Agora

Febre de bola

- Otavio Valle

Belo Monte florescia de vento e popa nas décadas de 1910 e 1920. A jovem cidade, no oeste paulista, surgiu, em grande parte, pelas mãos sujas de sangue dos bugreiros, que assassinar­am os índios kaingang da região. A chegada dos trilhos trouxe os europeus e as primeiras bolas de futebol.

Em 1920, o futebol da cidade já tinha dois grandes rivais: a AABM (Associação Atlética de Belo Monte) e o Montesino. Duas famílias italianas comandavam as agremiaçõe­s: a AABM era controlada pela família Acquarone, e o Montesino, pelos Sardella.

No campeonato de 1922, os dois times brigavam cabeça a cabeça pelo título. O último jogo do certame, entre AABM e Montesino, decidiria o campeão. Mas um fato mudaria a história: Beto Sardella, craque e goleador máximo do Montesino, começou namorar, às escondidas, Maria, filha de Gianfrance­sco Acquarone, presidente da AABM. Quando as famílias descobrira­m o idílio dos jovens, o campeonato foi até suspenso.

Certa noite, Gianfrance­sco procurou Beto e, sob a luz dos lampiões do coreto na praça da Matriz, fez-lhe uma proposta indecorosa: “Se você não fizer gol, eu deixo você namorar a minha filha”. Beto concordou.

No jogo final, o placar seguia zerado até Beto levar uma botinada do zagueiro Mateus Acquarone, primo de Maria. O atacante ficou maluco e jurou para Mateus: “Vou te dar um chapéu e fazer o gol título!” Aos 44min do segundo tempo, Beto recebeu um lançamento primoroso do meia Hércules Boccatto, matou a bola de primeira, aplicou o chapéu no defensor e acertou no ângulo: gol do Montesino, título para os Sardella. Gianfrance­sco clamou vingança. Mas não houve tempo para nada. Um surto de febre amarela chegou a Belo Monte e dizimou a cidade, que sumiu do mapa.

 ??  ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil