Fim de ‘Éramos Seis’ traz mensagem de esperança em meio ao coronavírus
Lola, que refez sua vida ao lado de Afonso, mostrou ao público que sempre é tempo de recomeçar
ANÁLISE
Quando Angela Chaves decidiu mudar a narrativa e escrever um final feliz para Lola (Gloria Pires) em “Éramos Seis” (Globo), a autora provavelmente não fazia ideia que o último capítulo da trama seria exibido em meio à pandemia do coronavírus. Mas a mudança foi pertinente. Imagine se, no momento atual, fosse mantido o final do livro de Maria José Dupré ou das versões anteriores da novela para a TV, com Lola sozinha em um asilo, triste e abandonada pelos filhos?
Mostrar a matriarca da família Lemos refazendo a vida ao lado de Afonso (Cássio Gabus Mendes) levou a mensagem positiva e de esperança de que, sim, sempre há chance de recomeçar. Mensagem especialmente importante para o público da novela, sabidamente formado por pessoas mais velhas, justamente as mais vulneráveis à Covid-19 e que devem ficar em isolamento.
Alguns críticos de TV não apreciaram a inovação, dizendo que houve distorção da ideia do livro de Dupré —na obra, a família de seis pessoas termina com uma só.
A mudança, contudo, reflete o momento.atual A família Abílio Lemos, que Lola formou com Júlio (Antonio Calloni), não existia mais. Cada um dos filhos seguiu seu caminho, o marido e o primogênito morreram. Mas Lola teve a chance de reconstruir sua vida. E não é isso o que, afinal, o Brasil e o mundo terão de fazer depois do coronavírus?
O pesquisador Elmo Francfort, diretor do Instituto Memória da Mídia, era um dos achavam absurdo o romance entre Lola e Afonso. Mas ele mudou de opinião —pelo momento que vivemos e pela atuação de Pires e Cássio Gabus Mendes, que fizeram o público torcer pelo casal. “Com tantas notícias tristes, [o final] nos traz esperanças e um respiro”, afirma.
A versão da Globo de “Éramos Seis” deu um final feliz também para Alfredo (Nicolas Prattes) e Julinho (André Luiz Frambach) —este último teve a mudança mais surpreendente, guardada a sete chaves pela emissora. No livro e nas outras adaptações para a TV, Julinho se rendia ao dinheiro da mulher, embora estivesse infeliz. Agora, ele se separa e descobre que não adianta só ficar rico, sem amor.
O último capítulo teve ainda referências políticas. A novela termina nos anos 1940, época de Getúlio Vargas na presidência e do Estado Novo. Em um diálogo, Alfredo fala que o Brasil vive uma ditadura, já que há censura à imprensa e o Congresso é fechado. Parece um aviso da autora para que os espectadores fiquem atentos a ações autoritárias dos atuais governantes.
Mensagens feministas também foram transmitidas. Tia Candoca (Camila Amado) fica noiva de Isidoro (Emiliano Queiroz), em mais um recado de Angela Chaves de que não importa a idade, é sempre possível recomeçar. O noivo reclama do batom vermelho dela, ao que Candoca responde, longe da submissão: “Eu vou usar batom quando eu quiser”.
O único momento triste foi a morte de Maria (Denise Weimberg), mãe de Lola, Clotilde (Simone Spoladore) e Olga (Maria Eduarda de Carvalho). Ainda assim, foi amenizado pelo discurso da personagem, que disse que soube viver.
Por fim, Lola diz: “A vida se transforma, e eu agradeço e sinto-me feliz”.