Agora

Fome de amor e respeito

Elza Soares lança seu 34º disco, ‘Planeta Fome’, que ela diz idealizar desde 1953; ‘Quem tem coroa aqui? Rainha faminta? Quero não’, diz

- LUCAS BRÊDA

RIO DE JANEIRO “Não quero voltar a Lisboa”, Elza Soares afirma, incontorná­vel, quando uma de suas assessoras lembra do último show que ela fez em Portugal. A cantora diz que o Brasil está resfriado, mas que não consegue se reconhecer fora daqui. “Cantar de galo no terreiro dos outros? Quero cantar no meu terreiro.”

Essa conexão da cantora com o país é a base de “Planeta Fome”, seu 34º disco, lançado na sexta-feira (13). O álbum carrega no título a famosa resposta que Elza deu ao apresentad­or Ary Barroso, quando ela tinha 13 anos e se atreveu a cantar no programa de calouros que ele apresentav­a na rádio Tupi.

Segundo Elza, o disco vinha sendo concebido desde aquele episódio de 1953. “Pensava que ‘planeta fome’ era pela fome de comida”, diz. “Mas cheguei à conclusão de que tenho muito mais fome. De saúde, de respeito, de amor, de um país melhor. Quero continuar, estou com fome.”

A expressão é antiga e foi resgatada, diz a cantora, pelo momento do país. “Só agora estou vendo que o pessoal está com muita fome. Nos anos 1960, também vi isso. Tenho história para contar, não estou buscando em livro. Achei que aquilo ia passar, mas estou vendo outra vez.”

É a evolução do recado de quatro anos atrás, quando Elza surgiu pedindo para que a deixassem “cantar até o fim” em “A Mulher do Fim do Mundo”. O disco de 2015, aclamado pela crítica, foi a aproximaçã­o da cantora com as guitarras e a cena contemporâ­nea de sambanoise de São Paulo.

O primeiro álbum inteiro de inéditas da cantora marcou o retorno à relevância e uma renovação em sua carreira. Rendeu um Grammy Latino, uma sequência —“Deus É Mulher” (2018), também produzido por Guilherme Kastrup— e quatro anos de turnês e shows no Brasil e mundo afora.

Foram trabalhos importante­s, mas aquela linguagem já se aproximava de um esgotament­o. Até por isso, para “Planeta Fome”, a cantora procurou novos colaborado­res.

“Fui atrás de gente do país todo, pedi composição para todo mundo. Mas, quando nos encontramo­s, ela já sabia o que queria”, diz Rafael Ramos, do selo Deck, produtor do novo disco. Em “Deus É Mulher”, Elza já havia aumentado sua participaç­ão na seleção do repertório. Agora, ela assume ainda mais as rédeas do projeto. “Queria fazer algo com meus sonhos, meus desejos”, ela conta. “Escolhi o repertório, os arranjos, dei pitaco em tudo.”

Pensava que ‘planeta fome’ era pela fome de comida. Mas concluí que tenho muito mais fome. De saúde, de respeito, de amor, de um país melhor Elza Soares, cantora

Regravaçõe­s

Além de músicas inéditas, “Planeta Fome” traz algumas regravaçõe­s, incluindo duas músicas de Gonzaguinh­a, “Comportame­nto Geral” e “Pequena Memória para um Tempo sem Memória”, e “Brasis”, de Seu Jorge. Para “Blá Blá Blá”, ela mescla um trecho de “Chega”, de Gabriel O Pensador, com “Me Dê Motivo”, de Tim Maia. A faixa ainda traz versos do rapper Bnegão.

Já “País do Sonho” saiu de vídeo no Facebook. Elza usava a rede social quando viu gravação ao vivo da música do sambista Chapinha da Vela. “Era um samba normalíssi­mo, mas ela já tinha dito que, se fosse pra ter samba, era só na alma”, lembra Ramos.

Em “Não Tá Mais de Graça”, Elza atualiza um de seus hinos, “A Carne”, música de 2002 cujo refrão diz que “a carne mais barata do mercado é a carne negra”. Agora, ela canta

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Cecilia Acioli - 9.jul.14/folhapress A cantora Elza Soares, vestida para ver a seleção brasileira
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