Na própria casa
Para muitos, o Carnaval é sinônimo de liberdade - ou libertinagem, como queiram. Milhares de pessoas aguardam ansiosamente o reinado de Momo chegar para fazer o que não mais será feito durante todo o resto do ano.
Há, porém, aqueles que ficam literalmente encurralados com a chegada da folia. Para essas pessoas, o Carnaval é sinônimo de confinamento. O cárcere é mais intenso para aqueles que moram nas redondezas dos circuitos, como é o caso da família de dona Alderada Couto Oliveira.
Aos 94 anos, mais de 40 residindo na Barra, dona Alderada viu de perto o crescimento da festa e vem sentindo na pele os transtornos da folia nas últimas décadas. A aposentada conta que sair do apartamento na Rua João Pondé é um problema nesses dias.
“Costumo dar uma caminhada pela rua, sair para tomar um sorvete ou mesmo ir fazer meus exames, mas durante o Carnaval não tem como. Fico o dia todo dentro de casa”, conta a moradora.
Durante a folia, dona Alderada é impedida também de ver o namorado, que também mora nos arredores do circuito. “Ele mora no Corredor da Vitória, então é difícil ele vir aqui em casa”, lamenta.
A realidade dela se estende a cerca de 89 mil pessoas. São 61 mil residentes nos bairros da Barra, Ondina, Graça e Vitória, todos próximos ao Circuito Dodô, e 28 mil moradores das proximidades do Circuito Osmar (Centro), de acordo com o censo IBGE 2010, o último disponível por bairros.
Neta da aposentada, a professora de inglês Cíntia Reis, 42 anos, também moradora da Barra, diz que o bairro fica intransitável nos dias de Carnaval. “O trânsito fica horrível, é muita sujeira, muita gente que dorme na rua e para você sair de casa depois de 11h é impossível”, queixa-se. Ela conta que levou 45 minutos para percorrer uma distância de menos de um quilômetro, que vai da entrada do Calabar até a casa dela, no Jardim Brasil.
Ainda de acordo com a moradora, os programas turísticos do bairro também sofrem os efeitos colaterais da festa. “Não dá para ir na praia porque a quantidade de lixo é absurda, tem guardador de carro cobrando até R$ 35 por uma vaga. Além disso, produtos como açaí, tapioca e até mesmo coisas de mercadinho ficam mais caras”, explica.
Porém, o principal fator responsável pelo enclausuramento da família é o aumento da violência. O filho de Cíntia, o estudante Kauan Reis, 16, abriu mão de ver a namorada, que mora no Stiep, ontem, por receio do que poderia acontecer.
“Quando saí de casa vi a movimentação muito grande, os ônibus todos cheios, muita confusão, aí fiquei com receio de pegar o busu”, disse o ado-