Correio da Bahia

NOBEL TROVADOR

- ANA CRISTINA PEREIRA

O debate sobre o quão poética é uma letra de música é bem antigo. Mas ontem, ao anunciar o nome do cantor e compositor americano Bob Dylan, 75 anos, como vencedor do Nobel de Literatura 2016, a Academia Sueca parece que resolveu mandar um recado direto para os mais tradiciona­is: os tempos são outros.

E o trovador Dylan, com suas mais de cinco décadas de dedicação à poesia musical, merece sim a distinção que faltava na sua coleção, que inclui o Oscar, o Globo de Ouro e o Grammy, além de outros mimos como o Príncipe das Astúrias, concedido pela família real espanhola. E claro, o registro no Hall da Fama do Rock.

Apesar do nome de Dylan frequentar as bolsas de apostas, a entrega do prêmio pela primeira vez a um cantor e compositor veio cercada de surpresa e polêmica. “Ele é um grande poeta na tradição inglesa e, por 54 anos, vem se reinventan­do, criando novas identidade­s”, justificou a secretária permanente da Academia, Sara Danius, logo após o anúncio. “Pode parecer uma decisão radical, mas, se olharmos lá para trás, há Homero, Safo, que escreviam poemas para ser ouvidos, cantados, e é a mesma coisa com Bob Dylan. Ainda lemos esses dois”, comparou.

O livro que garantiu a entrada de Dylan para o time de gênios como Ernest Hemingway, William Faulkner e Gabriel García Márquez foi The Lyrics: 1961-2012, lançado em edição limitada em 2014. A editora já garantiu que a nova edição sai em breve. Talvez a premiação anime Dylan a lançar o segundo e terceiro volumes das suas Crônicas, a autobiogra­fia cujo primeiro tomo saiu em 2004.

A escolha de Bob Dylan, sem dúvida, também traz um novo frescor à premiação - que nunca mais tinha repercutid­o tanto. Do presidente americano Barack Obama, que disse que Dylan é um dos seus “poetas preferidos”, ao escritor Salman Rushdie, que destacou que a “excelente escolha honrou o brilhante herdeiro da tradição dos bardos”. Muitos correram para as redes sociais também para jogar pedras. O escritor escocês Irvine Welsh resumiu o ressentime­nto: “Nostalgia deslocada, saída das próstatas antiquadas de um grupo de hippies senis”.

Ainda não sabemos o que Dylan está pensando sobre o assunto. De acordo com um representa­nte do músico, sua resposta após o anúncio da Academia Sueca foi “sem comentário­s neste momento”. Mas quem tinha comprado ingresso para vê-lo, ontem, em Las Vegas, deve ter comemorado com ele, ao som de suas belas canções.

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Bob Dylan, 75 anos, é o vencedor do Nobel de Literatura 2016
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Cena do documentár­io Don’t Look Back com videoquê da música Subterrane­an Homesick Blues

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