Corte de verba da Fapesb afeta 80% das pesquisas
Mais de 80% dos estudos que têm apoio financeiro da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia (Fapesb) estão sem receber recursos com regularidade desde 2015. Sem dinheiro, os pesquisadores são obrigados a cruzar os braços para pesquisas como a que estudaria os efeitos do zika vírus em bebês nascidos de mães expostas à doença, ou a que avaliaria a relação entre o uso de anticoncepcional e os casos de trombose.
Segundo dados da própria fundação, dos 813 projetos apoiados por ela, 652 estão com repasses em atraso. Destes, 539 não receberam nenhuma verba que estava destinada e 113 estão aguardando o pagamento da segunda parcela dos recursos.
Em protesto à situação, o reitor da Universidade Federal da Bahia (Ufba), João Carlos Salles, enviou uma carta dirigida ao governador Rui Costa manifestando sua preocupação com o quadro financeiro da instituição, que dá suporte a mais de 3 mil pesquisadores em toda a Bahia e tem dívida de mais de R$ 70 milhões.
No manifesto, ele exemplifica que os pesquisadores da Ufba tiveram, em 2016, um valor aprovado em projetos que não chega nem a 10% da quantia selecionada em 2015. Ele destaca ainda que “a fundação tem contribuído para o processo de interiorização do ensino superior no estado da Bahia, particularmente apoiando a rede de universidades e institutos, estaduais e federais, disseminados por quase todo nosso território”.
MAIS PROTESTOS
Protestos semelhantes já foram feitos por outras entidades, como o Instituto Gonçalo Muniz, braço da Fiocruz na Bahia, e pela Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), junto com a Academia Brasileira de Ciências (ABC), todos direcionados ao governador Rui Costa (PT).
Na carta conjunta da SBPC e da ABC, de 21 de fevereiro, as entidades destacam o endividamento da fundação.
“A situação já chegou a tal gravidade que a Fapesb se tornou inadimplente com o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), o que a impede de receber aportes federais a exemplo do que ocorreu recentemente com os recursos da repatriação destinados a atividades de ciência, tecnologia e inovação”, destaca.
Procurado através de assessoria, o governador Rui Costa não se manifestou sobre o conteúdo das cartas até o fechamento desta edição, às 23h.
QUEDA
O presidente da Fapesb, Eduardo Almeida, revela que desde 2015 a instituição tem sofrido com o contingenciamento de recursos. “Nossa execução está em torno de 50% a 55% do que éramos para receber. Se tivéssemos com o repasse 100%, seria algo em torno de R$ 100 milhões, R$ 120 milhões”, diz. Ele ressalva que os pagamentos aos 2.750 bolsistas apoiados pela instituição estão sendo honrados.
Segundo ele, o resultado varia de acordo com arrecadação de impostos estaduais, já que o Artigo 5º da Lei Estadual nº 7.888/2001 determina que o governo repasse 1% da Receita Tributária Líquida para a fundação. Porém entre 2014 e 2016 não houve alterações significativas na arrecadação tributária do estado, de acordo com o Transparência Bahia.
Enquanto em 2014 a receita tributária bruta arrecadada foi de R$ 20,251 bilhões, em 2016 subiu para R$ 20,502 bilhões. Quando questionada sobre o cumprimento desse repasse legal, a Secretaria da Fazenda do Estado da Bahia (Sefaz) afirmou, em nota, que “as únicas vinculações de receitas permitidas são aquelas de natureza constitucional, o que não é o caso em pauta”.
A informação divulgada pela Sefaz é de que, em 2016, foram repassados R$ 60,7 milhões para a Fapesb e, deste montante, ainda falta R$ 1,9 milhão a ser quitado. Para o ano de 2017, deve ser repassado um valor semelhante, de acordo com a pasta. Cerca de 80% dos recursos da Fapesb são provenientes de repasses do governo do estado; o restante vem de parcerias internacionais e federais.
O presidente da Fapesb ressalta a importância social da instituição, principalmente para a formação de mestres e doutores, e a contradição que é ter uma redução tão significativa no repasse de verbas.
“Em 2000, a Fapesb não existia e a Bahia tinha 30 projetos de pós-graduação. Oito anos depois da sua fundação, em 2009, a Bahia já contava com mais de 100 programas. “Hoje, a Bahia cresceu, por causa do surgimento de novas universidades no estado. A demanda aumentou e os recursos diminuíram”, comenta.
Eduardo Almeida diz, no entanto, que houve reuniões com a Secretaria de Ciência, Tecnologia e Inovação (Secti) e com a Sefaz para discutir soluções para o problema. Mas ele não disse que medidas seriam tomadas. Procurada, a Secti disse que não iria se pronunciar sobre o assunto.
O médico Mitermayer Galvão Reis, pesquisador ligado à Fiocruz, aponta o prejuízo causado pela suspensão das pesquisas. “Eu faria um apelo ao governador para que os recursos sejam liberados. A Fapesb teve uma importância enorme no desenvolvimento científico no estado”, diz.
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