‘Filhos da Pátria’ recua ao Brasil de Vargas para satirizar país de hoje
Segunda temporada da série com Fernanda Torres traz referências a panelas, leis trabalhistas e Damares Alves
RIO DE JANEIRO Maria Teresa bate panelas, fecha as janelas de casa com medo do comunismo e é casada com Geraldo, um funcionário público que rouba aqui e acolá —tudo pelo bem da família.
Essa história podia até se passar nos dias de hoje, mas é na década de 1930 que a segunda temporada de “Filhos da Pátria” é ambientada.
Os novos capítulos da série da Globo, que vão ao ar a partir de outubro, recuam à Era Vargas para refletir a política atual. Em alguns momentos, as referências são explícitas, como quando a trama satiriza a declaração da ministra Damares Alves (Mulher, Família e Direitos Humanos), que defende que “menino veste azul e menina veste rosa”.
A comédia explora o cotidiano da família carioca de classe média Bulhosa em meio às turbulências do governo de Getúlio Vargas. Fernanda Torres, Alexandre Nero, Johnny Massaro e Lara Tremouroux interpretam os protagonistas.
Se na primeira temporada, de 2017, a trama tinha como pano de fundo a Independência do Brasil, em 1822, agora os personagens respiram o fim da república do café com leite. A chegada dos rádios e da CLT (Consolidação das Leis Trabalhistas) são os temas constantes.
Bruno Mazzeo, autor da série, compara a época aos dias de hoje. “A gente brinca que é o momento do ‘agora vai’”, diz, citando Millôr Fernandes, que definia o Brasil como “o país do futuro. Sempre”.
Escrito em parceria com Tati Bernardi, o roteiro não poupa os personagens de proferir absurdos racistas e machistas. “Às vezes, o pessoal da equipe me vê falar as maiores atrocidades e diz: ‘Mas é isso mesmo?’”, conta Fernanda Torres pouco antes de entrar em cena. A atriz interpreta Maria Teresa, mãe da família, com desejos de ascensão social. A dona de casa tem uma empregada, Lucélia (Jéssica Ellen), mas a desaprova quando ela pede folga.
Torres define sua matriarca como “um monstro” contraditório, porque ela podia ser uma tia parecida com a que todo mundo tem. Dá até para ter “certo carinho por ela”.
A atriz diz que a série joga luz sobre mazelas do Brasil, como a “escravidão, que não foi resolvida, e os conluios no poder para manter privilégios”. Ela compara “Filhos da Pátria” à peça “O Rei da Vela”, de Oswald de Andrade, sobre um agiota que vive às custas dos empobrecidos pela crise de 1929.
“A série tem disso, do cara que ganha explorando o atraso e miséria do Brasil.” Para a atriz, um dos trunfos da série é tratar questões urgentes, como machismo, racismo e corrupções. (Folha)