A derrota do povo
O Corinthians divulgou nesta semana dados sobre o público que frequenta o estádio de Itaquera. Embora questionáveis —pela pequena amostra e pela conveniência de vender clientes endinheirados a potenciais parceiros comerciais—, os números não estão muito distantes da realidade. E são tristes.
As respostas dadas pelos participantes do levantamento indicam que apenas 6,3% dos alvinegros que vão à arena da zona leste de São Paulo têm renda familiar inferior a R$ 1.760.
Encomendada pelo clube, a pesquisa foi realizada por uma “empresa especializada em monitoramento de mercado e análise de comportamento do consumidor”. E nessa última palavra está o resumo de toda a questão.
É abjeto que o torcedor seja tratado como consumidor. Essa lógica afasta o pobre e tira cada vez mais o brilho da festa, sem foguetes, sem ban- deiras, sem a alegria do pé-rapado que pedia “a intéra” na fila do ingresso para ver seu time.
Não é exclusividade do Corinthians. Um estudo feito, por exemplo, no Palmeiras —que chegou ao cúmulo de proibir a celebração na rua daqueles sem dinheiro para o bilhete— apresentaria números semelhantes.
Não deixa de ser emblemático, porém, o que é visto na “casa do povo”, como a agremiação preta e branca hipocritamente se refere a seu estádio. O clube fundado por operários hoje carrega a bandeira do consumo, sem perceber que isso trai a sua história e esvazia a força de sua torcida.
Há pouco mais de cem anos, Neco e companhia irritaram as elites e, ouvindo insultos como “time de carroceiros”, tiveram papel decisivo na popularização do futebol. Os carroceiros venceram.
Um século depois, a batalha se repete. Desta vez, o povo está perdendo.