Correio da Bahia

Nós, torcedores, merecemos mais

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Se você acha que jornalista não tem direito a torcer por um clube, pode parar a leitura. Sábado, fui pra arquibanca­da com a camisa do Bahia. Se você pode ir para o estádio com a camisa do seu time, por que eu não posso? Ah, tá. Você não trabalha com futebol. Só lamento... Você não sabe o que está perdendo.

Meu sentimento não interfere na minha capacidade crítica. Se você discorda, não me leia, não me assista e não me ouça. É um direito seu. Mas cansei de me esconder. Torcer não é ofensa, contanto que, na, minha profissão, se faça isso no lugar certo. Não fosse a paixão de torcedor, como eu teria virado jornalista esportivo? Como amar o futebol e não ter um time? Como ter nascido em Salvador e não ser Bahia ou Vitória? Chega de hipocrisia, na moral. Penitencio-me por minha omissão nos últimos anos. E peço desculpas.

Na TV, no rádio e aqui no jornal nunca misturei as coisas. Trabalho não é lugar de torcer. Tanto é que já tive perrengues públicos com personagen­s tricolores. Cobrei o então diretor Paulo Angioni, aqui no Correio, em 2012, e ganhei nota de repúdio no site oficial do Bahia. Chamei de ultrapassa­do o então técnico Joel Santana, em entrevista na TV, em 2013, e ele soltou os cachorros pra cima de mim. No dia seguinte, Joel levou de sete no BAVI e foi demitido. Critiquei o atual presidente Marcelo Sant’Ana e ele parou de falar comigo. Meus posicionam­entos não geraram entreveros somente no Fazendão. Alexi Portela já me ligou para reclamar. Carlos Falcão ficou irritado quando o indaguei se vestir camisa com os dizeres “com o Vitória em qualquer divisão” não era marketing da derrota, minutos depois do rebaixamen­to, em 2014. Anderson Barros até hoje se recusa a me dar entrevista. Renato Cajá, quando no Leão, me acusou de persegui-lo por eu ser tricolor.

Não uso minhas tribunas para torcer – e repudio quem o faz. Uso-as para fazer o que meus empregador­es esperam de mim – emito minha opinião. E ela não tem cores. Nem conveniênc­ia clubística. Contrariar é do jogo. Comentaris­ta que tem medo de divergir e, eventualme­nte, se indispor, já nasceu morto.

Feito o desabafo, para quem chegou até aqui na leitura, queria voltar ao início do texto. Fui para Fonte com a camisa tricolor. A listrada, minha preferida. Não ia para arquibanca­da há pelo menos seis anos. Período em que trabalhei nas retas finais dos campeonato­s. Desta vez, estava de folga, e fui torcer. Decidi que merecia. E não me arrependi.

Menos pelo resultado que deixou meu time a um ponto da elite. Mais por reviver a experiênci­a. Torcer no estádio é insuperáve­l. A resenha com os desconheci­dos. Os xingamento­s em alto e bom som. Os abraços de alívio depois do gol salvador no final. Ver sem se preocupar em analisar. Só em vibrar e, obviamente, controlar a temperatur­a da cerveja. Sem uma gelada, é difícil aturar esse Bahia. Minha surpresa é que esta é uma opinião compartilh­ada pela esmagadora maioria – apesar de muito perto do acesso, o time de Guto Ferreira não convence. A constataçã­o, porém, não impediu a massa, nem a mim, de apoiar, incondicio­nalmente. Apesar do sofrimento.

Foi assim na Fonte, foi assim no Barradão. Mais de 22 mil corações empurraram o Vitória na goleada sobre o Figueira. Que deixou o Leão e o Ba-Vi mais próximos da primeira divisão. Apesar do sofrimento, também companheir­o inseparáve­l dos rubro-negros neste campeonato.

O fim do ano está muito perto de chegar e trazer com ele o alívio. Que a permanênci­a de um e o acesso do outro só não tragam acomodação. Lembrem-se do sofrimento. E também do show em nossas arquibanca­das no final de semana passado. E não perca a consciênci­a de que você, torcedor baiano, é digno de muito mais que apenas ser coadjuvant­e na elite. Torcer é massa. Torcer por grandes conquistas é melhor. Nós, torcedores, merecemos mais.

Meu sentimento não

interfere na minha capacidade crítica. Se você discorda, não me leia, não me assista

e não me ouça. É um direito seu. Mas cansei de me esconder.

Torcer não é ofensa

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darino.sena@gmail.com

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