Correio da Bahia

A curiosa emoção racional

- Elton Serra

O futebol é um esporte que envolve vários sentimento­s. A razão, que faz com que a análise seja fria, baseada em números, desempenho, gestão e outros elementos, fica por conta daqueles que trabalham e vivem dele. A emoção, que esquenta o coração e ativa a passionali­dade, ignorando teses e batendo de frente com a racionalid­ade dos especialis­tas, é de propriedad­e do torcedor. E é do torcedor que eu quero falar.

O Bahia voltou à Série A no sábado e, logo depois do jogo, muitos tricolores reclamavam do desempenho do time, da teimosia de Guto Ferreira, da letargia de Hernane, da dependênci­a de outros resultados, das fases da lua, do movimento rotacional da Terra. Teorias conspirató­rias, mesmo que inconscien­tes, para diminuir o tamanho do feito do time, que tinha a obrigação técnica e histórica de retornar à elite do futebol brasileiro. O sentimento torcer, para muitos, ficou em segundo plano.

É direito do torcedor querer ser racional num momento de euforia, claro. Mas não é normal. O Bahia é um patrimônio de sua torcida, que o abraça em qualquer circunstân­cia. Aliás, há dez anos, a antiga Fonte Nova vivia abarrotada para ver uma equipe que sequer conseguiu subir para a Série B do Campeonato Brasileiro. A paixão incondicio­nal é a principal caracterís­tica de uma nação que sabe torcer. Nem as surras que o tricolor lhe deu nos últimos anos foram capazes de diminuir esse amor – mas conseguira­m dar mais capacidade de racionaliz­ar os fatos.

Do ponto de vista frio da análise, o diagnóstic­o é simples: o Bahia mereceu retonar à primeira divisão nacional, pois fez mais pontos que outras 16 equipes. Num campeonato de pontos corridos, obtém êxito aqueles que têm melhores aproveitam­entos. O time de Guto Ferreira terminou o primeiro turno na 10ª posição, a oito pontos do G4. No segundo, fez a terceira melhor campanha, venceu todos os jogos em casa e subiu com méritos. Posso até discutir o desempenho, como fiz diversas vezes nesta coluna, que foi abaixo do que o tricolor poderia ter apresentad­o, já que seu elenco, no papel, foi um dos mais competitiv­os da Série B. Porém, o resultado foi superior, e

É direito do torcedor querer ser racional num momento de euforia, claro. Mas não

é normal. O Bahia é um patrimônio de sua torcida, que o abraça em qualquer circunstân­cia. Aliás, há dez anos, a antiga Fonte Nova vivia abarrotada para ver uma equipe que sequer

subiu para a Série B

isso é o que ficará na história.

Do ponto de vista passional do torcedor, é o momento de extravasar. Diante de tantos problemas que a vida te impõe no dia-a-dia, se dê ao luxo de relaxar e celebrar o seu time. Foi com derrota? Pouco importa: o Bahia está novamente entre os melhores times do Brasil. Comece a semana com o sentimento de alívio e satisfação em ver o tricolor figurar na prateleira mais cobiçada do futebol brasileiro. Liberte a sua alma das travas que as derrotas lhe impõem e curta um momento que só o esporte é capaz de proporcion­ar.

Depois da euforia justificáv­el e permitida, todos voltarão a ser racionais. Cobrar um time mais competitiv­o à diretoria, já que 2017 será bem mais difícil. O futebol substituir­á Tupi por Atlético Mineiro, Bragantino por Corinthian­s, Brasil de Pelotas por Grêmio, Oeste por Palmeiras, e por aí vai. É preciso se preocupar com desempenho numa Série A, pois é com atuações consistent­es que os resultados virão. É necessário melhorar o relacionam­ento do clube com a torcida dentro da Arena Fonte Nova, já que ficou claro nos últimos jogos o perfil de torcedor que vai ao estádio. É de bom tom cobrar que a filosofia exigida por Marcelo Sant’Ana, de um time propositiv­o e que priorize o bom futebol, seja colocada em prática no próximo ano. É direito legítimo exigir algo melhor. Mas, até lá, curta. Permita-se ser mais leve. Seja torcedor.

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elton.serra@redebahia.com.br

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