O tempo parado é a razão dos idiotas
Viver é melhor que sonhar. Cantou Elis. Dando voz a Belchior. Quem não queria ter um filho com o talento do bigodudo? Idos de 1976. Elisa, símbolo negro, feminino, periférico e popular, brilhava na arquibancada do Pacaembu. E, vencida a idade média e a escravidão, sonhava com o fim do jejum corinthiano. Que viria só em 1977. Amanhã há de ser outro dia. Apenas um verso. Como sociedade, não vivemos como nossos pais. Pioramos, do avesso, reverso. Àquela altura, a vida não era branda, era dura, mas nós, como povo, queríamos viver, sentir e gozar as delícias de ser um eterno aprendiz. Hoje quem vive preexiste. Sente que falta a chancela de quem não viveu para existir. Tristeza angustiante. Mais importante do que viver e não ter a vergonha de ser feliz é registrar na rede antissocial que viveu e esperar o joinha alheio para curtir. Inferno, o sentimento são os outros. Paradoxal e especialmente de quem só vive para si e se lixa para quem está longe. Ainda que pobre, inclusive de espírito, não perceba que o Haiti também é aqui, logo ali. E muito mais perto da sua realidade do que Miami. Há perigo em cada esquina. Com o aval da vítima, que chancelou o discurso de quem primeiro atira. Não quiseram ver. Também morre quem atira, rapá. É óbvio, ululante, ainda que o aviso, reiterado, tenha sido inútil. A gente somos inútil. A ponto de apostar na violência para combatê-la e na ignorância para resolver a educação. Proibir, proibir, proibir. É proibido permitir. O povo não quer ir e vir. Quis voltar ao passado. Woodstock hoje não seria possível. Porque é proibido viver. Sem antes alguém constatar que vivemos. Ainda que a gente tenha sentido primeiro. Só sentimos e explodimos quando para os outros existimos. Invertemos a roda da história. Para a época da invenção da roda. A tecnologia deu voz à legião de imbecis. Que calou a voz da bola na rede. O gol, que sempre existiu, não existe mais. Não até os idiotas da objetividade (que continuam julgando com subjetividade e errando) não referendarem. Não há mais gozo nem impedimento. O tempo é senhor da razão. De quem não tem razão de nada. E, com ou sem razão, acaba com o amor. O VAR é um lixo. Ele (também) não.