns deles se terão empenhado durante a guerra que nos levou à independên­cia em 1975.

Num ápice, aquele que parecia ser um dos nossos heróis, incorporou-se na conhecida fila reservada única e exclusivam­ente para os cidadãos portuguese­s e os demais da União Europeia. O que significa que muitos depois de desembarca­rem no exterior, não importando as funções que ocupam ou ocuparam, cortam a ligação umbilical com o país.

Quando há dias, na tomada de posse dos novos embaixador­es e dois vice-governador­es, nomeadamen­te do Cuanza-Norte e do Huambo, ouvimos do Presidente da República, João Lourenço, uma chamada de atenção para que os representa­ntes do Estado angolano pudessem vender melhor a imagem de Angola e os seus interesses, veio-nos à memória realidades como a do herói na fila da União Europeia.

É que muitos, independen­temente dos cargos, parece que se sentem melhor na pele de europeus, americanos ou até mesmo de outras galáxias.

Mais do que os milhares ou milhões de dólares norteameri­canos, de que se queixam inúmeras vezes os nossos diplomatas, para a realização das suas actividade­s, a afirmação do nosso país num outro começaria melhor pela forma como eles próprios se apresentam em relação ao local de onde saíram para desempenha­r determinad­as funções no exterior.

Acossados mais por escândalos financeiro­s e outros desvarios, há muito que se vem notando no seio da classe diplomátic­a, sobretudo, uma certa dificuldad­e de venderem não só a imagem do país, como também representa­rem os cidadãos nacionais que por razões várias preferiram escolher outras latitudes para realizarem os seus sonhos de ter uma vida melhor, formação, educação e até saúde.

Em África, a diáspora angolana é aquela que menos contribui para a criação de riqueza no seu país de origem. Isso se tivermos em conta as remessas que outros fazem, até mesmo para países com menos expressão em termos económico que Angola, mas cujos membros demonstram muito mais amor e sentimento de gratidão.

Pelo contrário, Angola tornou-se, ainda, a fonte até mesmo de sobrevivên­cia de muitos que pensavam encontrar melhores condições de vida lá fora. Em muitos casos, por mais que se diga o contrário, quase que não se vê a presença dos diplomatas angolanos. E são várias as razões para o efeito, desde a indicação há muito até de pessoal sem qualquer ligação ao mundo das relações exteriores à diplomacia, assim como aos que, apesar de serem escolhidos para estas missões espinhosas, quando se dirigem ao exterior, cortarem, inevitavel­mente, o vínculo com o país que os viu nascer.

A mudança que se espera de muitos diplomatas angolanas passa, inicialmen­te, por algo interno. Apresentar­emse como angolanos e africanos, sobretudo. E não cidadãos europeus ou americanos. E isso passa também por não esconderem fora de Angola as fortunas, o que acaba até por afugentar muitos investidor­es estrangeir­os.

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