Fraude com CPF viabilizou uso de Whatsapp na eleição
Documentos de ação trabalhista e relato de ex-funcionário de empresa mostram as irregularidades
Relato e documentos apresentados à Justiça do Trabalho e obtidos pela reportagem detalham o submundo do envio de mensagens em massa pelo Whatsapp que se instalou no Brasil durante as eleições deste ano.
Uma rede de empresas recorreu ao uso fraudulento de nome e CPF de idosos para registrar chips de celular e disparar lotes de mensagens em benefício de políticos.
Entre as agências envolvidas no esquema está a Yacows. Especializada em marketing digital, ela prestou serviços a vários políticos e foi subcontratada pela AM4, produtora que trabalhou para a campanha do presidente eleito, Jair Bolsonaro (PSL).
A reportagem falou diversas vezes com o autor da ação, Hans River do Rio Nascimento, ex-funcionário de uma dessas empresas. Nas primeiras conversas, ocorridas a partir de 19 de novembro e sempre gravadas, ele disse que não sabia quais campanhas se valeram da fraude, mas reafirmou o conteúdo dos autos e respondeu a perguntas.
No dia 25, ele mudou de ideia após fazer acordo com a antiga empregadora, registrado no processo. “Pensei melhor, estou pedindo pra você retirar tudo que falei até agora, não contem mais comigo”, disse, em mensagem de texto. Três dias antes, a reportagem havia procurado a Yacows para solicitar esclarecimentos.
As conversas gravadas e a ação que Nascimento move acrescentam detalhes ao esquema revelado pela Folha de S.paulo em outubro, quando reportagem mostrou que empresários pagaram para impulsionar mensagens anti-pt na disputa eleitoral.
Após a reportagem, o Whatsapp bloqueou as contas ligadas às quatro agências de mídia citadas por fazerem disparos em massa: Quickmobile, Croc Services, SMS Market e Yacows.
Processo
Nascimento descreve a atuação de três agências coligadas: Yacows, Deep Marketing e Kiplix, que funcionam no mesmo endereço em Santana (zona norte) e pertencem aos irmãos Lindolfo Alves Neto e Flávia Alves. Nascimento esteve empregado pela Kiplix de 9 de agosto a 29 de setembro com salário de R$ 1.500.
Ele anexou ao processo fotos e trocas de mensagens entre funcionários e os donos das empresas. Em uma delas, um supervisor diz aos funcionários que eles devem trabalhar no final de semana: “Campanha de GOV iniciando!”. Nenhum candidato a governador declarou à Justiça Eleitoral despesas com essas agências.