Sem pitaco
Com a produção afetada pela pandemia de Covid, novelas inéditas entram no ar com gravações já encerradas, sem chance de mudanças no enredo após resposta do público
Com a pandemia do novo coronavírus, a produção cultural precisou se adaptar. Além de filmes, séries e reality shows, as mudanças chegaram às novelas, que passaram a ser gravadas em outro ritmo, para não colocar em risco a saúde da equipe.
A Globo, até então, costumava lançar as tramas com os episódios ainda em aberto, com a possibilidade de adaptar o enredo conforme a resposta do público. Mas, diante das medidas de restrição e para evitar qualquer surpresa no cronograma, novelas como “Amor de Mãe” e “Salve-se Quem Puder” voltaram ao ar como obras fechadas, com todos os episódios já gravados —os capítulos inéditos da novela das 19h vão ao ar a partir de segunda-feira (17).
Daniel Ortiz, autor de “Salve-se Quem Puder”, conta que foi pego de surpresa em 2020 quando soube que a novela teria que ser dividida em duas partes. “Tive 48 horas para arrumar uma solução.”
Ele, então, precisou criar um gancho interessante para a sequência, quando a novela voltasse à TV —a trama saiu do ar em março de 2020, e as gravações só foram retomadas após cinco meses.
“Foi bem trabalhoso. Reescrevi a segunda fase umas quatro ou cinco vezes. Porque, além de adiantar 40 capítulos, tive de fazer adaptações na história em função das restrições para a gravação, seguindo os protocolos de segurança”, diz Ortiz.
De acordo com Clarice Greco, doutora em comunicação pela USP, a obra aberta é uma marca da teledramaturgia brasileira. “As novelas da Globo foram as primeiras e por muito tempo as únicas a serem obras abertas.”
Mauro Alencar, doutor em teledramaturgia pela USP, diz que o “calor do público” é importante para a produção TV brasileira. “Com o roteiro em aberto, o autor tem a possibilidade de levar a trama para um lado ou para outro, ele consegue sentir o calor do público”, diz. “Com o produto pronto, não. Não há o que questionar, aquela obra é fechada. É muito mais cômodo porque, aconteça o que acontecer, o produto já está pronto.”
No caso das obras abertas, acompanhar as respostas dos telespectadores é fundamental. “Antes das redes sociais, a Globo fazia até grupo focal [método de pesquisa]. Algumas pessoas eram chamadas para falar sobre o andamento das novelas”, explica Clarice Greco.
Alencar relembra novelas que tomaram rumos diferentes ou focaram alguma pauta específica a partir da resposta do público (veja alguns exemplos no quadro ao lado). Na avaliação dele, isso mostra que a teledramaturgia brasileira utiliza “a realidade das ruas como matéria-prima para a ficção.”
“A novela, como a literatura, é um documento histórico fundamental para mostrar o desenvolvimento e