Agora

Equipe criada por padre busca 1º acesso em quase 70 anos

Fundado por missionári­o italiano, Vocem precisa vencer a Matonense na ‘Segundona’ do Paulista

- EMERSON VOLTARE

“Agora a pergunta do milhão: qual o significad­o da sigla Vocem?” Não raro era encontrar um garoto na região de Assis (438 km a oeste da capital paulista), em 1984, que tinha a resposta na ponta da língua: “Vila Operária Clube Esporte Mariano”. Era o auge do Esquadrão da Fé, fundado em 1954 pelo padre Aloísio Bellini (1911-1996).

Naquela época, os estaduais rivalizava­m o interesse dos grandes clubes em importânci­a com o Brasileiro. E também não era diferente em São Paulo. O Campeonato Paulista, vencido pelo Santos no mesmo ano, abrigava 20 times na elite, com turno e returno. E tomava a maior parte do calendário da temporada.

Pela “Segundona” (hoje quarta divisão do Estadual de SP), mais de 50 agremiaçõe­s, entre elas Saad, Radium e Velo Clube, brigavam por uma vaga no quadrangul­ar final, que geralmente era disputado em estádios da capital paulista. O campeão e o vice ficavam com as vagas de acesso.

Na semifinal daquele ano, no entanto, Vocem e União Barbarense viram Noroeste, de Bauru, e Paulista, de Jundiaí, subirem.

Foi até então a única real chance de o time dos “marianinho­s”, garotos de Assis que só podiam jogar depois da missa pelo time do pároco da Vila Operária, obter seu primeiro acesso de divisão no futebol profission­al de São Paulo.

Mas até esta semana. O clube cujo escudo traz a expressão “audite vocem domini” (“ouça a voz do senhor” na tradução do latim), tenta neste domingo (24) um pequeno milagre. O Vocem precisa de uma vitória diante da Matonense, a partir das 10h (a plataforma Paulistão Play e o canal Eleven transmitem o duelo).

No jogo de ida da semifinal da segunda divisão do Paulista, houve um 0 a 0 na casa do Vocem. A equipe de Matão agora joga em seus domínios pelo empate, por ter feito melhor campanha.

Depois de mais de uma década entre instabilid­ades e ausências, o Vocem retornou ao Paulista para a disputa da “Segundona” em 2014. Outros 48 clubes nas séries A-1, A-2 e A-3, 16 em cada uma, formam a atual elite do futebol paulista.

Mesmo depois de cair ainda na primeira fase no ano passado, a diretoria do

Vocem apostou na manutenção do elenco e do técnico Betão Alcântara. Mas, após dois empates, o treinador acabou sendo substituíd­o por Carlos Alberto Seixas, centroavan­te do Palmeiras na década de 1980.

Nas oitavas de final, porém, o clube contratou Paulo César dos Santos, o PC, eliminado na primeira fase com o rival Assisense. A partir daí, sob nova direção, o time do padre passou no mata-mata pelas tradiciona­is equipes interioran­as do XV de Jaú e do Rio Branco.

Na diretoria, o presidente Lauro Valim, empresário de 54 anos, faz as contas. Mesmo um time jovem, com salários relativame­nte modestos, a folha não custa menos de R$ 90 mil por mês (cerca de R$ 1 milhão por ano). Um inédito acesso poderia assegurar os investimen­tos que diversas empresas regionais têm feito para bancar as vestes branca e vinho (corpo e sangue de Cristo), cores do uniforme do Vocem.

A ligação com a Igreja Católica se deu pelo padre Aloísio Bellini, que por 34 anos foi o pároco de uma região de trabalhado­res de baixa renda em Assis.

Desde a fundação em julho de 1954, o clube disputou jogos amadores no interior do estado até ganhar a profission­alização, em 1978. Embora as equipes sempre contassem com técnico, quem ficava a cargo das preleções era o padre. “Ele montou o time, à época chamado Marianinho, e os jogadores eram obrigados a frequentar a igreja. Ele seguiu como nosso patrono, inclusive virou mascote, o Bellininho”, explica Valim.

Apenas rezar antes das partidas não era o suficiente: para jogar, os meninos também eram obrigados a comparecer à missa todos os domingos.

A morte do padre, em um convento na Itália, em 1996, foi motivo para decreto de luto oficial de três dias em Assis, onde ele foi reconhecid­o como cidadão assisense em 1984. (Folha)

Ele [Bellini] montou

o time, à época chamado Marianinho,

e os jogadores eram obrigados a frequentar a igreja Lauro Valim, presidente

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Vocem/divulgação O padre Aloísio Bellini com o time montado por ele em 1954; neste domingo, o Vocem precisa da vitória sobre a Matonense para chegar à Série A-3 paulista

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