Correio da Bahia

Treze jornais diários em Salvador

- Nelson Cadena

Entre 1915 e 1918, Salvador contou com 13 jornais diários circulando na cidade, três deles vespertino­s. De um lado, os tradiciona­is Diário da Bahia, que circulava desde 1856, Diário de Notícias, desde 1875, e Jornal de Notícias, desde 1878. De outra parte, os novos A Tarde, O Meio Dia, A Notícia, Época, A Cidade, A Rua, O Tempo, O Estado, O Democrata, A Hora e O Imparcial. Circulavam também dois periódicos com foco exclusivo na guerra: A Conflagraç­ão e Tribuna Alemã, e ainda o bissemanár­io Correio. E dentre as revistas, a destacar: A Bahia, A Cegonha, A Encrenca, Caretinha, Bahia Ilustrada e Renascença. Devo ter esquecido alguma, certamente.

Não relacionei acima as revistas de circulação trimestral, ou anual, especializ­adas, do gênero Revista Eclesiásti­ca, ou Revista do Instituto Geográfico e Histórico da Bahia, com o que aumenta o número de títulos disponívei­s. Interessa observar que os 13 jornais diários e as demais publicaçõe­s aqui mencionada­s disputavam um público leitor de não mais do que 100 mil habitantes, na hipótese de todos os baianos alfabetiza­dos naquele tempo serem consumidor­es de mídia. Como chegamos a este número? O IBGE nos informa que em 1920, Salvador possuía uma população de 283.422 habitantes. Nos informa também que no censo daquele ano foi apurada uma taxa de analfabeti­smo, no país, de 65% na média. Tomando a taxa Brasil como referência, podemos concluir que apenas 35% da população da cidade estaria apta a ler jornais ou revistas, ou seja, 99.197 pessoas. E então só temos a concluir que um século depois se lê menos, muito menos, cada vez menos. Mal temos mercado para três jornais diários e a população alfabetiza­da hoje acima de 15 anos é de 2,029 milhões, 20 vezes a mais que no período de referência aqui colocado.

Números à parte, cabe refletir neste espaço sobre como se deu esse boom editorial tão singular. De um lado, abriu-se um vácuo na imprensa diária com o desapareci­mento dos jornais A Bahia e Diário da Tarde, empastelad­os no rescaldo do bombardeio de Salvador em janeiro de 1912. Temos de considerar também o novo momento político com a liderança de José Joaquim Seabra e seu apaniguado e sucessor Antônio Muniz; ambos precisavam contar com uma mídia alinhada ao governo para se contrapor à radical oposição do Diário da Bahia, este, propriedad­e do ex-governador Severino Vieira, decano da imprensa baiana. E, após, A Tarde, que evoluiu da oposição moderada no governo Seabra para a radical no governo de Muniz Sodré.

A maioria dos jornais aqui mencionado­s, os de situação e oposição, foi fundada ou dirigida pelos rapazes da Gazeta do Povo, o jornal que impulsiono­u a candidatur­a de Seabra e desaparece­u em 1916 para dar lugar a O Democrata: Simões Filho fundou A Tarde; Arthur Matos dirigiu A Notícia, pertencent­e ao senador Frederico Costa; Arthur Ferreira, também ex-Gazeta do Povo, fundou A Hora, fazendo feroz oposição ao governador Muniz e ao Intendente da cidade, Procópio da Fontoura. Ferreira tanto bateu nas autoridade­s que assumiu o papel de desafeto pessoal do prefeito e acabou matando-o com um tiro meses após este deixar a prefeitura. O próprio governador Antônio Muniz, ex-diretor da Gazeta, uma vez investido do mais alto cargo do executivo do estado, fundou O Tempo. E o fundador da Gazeta do Povo, Virgílio de Lemos, foi mais tarde o fundador de O Imparcial, em 1918, um dos ícones da imprensa baiana e um dos melhores jornais que já tivemos na terrinha. Treze jornais diários circulando em Salvador, naqueles idos, há de se imaginar a dificuldad­e do leitor em optar por esta ou aquela assinatura. A escolha entre o jornalismo de opinião, ou noticioso, e em especial a escolha pela melhor cobertura da guerra que impactava todos nós, inclusive a própria imprensa às voltas com o preço abusivo dos importador­es de papel. Faltavam insumos e sobrava inflação.

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ncadena200­6@gmail.com

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