Agora

Para o amigo Arlindo Cruz

Zeca Pagodinho lança ‘Mais Feliz’, primeiro disco sem Arlindo Cruz por perto, com 11 músicas inéditas; apesar do título, cantor se diz preocupado com o país

- LUIZ FERNANDO VIANNA

RIO DE JANEIRO Zeca Pagodinho tem vários motivos para estar triste: amigos que morreram recentemen­te; o grande amigo Arlindo Cruz mal de saúde; o Rio de Janeiro e o Brasil em dificuldad­es.

Está lançando, porém, um álbum intitulado “Mais Feliz”, já disponível nas lojas e plataforma­s digitais. São 11 músicas inéditas e três gravadas pela primeira vez na sua voz.

Ele diz que procura se sentir feliz. “Estou com 60 anos. Diziam que eu não durava 30”, ri, numa alusão à intensa boêmia.

Comemora ter dois netos, frutos de Eduardo e Eliza, os mais velhos de seus quatro filhos. Está na expectativ­a de Louis lhe dar mais um neto. “O moleque demora. Ainda vai casar para ter um filho. Por que não faz ao contrário? Quer ser diferente da família.”

O cantor parecia realmente feliz durante esta entrevista, concedida na tarde de segunda (16) no Bar do Zeca, que ele abriu há um ano na Barra da Tijuca. “Este aqui é o segundo Zeca. Depois das 18h é outro. Aproveita!”, alertou. O primeiro Zeca é o da manhã, que nem sempre se lembra do que o terceiro Zeca fez na véspera.

Em “Na Cara da Sociedade” (Serginho Meriti e Claudemir), ele pede paz “no mundo, no Brasil e, principalm­ente, no Rio de Janeiro”. Sua cidade é sua infelicida­de.

Zeca encomendou a Meriti (autor de “Deixa a Vida me Levar”) um samba que expressass­e suas preocupaçõ­es. A letra diz: “É a bala perdida, é a guerra, o caos/ É a ignorância dos votos nos bons homens maus”. Apesar deste verso, não quer mais falar de política. “Não entendo e não acredito em ninguém.”

Mas acredita no futuro. “Tem que melhorar, não tem como piorar.” É como diz a letra de “O Sol Nascerá”, clássico de Cartola e Elton Medeiros: “Finda a tempestade, o sol nascerá”.

Quero dedicar essa obra a meu compadre, amigo e parceiro Arlindo Cruz. Esperando que na próxima ele esteja comigo no estúdio como sempre foi Zeca Pagodinho, no disco ‘Mais Feliz’

Elton, que morreu em 4 de setembro, foi uma das perdas recentes. Nos últimos dois anos também se foram Almir Guineto, Wilson das Neves, Luiz Melodia, Barbeirinh­o, Luiz Grande, Wilson Moreira, Beth Carvalho e Dona Ivone Lara, além de Paulinho Galeto, por muito tempo cavaquinis­ta de sua banda.

É o primeiro disco de Zeca sem Arlindo Cruz por perto. Em março de 2017, ele sofreu um AVC hemorrágic­o, do qual busca se recuperar. Zeca acompanha tudo, mas optou por não vê-lo. “Prefiro guardar a lembrança que eu tenho. Acho que não vou me sentir bem, ele também não. Ele vai se emocionar.”

Mas o CD é dedicado a Arlindo. No encarte há uma dedicatóri­a manuscrita. E “Nuvens Brancas de Paz” é uma homenagem dos dois amigos e de Marcelinho Moreira à Portela.

A faixa-título já tinha sido gravada por um dos autores, Toninho Geraes (o outro é Paulinho Rezende). E a última é “Apelo”, de Baden Powell e Vinicius de Moraes, com apenas Yamandu Costa (violão de sete cordas) e Hamilton de Holanda (bandolim) no acompanham­ento. A canção era ouvida por Zeca nas casas de sua família, no Irajá e em Del Castilho, no subúrbio carioca. “Era iê-iê-iê na sala e seresta no quintal. E sempre teve samba”, recorda. “A vida me botou nesse caminho [da música]: ‘vai por aqui’.”

O novo CD tem marcas de outros, a começar pela direção musical de Rildo Hora e pelos instrument­istas, com Paulão Sete Cordas à frente. E há compositor­es frequentes. Para citar alguns: a dupla Monarco/mauro Diniz, pai e filho, em “Peregrinaç­ão”; Nelson Rufino em “Permanênci­a” e Marcos Diniz (com Rosania Alves) na divertida “O Carro do Ovo”.

Mas há surpresas, como um forró do portelense Serginho Procópio e uma letra sofrida como Zeca não fazia havia muito tempo: “Enquanto Deus me Proteja”, primeira parceria com Moacyr Luz, que diz ter feito melodia emocionada.

Estreantes no time são Rafael Delgado, de 39 anos, e o experiente Ronaldo Barcellos, autores de “Quem Casa Quer Casa”. Em seu sítio em Xerém (Baixada Fluminense), Zeca ouviu Delgado cantar e se entusiasmo­u com as citações a bairros que ele percorreu muito, como Marechal Hermes e Vigário Geral. “Era um caldeirão naquele dia em Xerém, cheio de feras. Mas tomei coragem e mostrei. Ser gravado pelo Zeca é o sonho de qualquer sambista”, festeja Delgado. (Folha)

 ?? Washington Possato-5.jan.17/divulgação ?? Arlindo Cruz ainda se recupera de um AVC que sofreu em 2017
Washington Possato-5.jan.17/divulgação Arlindo Cruz ainda se recupera de um AVC que sofreu em 2017

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil