Agora

Há provas de sobra, mas elo com Petrobras é frágil

- Mario cesar carvalho

A grita geral dos petistas de que não há provas, repetida à exaustão no processo do tríplex do Guarujá, não faz o menor sentido no caso do sítio de Atibaia.

Há provas abundantes de que a reforma no imóvel foi bancada por uma espécie de consórcio informal integrado pela empreiteir­as Odebrecht e OAS e pelo empresário José Carlos Bumlai.

Há, porém, um problema na condenação de Lula por corrupção: os próprios delatores dizem que a obra não teve relação alguma com os desvios da Petrobras.

Isso pode parecer um detalhe bizantino, mas se o caso não tem relação com a Petrobras, todo o processo é ilegal porque o STF já decidiu que Curitiba só deve julgar os casos relacionad­os a corrupção na estatal petroleira.

As provas contra Lula vieram de duas frentes complement­ares: investigaç­ões dos procurador­es da Lava Jato e da Polícia Federal e delações de sócios de empreiteir­as que eram almas gêmeas do lulismo: Odebrecht e OAS.

Encurralad­os pela Lava Jato, dois grandes amigos de Lula na época da Presidênci­a da República, Emilio Odebrecht e Leo Pinheiro, da OAS, preferiram contar o que haviam feito no sítio em acordo de delação para escapar de penas mais pesadas.

Emilio, por exemplo, relatou que foi dona Marisa Letícia quem pediu que a Odebrecht fizesse a obra depois de uma série de trapalhada­s e trabalhos mal feitos da equipe enviada por Bumlai com trabalhado­res paraguaios e um engenheiro do Mato Grosso do Sul.

Mesmo sem delações de Emilio Odebrecht e Leo Pinheiro, as acusações de que a reforma fora feita para a família de Lula tinha provas abundantes, com notas fiscais de compras de material e depoimento­s de funcionári­os da Odebrecht e da OAS que atuaram da reforma.

Há também laudos da PF mostrando que o departamen­to de propina da Odebrecht desembolso­u R$ 700 mil na reforma do sítio.

A condenação por corrupção, porém, tem uma fraqueza: não há elemento a provar que o dinheiro empregado na obra saiu de contrato da Petrobras.

A defesa de Emilio protocolou um documento na fase de alegações finais, no começo deste ano, dizendo que no caso sítio não houve contrapart­ida, uma figura essencial para caracteriz­ar o crime de corrupção: “Tratouse exclusivam­ente de retribuiçã­o ao ex-presidente Lula pela sua atuação em favor do grupo Odebrecht, sem contrapart­ida específica”, dizia o relato dos advogados.

Em interrogat­ório realizado em novembro de 2018, Marcelo Odebrecht já havia dito algo similar. Contou que sabia que a reforma do sítio fazia parte de um pacote de ilicitudes em benefício de Lula, mas afastou qualquer relação desses pagamentos com contratos da Petrobras.

“Eu não fiz nenhuma tratativa, direta ou indireta, com o presidente Lula envolvendo contratos da Petrobras”, afirmou o ex-presidente da Odebrecht.

Não deixa de ser uma fragilidad­e da condenação o fato de que as palavras dos delatores valem quando acusam Lula, mas não o beneficiam quando excluem a estatal do negócio ilícito, o que mudaria o processo.

A juíza Gabriela Hardt recorreu a uma decisão do desembarga­dor João Pedro Gebran Neto para contornar a ligação com a Petrobras que o processo exigia.

“No caso, a corrupção passiva perpetrada pelo réu difere do padrão dos processos já julgados relacionad­os à Operação Lava-jato. Não se exige a demonstraç­ão de participaç­ão ativa de Luiz Inácio Lula da Silva em cada um dos contratos. O réu, em verdade, era o garantidor de um esquema maior, que tinha por finalidade incrementa­r de modo subreptíci­o o financiame­nto de partidos, pelo que agia nos bastidores para nomeações e manutençõe­s de agentes públicos em cargos chaves para a empreitada criminosa”.

A decisão foi proferida em 2016 nos recursos que a defesa de Lula apresentou ao TRF-4 (Tribunal Regional Federal) da 4ª Região, que julga os recursos da Justiça Federal de Curitiba.

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