‘Mulata bossa nova’ venceu o preconceito e inspirou letra
Rio de Janeiro, 1963. Vera Lúcia Couto, com 18 anos, recusava convites para participar do concurso ao Miss Renascença, clube de classe média no Rio de Janeiro fundado por negros. Seu pai gastaria muito com as roupas necessárias para concorrer e ele havia lhe prometido o carro de presente.
Um ano depois, Vera foi a primeira negra a vencer o concurso de miss Guanabara. Mais tarde, ainda tentaria o Miss Brasil, ficando com o segundo lugar.
Hoje, aos 72 anos, Vera lembra: “Gritaram: ‘Sai daí, crioula. Seu lugar é na cozinha!’. Eu era muito menina, me entristeceu, fiquei bem constrangida”, afirma.
Com o título, tornou-se a primeira miss negra do Brasil. E ganhou uma música: ela é a “mulata bossa nova” da marchinha “Mulata Iê Iê Iê” (veja trecho da letra acima). Hoje a música é tema de debate entre mulheres negras, que discordam do uso do termo “mulata” —que vem de “mula”.
Vera viajou pelo mundo, participando de outras competições. Disputou o Miss Beleza Internacional em Long Beach, nos EUA —a primeira mulher negra a representar o Brasil em um concurso como aquele. Viajou para a Europa, América do Sul. Viajou pelo Brasil todo, com a mãe.
Hoje, é assistente da dire- toria de operações da Riotur, onde trabalha desde a década de 1980. “Atualmente nem gosto tanto de Carnaval. Por causa do meu trabalho, já se tornou lugar comum”, diz. Volta e meia, ainda é chamada de “mulata bossa nova”. Mas não considera os versos ofensivos. “Na época não havia essa conotação”, diz. “Fiquei muito satisfeita e orgulhosa de receber uma homenagem que está aí há mais de 50 anos.”