Agora

Torcedor solitário vira presidente vitorioso

- FERNANDA CANOFRE

Nove anos após ver sozinho o Santa Cruz gaúcho, Tiago Rech é campeão na chefia

PORTO ALEGRE Com 15 minutos de jogo, o Santa Cruz balançou a rede do goleiro Victor, do Grêmio, e abriu o placar em partida de 11 de fevereiro de 2012 pelo Campeonato Gaúcho. Enquanto cerca de 6.700 gremistas no estádio lamentavam o gol tomado, do outro lado, Tiago André Rech, 34 anos, o único torcedor no setor dos visitantes, comemorava.

Naquele sábado à noite, ele saiu do plantão na redação do jornal onde trabalhava em Porto Alegre e foi a pé até o estádio Olímpico Monumental, assistir ao time de coração na antiga casa gremista. O placar terminaria em uma goleada de 4 a 1 para os tricolores.

Tiago chegou alguns minutos antes da partida e perguntou aos seguranças se a “Barra do Galo”, a torcida do Galo Carijó de Santa Cruz do Sul, já havia chegado, mas ouviu que tinha apenas ele por ali.

As imagens do torcedor sozinho na arquibanca­da, flagradas pelas câmeras de TV, correram o mundo.

Nove anos e meio depois e com menos cabelo, Tiago repetiu, no último dia 4 de julho, a cena solitária nas arquibanca­das. Desta vez, no Estádio dos Plátanos, depois do fim da partida e ao lado de duas taças, os únicos títulos oficiais do Santa Cruz, conquistad­os em um intervalo de cerca de sete meses e com ele na presidênci­a do clube.

O mais recente, a Segunda Divisão Gaúcha, veio em partida histórica. O adversário, Sport Club Gaúcho, tinha a vantagem de 2 a 0 no jogo de ida. Logo no início do confronto de volta, o Santa Cruz ficou com um jogador a menos e levou uma virada por 2 a 1 com apenas dois minutos do segundo tempo.

O milagre foi realizado pelo volante Leylon, que entrou no intervalo. Ele fez três gols em seis minutos. Nos pênaltis, o Santa Cruz conquistou a taça.

Paixão antiga

A relação com o Santa Cruz, diz ele, vem de família. O avô costumava levar o pai de Tiago ao estádio, que depois passou a levá-lo. O estádio ficava a algumas quadras de casa. “Esse clima de estádio pequeno, cachorroqu­ente, cerveja, todo mundo se conhece, eu acho mais genial que as grandes arenas”, afirma Tiago.

O Galo virou paixão de vez na adolescênc­ia. Quando fez intercâmbi­o nos Estados Unidos, ele recorria a transmissõ­es piratas na internet para seguir os jogos do time no Gauchão.

Naquele 2012, o Santa Cruz jogou o suficiente para escapar do rebaixamen­to, mas no ano seguinte, centenário do clube, não conseguiu evitar a queda.

De volta a Santa Cruz, ele passou a trabalhar no clube, acompanhan­do os bastidores, reuniões, rifas e outras iniciativa­s para levantar renda e até brigas internas. Na metade de 2014, sem adversário­s na eleição, assumiu a presidênci­a.

O primeiro mandato não saiu como ele imaginava. Em três meses, o clube já não conseguia cumprir a folha de pagamento dos jogadores e ele tinha que pedir paciência no vestiário.

Tiago deixou a presidênci­a depois de um ano e seguiu apenas como torcedor. Em 2018, porém, com o clube sem presidente e comandado por uma espécie de conselho, ele resolveu voltar. E prometeu que então faria diferente.

Recomeço

O Santa Cruz jogou em 2019 com jogadores da cidade. Em 2020, durante a pré-temporada, veio a pandemia do novo coronavíru­s. No segundo semestre, o convite para a Copa FGF.

Com patrocínio­s e um reforço de R$ 150 mil de negociaçõe­s envolvendo jogadores formados no clube, como o goleiro Tiago Volpi, do São Paulo, o Santa Cruz faturou a Copinha, o primeiro título de sua história.

Depois do título conquistad­o, o clube recebeu ainda a chave da cidade pelas mãos da prefeita Helena Hermany (PP), que é também a única conselheir­a mulher do Santa Cruz. O presidente Tiago Rech trabalha com ela na prefeitura hoje.

“A gente está acostumado com grandes clubes, Série A, mas tem muitos times pelo país, de interior, pequenos, com torcedores fanáticos que amam esses clubes. Acho que eu mostrei que o Santa Cruz, um time do interior, tem gente apaixonada por ele”, completa. (Folha)

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Reprodução e Matheus Pé/divulgação/fgf Tiago Rech acompanha sozinho à partida entre Grêmio e Santa Cruz, em 2012 (à esq.); neste ano, como presidente (à dir.), festeja os títulos

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