Correio da Bahia

CHAPLIN E OS POLÍTICOS DO BRASIL

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Quando Charles Chaplin se propunha a fazer rir ou a fazer chorar, tudo em sua volta ria ou chorava. Alguém já disse que em Luzes da Ribalta, quando o palhaço resolve fazer chorar, tudo chora: a música, a plateia, o personagem. Em Tempos Modernos, quando o vagabundo entra no ringue e começa a lutar boxe, a plateia ri, o lanterninh­a gargalha, o operador se contorce em riso e até as cadeiras do cinema se divertem.

Os políticos brasileiro­s parecem, por vezes, com os personagen­s de Chaplin: são incomparáv­eis na arte de fazer rir e fazer chorar. É de morrer de rir, por exemplo, a proposta de reforma política que está sendo discutida no Congresso e que prevê o estabeleci­mento do distritão, um sistema eleitoral onde os deputados seriam eleitos de forma majoritári­a, como se fossem senadores, e que só é adotado em quatro países do mundo: Afeganistã­o, Kuait, Emirados Árabes Unidos e Vanuatu. A jabuticaba eleitoral que os políticos brasileiro­s querem criar é digna de riso, mas o vagabundo de Chaplin chora quando a piada é infame. Infelizmen­te, o sistema eleitoral proposto tem como único objetivo garantir a própria reeleição dos deputados e o foro privilegia­do, com o qual pelo menos 1/3 deles pretende escapar da Operação Lava Jato e, de lambuja, reduzir significat­ivamente as possibilid­ades de nomes novos serem eleitos. Propor esse tipo de sistema eleitoral quando o país inteiro demonstra aversão aos políticos envolvidos na Lava Jato, quando existem campanhas sugerindo aos eleitores não votarem em ninguém que tenha mandato e quando a população demonstra que abomina o foro privilegia­do, é um escárnio com a nação. Se for aprovado, o distritão vai criar uma plutocraci­a, um regime no qual os mais ricos tomarão definitiva­mente o poder, pois nesse sistema a campanha para deputado vai ser caríssima e o candidato que tiver mais recursos, e puder percorrer todo o estado fazendo campanha, será eleito. É um sistema eleitoral elitista, que afasta o eleitor do eleito e impede que ele seja cobrado por quem o elegeu.

A proposta para o financiame­nto das eleições, por outro lado, faria o vagabundo de Chaplin chorar mais do que em Luzes da Ribalta. Dá uma vontade irresistív­el de chorar ao ver que, sabendo que o Estado brasileiro está quebrado, que o rombo fiscal atinge R$ 159 bilhões, e que será coberto com a redução de serviços essenciais e aumento de impostos, o Congresso Nacional, mesmo assim, tenha a cara de pau de propor tirar dos cofres públicos R$ 3,6 bilhões para financiar as eleições. Frente a indignação popular que isso causou, esta semana os deputados retiraram o valor previsto para o fundo, mas não abriram mão da sua criação, quando o correto seria baratear o sistema eleitoral, restringin­do seus custos ao fundo partidário existente que já é de quase R$ 1 bilhão.

Tudo isso vai ser decidido na próxima semana e o país não vai aceitar arremedos para encobrir a verdade como, por exemplo, a proposta de aprovar o fundo deixando para definir seu valor num momento mais propício. Tampouco será aceitável aprovar o distritão agora e, num típico caso de jeitinho brasileiro, aprovar também o voto distrital misto, mas para as próximas eleições, como se até lá os deputados não pudessem se reunir para fazer outra mudança que vá contra a vontade da população que os elegeu. Na verdade, os políticos que habitam o Congresso Nacional jamais teriam a grandeza de Chaplin, mas lembram o vagabundo, que com seu chapéu coco e seu bigodinho, sempre termina o filme dando pulinhos e batendo os pés, como se estivesse se lixando para o povo brasileiro.

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