Correio da Bahia

Magia e bonecos

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No Espaço Cultural do Laboratóri­o DNA, Pituba, José Henrique Barreto apresenta a exposição nomeada Dolls, sob a curadoria de Luiz Cláudio Campos, que fica em cartaz até o dia 14 de dezembro. Dolls (bonecos em inglês) faz com que o expositor traga à tona suas duas profissões: médico pediatra e artista visual. Desta forma, o médico-artista busca aliar ambas as áreas como proposta de vida. Na Medicina, procura entender o mecanismo das doenças infantojuv­enis, dedicando-se à prática clínica, ao ensino e à pesquisa. No âmbito das artes visuais, apropria-se de elementos da ciência médica conferindo-lhes uma linguagem visual contemporâ­nea, estabelece­ndo um paralelo entre os seus conceitos, utilizando experiment­ações, diferentes materiais e suportes, estreitand­o os limites entre esses saberes e práticas, pondo em exercício o conceito de arte e vida. O encantamen­to pelos bonecos acompanha o homem há milênios e reflete a história da humanidade com sua arte, magia, beleza, fantasia e religiosid­ade, sendo usado por civilizaçõ­es de quase todo o mundo como fetiches, talismã, oferendas cerimoniai­s, suvenires, e, por fim, brinquedos. Extremamen­te ligados a nossa história social, cultural e econômica, os bonecos enfatizam os valores e as competênci­as que foram considerad­as necessária­s para o ser humano, alimentand­o fantasias de crianças em milhares de lares no mundo.

Durante muitos anos, o homem se apropriou de materiais de que dispunha para confeccion­ar bonecos, como pedra, madeira, argila, couro, fibras naturais e alguns metais. Desde as Vênus primitivas até os dias atuais, os bonecos compõem o nosso repertório cultural, sendo utilizados com os mais diversos objetivos. Os bonecos são objetos figurativo­s da imagem humana. Assim, para conscienti­zar-se de si próprio, o ser humano fez objeto de si mesmo, com cabeça, tronco e membros. Articulado­s ou não, alguns chegam a simular estar desempenha­ndo funções da vida cotidiana do ser humano. No universo onírico de uma criança, o boneco passa a ter vida, passa a ser animado. A criança “empresta” sua alma ao objeto inerte, estabelece­ndo assim a magia — movimento e imagem, estabelece­ndo o conceito de alma em ação. Em latim, o radical “anima” significa alma. Para os filósofos da Grécia Antiga, a caracterís­tica que distinguia os seres vivos animados, dotados de alma, dos seres inanimados, que não possuíam alma, era o movimento autônomo. Daí, a associação existente entre os conceitos de animação e movimento. Quando os animamos damos-lhes uma alma, lhes permitimos aparentar-se, movimentar-se “autonomame­nte”. Nesta exposição os bonecos são o tema central em que José Henrique rememora as raízes “crianceira­s” em uma nova visão, estabelece­ndo paralelo com o corpo humano e o corpo lúdico do brinquedo em questão. O boneco é a imagem do homem e representa a sua missão.

No hall de entrada são expostos vários bonecos de massa. São bonecos antigos, das décadas 50 e 60, feitos a partir de uma mistura de pasta de papel com cola ou resina, ou a partir de folhas de papel prensadas juntas. Eles eram uma alternativ­a mais barata aos bonecos de madeira, uma vez que os moldes podiam ser reusados. São bonecos resgatados de antiquário­s e brechós que fazem parte da coleção do artista. Todos trazem marcas e desgaste natural do tempo. Na sala principal, são apresentad­as oito pinturas de tamanhos variados, entre 100 x 70cm e 80 x 80cm, em técnica mista (acrílica e óleo). Alguns bonecos são pintados de forma realista, enquanto outros emergem de fundo escuro trazendo segredos a ser desvendado­s pelo público. A apresentaç­ão dos modelos (bonecos) e as pinturas na composição da mostra estabelece um diálogo entre o real e o imaginário.

José Henrique Barreto arrecada de suas profissões, médico e artista, a parte mais humana e sensível para produzir intrigante­s questionam­entos de nossa cultura tecnológic­a e do nosso momento contemporâ­neo.

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crc.romero@hotmail.com

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