Agora

Teatro do absurdo

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Em março, vi uma das cenas mais absurdas. Estava a caminho da rua Caraibas, na Pompeia, em dia de jogo do Palmeiras, para me encontrar com grandes amigos, da turma dos “Dissidenti”. Um grupo de palmeirens­es que há anos se reúne perto do clube para assistir aos jogos, tomar cerveja, comer petiscos e falar do Verdão. Naquela noite teria o imperdível nhoque do Divino. Saí mais cedo de casa, a fim de garantir o disputadís­simo prato. Ao chegar na rua Turiassu, vi um teatro montado, um cerco com barricadas que controlava o acesso de pessoas no perímetro do estádio.

O que me chamou a atenção foi o fato de a triagem ser organizada por pessoas com coletes do programa de sóciotorce­dor, e não por policiais ou agentes públicos. À minha frente, estava uma senhora, de uns 80 anos, com sacolas de compras. Uma moça, que controlava o acesso, in- terpelou-a: “Só pode entrar se tiver ingresso para o jogo”. De pronto, a senhora respondeu, com sotaque italiano: “Mia filha, moro aqui há 50 anos. Entro quando quiser.” A moça, investida de uma autoridade sei-láde-onde, rebateu: “Mas vou ter de olhar suas sacolas”. Nas compras, havia duas garrafas de vinho. “Senhora, com estas garrafas não pode entrar. É proibido bebida alcoólica”. Impaciente, a senhorinha vociferou: “Mia filha! Compro o que quiser! Bebo o que quiser!” Um policial se aproximou. Com bom senso, liberou a entrada. Chegou a minha vez. Malandrame­nte, emendei: “Sou vizinho da senhora”. Entrei.

Depois soube que naquele dia iniciara o absurdo bloqueio, que priva as pessoas de ir e vir e que acabou com a festa dos torcedores durante os jogos. O estádio, que existe no local há mais de cem anos, antes do bairro, vêse privado de sua gente.

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