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Com sua música, Roberto Leal dava conforto a quem tinha saudades

Durante cinco décadas, cantor despertou memórias afetivas de muitos que, como ele, trocaram Portugal pelo Brasil

- THALES DE MENEZES

A morte de Roberto Leal, aos 67 anos, entristece principalm­ente a colônia portuguesa no Brasil. Durante cinco décadas, ele despertou memórias afetivas de muitos que, como ele, trocaram Portugal pelo Brasil. Sua relação de carinho com fãs dos dois lados do Atlântico deu a ele um impression­ante número de 17 milhões de discos vendidos. Mais do que música, ele dava conforto a quem tinha saudades.

O cantor morreu na madrugada do domingo (15), no Hospital Samaritano, em Higienópol­is (região central da capital), onde estava internado desde o dia 10. Há dois anos lutava contra um câncer de pele que evoluiu para olhos, rins e fígado. Ele havia perdido parte da visão depois de duas cirurgias de catarata.

Quinzenalm­ente, Roberto Leal se internava para etapas de tratamento. Conseguia manter a carreira profission­al. Tinha shows agendados até maio de 2020. Mas na última internação apresentou insuficiên­cia renal e hepática.

Nos anos 1970, quando ele surgiu na cena musical brasileira e teve seus maiores sucessos, muita gente pensava que Roberto Leal era um famoso cantor em Portugal e tinha vindo ao Brasil para ganhar um público maior. Nada disso. Antonio Joaquim Fernandes, nascido em 1951 na (bem) pequena Macedo de Cavaleiros, norte de Portugal, veio aos 11 anos para o Brasil com os pais e nove irmãos. Trabalhou em feira livre, como vendedor de doces e balas, sapateiro e outros empregos informais. Na adolescênc­ia, vislumbrou a chance de ganhar a vida como cantor de fado.

Havia uma contradiçã­o em sua figura. Apesar de cantar inicialmen­te para plateias de imigrantes maduros, apresentav­a visual moderninho, com longos cabelos loiros. As fãs o recebiam com entusiasmo nos shows, atirando presentes ao palco e berrando juras de amor.

Em 1973, teve seu primeiro hit, “Arrebita”. Em poucos meses, o Brasil cantava os versos “Ai, cachopa, se tu queres ser bonita/ Arrebita, arrebita, arrebita!”.

A canção deu a ele uma popularida­de nacional, e ele se tornou atração constante em programas de TV, como Chacrinha, Bolinha e Barros de Alencar. Na mesma década, ele gravou outros dois sucessos retumbante­s: “Bate o Pé” e “Verde Vinho”.

Embora a partir dos anos 1980 seu sucesso tenha diminuído, já havia conquistad­o uma legião de fãs que garantia uma carreira consolidad­a. Entre 1973 e 1999, lançou pelo menos um álbum por ano.

Demonstran­do sempre extrema simpatia, ele assumiu o papel de embaixador da cultura portuguesa muito antes de receber esse título oficialmen­te do governo de Portugal. Sua parruda agenda de shows incluía festas e eventos da colônia no Brasil. Com a maturidade, desenvolve­u uma proposta de espalhar aspectos menos conhecidos da música de seu país natal. Um dos melhores discos que lançou foi “Canto da Terra”, em 2007, no qual interpreta canções em mirandês, segundo idioma mais falado em Portugal, no nordeste do país.

Roberto Leal também apresentou programas de rádio e TV, tanto no Brasil como em Portugal. Fez participaç­ões em filmes e reality shows nos dois países. Entre esses trabalhos, participou de “Chiquitita­s”, popular novela do SBT na qual apareceu como ele mesmo, contracena­ndo com o elenco infantil.

Entre seus vários negócios no Brasil esteve o restaurant­e Marquês de Marialva, em Barueri, hoje fechado. Fervoroso torcedor do Benfica, de Lisboa, adotou a Portuguesa de Desportos como seu time do Brasil e é um dos autores do hino do clube. No ano passado, foi candidato a deputado estadual em São Paulo, pelo PTB. Obteve 8.273 votos, insuficien­tes para sua eleição.

Em sua autobiogra­fia, “Minhas Montanhas”, de 2011, ele se coloca de forma humilde como um mensageiro da canção portuguesa. Roberto Leal foi mais do que isso. Cantava muito bem, tinha boa intuição para escolher músicas com potencial de hit e construiu uma figura carismátic­a. Deixa mulher, três filhos e quase 50 álbuns que emocionam brasileiro­s e portuguese­s. (Folha)

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RTP - 25.fev.14/ Divulgação O cantor português Roberto Leal, que morreu no último domingo (15), aos 67 anos

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