MEU NOME É AMANDA
opina João, ao contar que o equilíbrio emocional guiou a seleção dos 14 personagens que são entrevistados em Liberdade de Gênero.
NEM HOMEM, NEM MULHER Outras histórias marcantes costuram a série, como a de Liniker, 21, vocalista da banda paulista Liniker e Os Caramelows. Além de preferir ser tratado no artigo feminino, Liniker define seu gênero como fluido, não binário (nem homem, nem mulher) e conta que usa maquiagem e roupas femininas porque é assim que se sente bem.
Já o funcionário público cearense Sillvio Lúcio, 52, nasceu mulher e há 12 anos se identifica como homem trans. Casado há 16 anos com uma mulher, que acompanhou sua transição, diz que não se definiu homem trans antes por pura falta de conhecimento. “Sempre me senti diferente e foi conhecendo a história de outras pessoas que eu me identifiquei”, conta Sillvio.
Outra entrevistada que se destaca é a psicanalista e escritora Letícia Lanz, 64, que mora em Curitiba e é casada há 40 anos com uma mulher. Mãe de três filhos e três netos, Letícia conta que nasceu Geraldo e só fez a transição de gênero após 30 anos de casamento, quando um infarto a fez assumir sua identidade.
“Nasci macho, sempre quis ser mulher e gosto de mulher. Então eu era uma aberração até para o gueto. Não me incluo nem como homem, nem como mulher, nem como trans. Eu sou Letícia Lanz, uma construção de mim mesma”, diz com tranquilidade. “Outra coisa: eu não nasci no corpo errado, eu nasci na sociedade errada. Meu corpo está certo”, completa a psicanalista que ressalta que “Geraldo não morreu, só evoluiu”.
“Essa série é realmente muito diferente. Ela é mais revolucionária”, ressalta João Jardim, ao comparar Liberdade de Gênero com suas outras séries, responsáveis por abordar temas como as novas configurações familiares, os novos tipos de amor (como o poliamor) e as compulsões.
ACEITAÇÃO
Gênero que marca a nova série de João Jardim, o documentário permite que o entrevistado conte sua história sem intermediações. “Ali você tem uma primeira pessoa contanto como é esse processo de aceitação física, psicológica e afetiva”, explica o diretor. “Existe a mão do diretor, mas cada um conta sua história, sem um repórter traduzindo aqueles universos”, completa.
Então João reforça que a ideia de Liberdade de Gênero é sair da visão superficial e mergulhar na rotina dessas pessoas transgênero, para que se entenda a realidade delas e se conheça como são incluídas na sociedade. “Essa série aproxima essas pessoas de nós mesmos. Essa pessoa é igual a mim, a qualquer um de nós, só que ela é transgênera, ela não é uma doente”, pontua.
Afinal, essas questões estão em cada vez mais em pauta porque a sociedade está se revisando, ou por que está cada vez mais conservadora? “As duas coisas”, responde João, ao afirmar que existe uma revolução provocada pelas redes sociais - que permite que as pessoas tenham voz e encontrem espaço - e uma reação conservadora a tudo isso.
“Como tem mais gente indo para esses lugares, vira uma ameaça. Mas o importante de abordar esses temas é dar uma normalidade para eles, tirar a aura de que podem ser uma ameaça. Os interesses têm que ser debatidos”, defende. Amanda Guimarães, 28 anos, não tem problema em revelar que nunca se imaginou fazendo sexo com um homem, sendo homem. Daí vem sua decisão em fazer a cirurgia de redesignação sexual. “Volta e meia eu pensava em pegar uma faca e cortar fora o safado, porque eu não ia usar mesmo”, revela a youtuber em seu recém-lançado livro de estreia: Meu Nome É Amanda (Fábrica 231/Rocco/ R$ 19,50/136 páginas). Caçula de quatro filhos, Mandy Candy, como também é chamada, narra com bom humor sua história transgênero no livro escrito em primeira pessoa. “Ainda não caiu a ficha que eu tenho um livro, viada, tô chique, hein?! Me segura que eu tô no chão! Nunca em vinte e tantos anos imaginei que minha história pudesse servir de inspiração para muita gente”, diz a autora nos agradecimentos do livro. Curioso é que, ao longo das 136 páginas, o leitor encontra relatos íntimos sobre infância, primeiro beijo, rolos com os colegas do trabalho, preconceitos sofridos e outros momentos delicados da vida da youtuber. A única coisa que não é encontrada no livro é seu nome de nascimento. Mas isso pouco importa, afinal a resposta está estampada no título da obra: Meu Nome É Amanda.
Autora Amanda Guimarães
Editora Fábrica 231/Rocco
Preço R$ 19,50 (136 páginas)