Patrimônio saqueado
Dois carrinhos de compras estavam estrategicamente posicionados, só aguardando os produtos que seriam transportados. Até então, nada de anormal, se o local de “compras” não fosse o Centro de Convenções da Bahia, administrado pelo governo do estado, que desabou parcialmente em setembro do ano passado. Um dia após ladrões serem flagrados - e liberados - pela polícia, em posse de aparelhos de ar-condicionado do local, o CORREIO flagrou mais saques na manhã de ontem.
Desta vez, três pessoas foram encaminhadas por policiais militares para a 9ª Delegacia (Boca do Rio). Os furtos aconteceram em momentos distintos e até uma picape foi usada pelos ladrões, conforme flagrante feito pelo CORREIO.
De acordo com a delegada Rogéria Araújo, titular da 9ª Delegacia, dois dos três suspeitos foram autuados em flagrante e permanecem detidos. Eles carregavam dois sacos cheios de fios de cobre retirados do local. “Eles vão ser apresentados na audiência de custódia desta terça (hoje) e a Polícia Técnica irá pesar o produto do roubo”, informou a delegada. O terceiro rapaz foi liberado após a polícia constatar que ele não estava com a dupla.
Segundo a delegada, diversas situações de furto têm ocorrido no Centro de Convenções e muitas pessoas que vão até o local não são moradores da região. Os suspeitos detidos ontem, por exemplo, vieram do bairro de São Marcos. “A fama de que o espaço está abandonado e com fácil acesso já se espalhou pela cidade e por isso está havendo uma mobilização de pessoas se dirigindo pra lá. Os detidos tomaram conhecimento por outras pessoas de que lá havia muito cobre”, disse Rogéria.
FLAGRANTE
Por volta de 11h da manhã de ontem, um grupo de quatro homens e duas mulheres se amontoava em frente à entrada principal do Centro de Convenções, que dá para a Avenida Octávio Mangabeira. Alguns deles estavam de fardas escolares e se preparavam para entrar no local e encher os dois carrinhos de supermercado. Ao perceber que eram acompanhados e registrados pela equipe do CORREIO, desistiram da ação e rapidamente se espalharam. Em nenhum momento a reportagem viu movimentação de seguranças próximo à entrada principal.
Cinco minutos depois, uma caminhonete estacionou de ré entre um jardim do Edifício Belavista e o Centro de Convenções. Em seguida, uma movimentação de pessoas tornou-se intensa. O vaivém por cima dos muros do prédio abastecia a carroceria do veículo. Umas cinco pessoas recolhiam fios de cobre. A ação não durou mais que cinco minutos e a caminhonete saiu abarrotada de fios.
Cerca de meia hora depois, um novo grupo se aproximou do local. Desta vez, em número bem maior: 15 pessoas. Uma parte se concentrava na Rua Anquises Reis, a cerca de 200 metros de distância, e chegou a ser abordada por uma guarnição da 39ª CIPM que passava na hora. “Apenas revistamos. Como não havia nenhum produto de furto, foram liberados”, contou um policial.
A guarnição voltou após receber um chamado e se deslocou para o fundo do Centro de Convenções. Lá havia dois seguranças que liberaram o acesso dos PMs. Eles foram recebidos por Geovane Luiz, um preposto da Setur. Enquanto conversavam, novos furtos eram realizados nas imediações da entrada principal.
“Olha lá, olha lá eles”, gritou um policial para o outro, e ambos entraram na viatura e foram às pressas à caça dos saqueadores. O CORREIO acompanhou tudo. Os policiais surpreenderam os dois jovens, ambos com sacolas cheias de cobre. “Ia vender para o ferro-velho. Estou só fazendo um ‘corre’. Não tenho trabalho”, justificou um dos rapazes, com as mãos levadas à cabeça. “É melhor estar fazendo isso, do que estar envolvido no tráfico (de drogas). Coloquei vários currículos em supermercados, mas todos exigiam o primeiro grau completo e eu ainda estudo”, disse o outro rapaz, que teve o argumento rebatido por um dos policiais: “Furto é furto. Já pensou se todo mundo fosse furtar, roubar e matar porque está sem trabalhar? Isso não justifica”. Os dois rapazes são moradores do Lobato, no Subúrbio Ferroviário.
FERRO-VELHO
Enquanto a guarnição conduzia os jovens para a 9ª Delegacia, outra equipe de policiais fez mais um flagrante: Ubiraci da Silva Paixão, 40 anos, foi pego com um carrinho de mão cheio de metais e cobres. “Ele pegou materiais do Centro de Convenções. São carcaças, mas são do imóvel”, disse o major Edson Lima. Ubiraci foi detido quando passava pela Rua Baltazar Sodré em frente à localidade conhecida como Baixa Fria, onde há pontos de comércio de ferro-velho.
Moradores da região disseram que os furtos são diários. “Como vocês constataram, isso é toda hora. A gente fica besta. Da minha janela vejo tudo. Eles furtam na maior cara dura”, disse uma moradora, sem se identificar. “Eles sabem que a polícia não pode ficar 24 horas num local. Basta a viatura sair para acontecer novamente”, contou outro.
O CORREIO constatou que qualquer um pode entrar no Centro de Convenções, basta querer. A equipe de reportagem teve acesso a um dos caminhos usados por pessoas não autorizadas, ultrapassou uma fresta das barreiras e teve acesso a um dos estacionamentos. No local, encontrou um carro depenado. A única coisa que restou foi a carcaça e os pneus. Mais à frente, um salão. A entrada tem vidros quebrados, sujeira e resto de fiações à mostra – indícios de que os ladrões de cobre passaram também por ali.
CORREIO flagrou cenas de furto de cobre e outros objetos do imóvel