Como nossas mães
As últimas semanas foram agitadas no cenário da música popular brasileira. Não faltaram lançamentos nos mais diversos estilos e preferências musicais. Anita e Pabllo Vittar jogaram muita areia pra cima com o lançamento do clipe gravado no deserto do Saara, Sua Cara’. Dias depois, Claudia Leitte fez muito agachamento para lançar Baldin de Gelo e Ivete Sangalo abusou de figurinos coloridos e usou o Fantástico para divulgar sua parceria com Wesley Safadão. Houve também o retorno de Chico Buarque, o primeiro show, em São Paulo, do projeto Trinca de Ases, que reúne Gal Costa, Gilberto Gil e Nando Reis, e o retorno dos Tribalistas, após 15 anos do primeiro álbum. Independente do estilo, todos os lançamentos causaram muita repercussão.
Desde o primeiro lançamento dos Tribalistas, muita coisa mudou na forma como ouvimos e consumimos música. Os CDs e LPs tornaram-se peças de colecionadores, cada vez mais escutamos música em equipamentos individuais e portáteis. Parece não ter mudado as emoções que a música é capaz de nos causar, as reações que sentimos ao ouvir nossos artistas preferidos e nos identificarmos com ritmo, letra e melodia. Afinal, o que nos faz gostar das músicas que gostamos? Há alguma razão que vá além da subjetividade do gosto musical?
Estudo realizado pela pesquisadora Alexandra Lamont (Keele University) tentou esclarecer a origem de nossas primeiras preferências musicais. Sabe-se que o sistema auditivo do feto está em funcionamento desde a 12ª semana de gestação. Drª Alexandra estudou um grupo de bebês cujas mães, no último trimestre da gestação, escutaram músicas de diferentes estilos (Mozart, Vivaldi, UB40, Backstreet Boys...). Após um ano do nascimento, e sem que os bebês tivessem ouvido a mesma música durante esse período, eles foram expostos novamente à mesma música e monitorados em um ambiente controlado, em laboratório. Através das reações dos bebês que dirigiam a face e o olhar para o lado de onde ouviam a música que a mãe escutou durante a gestação foi possível observar que havia uma preferência musical; eles preferiam aquela música à qual já haviam sido expostos durante a gestação. Em um grupo controle formado por bebês que não haviam sido expostos a música não foi possível observar qualquer sinal de preferência musical. O estudo indica que nossa memória musical tem início na fase pré-natal, na vida intrauterina, e pode ser codificada e acessada mesmo antes do desenvolvimento da linguagem.
Segundo Drª Lamont, nossas primeiras preferências musicais são formadas antes de nosso primeiro choro. Parafraseando Belchior, inicialmente ouvimos música “como nossas mães”. Após o segundo ano de vida as preferências passam por influências culturais em um processo que se mantém durante toda a vida com a criação de novas memórias musicais que nos levarão a gostar, ou não, de Anita, Pabllo, Claudia, Ivete, Chico, Gil, Marisa...