Agora

Livre de padrões

Brasileira­s aderem ao chamado movimento “ageless”, que defende a liberdade de ser e se vestir como quiser, independen­temente de idade

- KARINA MATIAS

Depois de se mudar de São Paulo para São Pedro, no interior paulista, a advogada Denise Andrade Gomes, 63 anos, decidiu criar uma página no Facebook para interagir com outras pessoas. E passou a fazer vídeos no Youtube com dicas sobre um tema que adora: maquiagem.

Alguns comentário­s, porém, a chocaram. Seguidoras a indagavam se mulheres na faixa dos 60 anos podiam se maquiar. “Eu falei: como é? Uma mulher na nossa idade pode usar salto 15 se ela tiver o hábito, pode usar o cabelo do jeito que ela quiser, pode se perfumar, usar bijuteria e roupas coloridas. Gente, o que é isso?”

Os vídeos foram publicados no fim de 2019, e a partir daí Denise se tornou uma influencia­dora digital. Ela tem 44 mil seguidores no Instagram, e sua página Se Reinventan­do Depois dos 50 no Facebook tem outros 331 mil seguidores.

Mais do que isso, a advogada virou exemplo do chamada movimento “ageless” —na tradução do inglês, a palavra significa “sem idade”. O conceito, contudo, é mais amplo e vem sendo utilizado para designar pessoas acima dos 50 anos que não se definem pela faixa etária e se veem livres de patrulhas e amarras do que podem ou não usar e fazer, seja na moda, na beleza ou no comportame­nto.

Claudia Raia, 54 anos, é uma porta-voz do movimento, assim como a apresentad­ora Ana Maria Braga, 71, que recentemen­te chamou a atenção do público por pintar o cabelo de cores como rosa, azul e roxo.

“Não queremos rótulo, queremos ser uma mulher sem idade mesmo”, diz a consultora de imagem e estilo Rô Maciel, 61 anos, que se especializ­ou em atender esse público —formado, principalm­ente, por mulheres. “Com o passar do tempo, a gente se liberta de todos os padrões, de todas as culpas e amarras. Conquistam­os uma liberdade que não temos quando somos mais novas e conseguimo­s entender que o olhar do outro sempre vai ser o olhar do outro. Se você está segura, bem e saudável, isso é o que importa.”

Ela afirma que nunca foi de seguir moda, mas diz que atualmente se sente ainda mais segura. “Hoje sou totalmente eu, sou aquilo que eu sempre quis ser. E aí me perguntam: você queria ser mais nova? Jamais. Nunca eu queria ter meus 30 anos de novo, porque eu conquistei tanta coisa bacana.”

É permitido envelhecer

“É proibido envelhecer?” —essa é uma das reflexões que a advogada e influencia­dora Denise Andrade Gomes propõe em seus vídeos, textos e lives nas redes sociais. “As pessoas não entenderam ainda que o ser humano está vivendo muito mais.”

Na avaliação dela, o culto à juventude é muito forte no Brasil e é ainda mais cruel com as mulheres. Ela cita o fato de ter os cabelos grisalhos e, vez ou outra, ouvir comentário­s de pessoas incomodada­s com a sua escolha.

“Ainda é um tabu. Me falam: ‘Pinta esse cabelo, você está envelhecid­a em dez anos’”, conta.

Rosangela Marcondes, 65, vai na contramão dessa busca pela eterna juventude. Cansada do tempo que perdia (e do dinheiro que gastava) no salão de beleza para pintar o cabelo, resolveu assumir os brancos em 2016. Em um primeiro momento, descoloriu os fios que até então eram tingidos de vermelho.

O resultado inicial não foi exatamente o que ela buscava, mas a agradou. O cabelo ficou com mechas loiras em meio ao branco platinado. “Eu não sabia direito o que queria, mas eu me dei conta de que aquela mulher era incrível. Me senti plena, fashion e interessan­te.”

E foi assumindo o grisalho natural. “Até as minhas filhas falaram: ‘mamãe, você é uma nova pessoa’”. Ela não sabe dizer exatamente de onde partiu essa transforma­ção, mas diz que talvez tenha sido resultado do amadurecim­ento de se aceitar. “Você sai do lugar-comum onde todos estão cumprindo aqueles papéis, as tendências.”

Rosangela, que se autodenomi­na uma “inspirador­a digital”, diz que sempre admirou o envelhecim­ento e afirma não querer fazer nenhuma intervençã­o estética. “Escolhi ter um olhar mais afetivo, amoroso, com a vida, com a velhice, com tudo. Sou encantada com esse bando de velhos que eu encontro nas viagens, eles me emocionam.”

Vale ressaltar que o propósito do movimento “ageless” não é definir se a mulher deve ou não pintar o cabelo. Nem proibir plásticas. Mas, sim, deixá-la livre para ser o que quiser, sem julgamento­s ou regras limitadora­s por causa da sua idade.

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Rubens Cavallari/folhapress Rosangela Marcondes, 65: ‘Escolhi ter um olhar mais amoroso para a velhice’
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