Paraíso da impunidade
Cresci em uma ditadura militar violenta e corrupta. Tempos ainda piores —muito, mas muuuuito piores— do que os nossos tenebrosos dias atuais. Uma época em que nem havia investigação e processo contra criminosos no poder, com o Ministério Público refém do governo autoritário e a imprensa censurada. O país era um destino procurado por bandidos estrangeiros endinheirados, que vinham para cá com a certeza da impunidade.
O famoso ladrão inglês Ronald Biggs chegou ao Brasil em 1970 e aqui viveu, como celebridade, até 2001. Até o monstro nazista Josef Mengele encontrou paz por essas bandas, sob nome falso, e só foi descoberto anos após sua morte, ocorrida durante banho de mar em Bertioga, em 1979.
Nesse contexto, eram comuns filmes de Hollywood em que mafiosos fugiam para o Brasil para gozar a boa vida com a grana de seus golpes.
O país evoluiu em vários aspectos, e o estado de direito foi restabelecido, mas só em parte. Uma vasta parcela da população, sobretudo a de pobres e negros, ainda é cotidianamente violentada, enquanto criminosos grãfinos contam com inúmeros recursos protelatórios para evitar serem presos. E, nas raras vezes em que isso ocorre, logo são beneficiados com prisões domiciliares, em mansões que mais parecem spas.
A gente sabe de tudo isso, mas, mesmo assim, a desfaçatez do ex-presidente da CBF, Ricardo Teixeira, é um tapa na nossa cara. “Tem lugar mais seguro que o Brasil? Vou fugir de quê, se aqui não sou acusado de nada?”, disse o cartola à “Folha de S.Paulo”. Assim como seu comparsa, Marco Polo Del Nero, que não viaja ao exterior nem para cumprir os deveres do cargo.
Não há dúvida: continuamos a ser o paraíso da impunidade e cenário para filmes de fugitivos.