‘Há múltiplos indícios de delitos’, diz ministro
MILLER SOB SUSPEITA
O escritório de advocacia Trench Rossi Watanabe encaminhou à Procuradoria-Geral da República (PGR) documentos internos que mostram que Marcello Miller atuou para o grupo J&F antes mesmo de se desligar do cargo de procurador da República, informou o procurador-geral da República, Rodrigo Janot.
A informação consta no pedido formulado por Janot para que o empresário Joesley Batista, dono do grupo J&F, o executivo Ricardo Saud e Miller fossem presos. O ministro Edson Fachin, relator do caso, atendeu ao pedido de prisão temporária de Joesley e Saud, mas não de Miller.
Segundo Janot, no dia 6 de setembro deste ano, atendendo a um pedido feito pela PGR, o escritório Trench Rossi Watanabe encaminhou o material referente a uma investigação interna envolvendo a atuação de Miller no escritório. “Entre os documentos apresentados constam elementos de que, antes de março do corrente ano, Marcello Miller já auxiliava o grupo J&F no que toca o acordo de leniência firmado pela empresa com o Ministério Público Federal”, ressaltou o procurador-geral da República.
Janot diz que há trocas de e-mails entre Miller e uma advogada da J&F, “em época em que ainda ocupava o cargo de procurador da República, com marcações de voos para reuniões, referências a orientações à empresa J&F e inícios de tratativas em benefícios à mencionada empresa”. O envolvimento de Miller com a J&F é um dos principais pontos questionados pela defesa do presidente Michel Temer. O executivo Ricardo Saud, delator da JBS, disse em depoimento na quinta-feira à Procuradoria-Geral da República (PGR) que gravou conversa com o ex-ministro da Justiça José Eduardo Cardozo (PT) e enviou o áudio para o exterior. A informação consta do pedido de prisão dele, de Joesley Batista e do ex-procurador Marcello Miller, feito pelo procurador-geral, Rodrigo Janot. Saud e Joesley estão presos temporariamente.
Segundo a PGR, conversas como a de Cardozo “não apenas deixaram de ser entregues ao Ministério Público Federal como foram levadas ao exterior, em aparente tentativa de ocultação dos arquivos das autoridades”.
Segundo o documento da PGR, Saud contou aos procuradores sobre um jantar com Marco Aurélio Carvalho, sócio de Cardozo, na casa de Joesley Batista, no Jardim Europa, em São Paulo. De acordo com Saud, Marco Aurélio lhe disse que Cardozo voltaria a advogar e que a empresa precisava de alguém da área de compliance, e que então marcaram um encontro com Cardozo na casa de Joesley.
Esse encontro foi gravado, disse o executivo.
Saud diz que relatou essa conversa a Marcello Miller, “inflando o máximo” possível “para ver qual seria a reação” e o avisou que gravaria o senador Ciro Nogueira (PP-PI). O executivo disse ainda que contou a Miller que gravou Cardozo e que ouviu do ex-procurador “que aquilo daria cadeia, que iriam para cima dele, depoente, e José Eduardo Cardozo”. Depois dessa conversa, Miller saiu da sala e mandou mensagens pelo celular, disse Saud, acrescentando que achou aquilo estranho.
Cardozo declarou ontem que soube “com indignação” que os executivos do grupo J&F, Joesley Batista e Ricardo Saud, tentaram criar uma “armadilha” na reunião em que discutiram a contratação dos serviços de seu escritório, o CM Advogados. Segundo Cardozo, também causou surpresa a afirmação de que Joesley teria celebrado um suposto contrato fictício com seu atual sócio, o advogado Marco Aurélio Carvalho, que previa pagamentos por supostos serviços do petista. Ao decretar a prisão temporária – por cinco dias – dos delatores da JBS Joesley Batista e Ricardo Saud, o ministro Edson Fachin destacou que os próprios executivos do grupo confessam uma rotina de crimes contra a administração pública. No despacho em que acolheu parcialmente pedido da Procuradoria-Geral da República, Fachin assinalou que “quanto aos colaboradores Joesley Batista e Ricardo Saud, são múltiplos os indícios, por eles mesmos confessados, de que integram organização voltada à prática sistemática de delitos contra a administração pública e lavagem de dinheiro”.
Fachin suspendeu os benefícios concedidos aos delatores atribuindo a eles revelações “seletivas”.
O ministro assinalou que “em liberdade, os colaboradores encontrarão os mesmos estímulos voltados a ocultar parte dos elementos probatórios, os quais se comprometeram a entregar às autoridades em troca de sanções premiais, mas cuja entrega ocorreu, ao que tudo indica, de forma parcial e seletiva”.
Joesley Batista e Ricardo Saud chegaram a Brasília ontem às 15h30 à Superintendência da PF sem passar pelo Instituto Médico Legal (IML) , e foram recebidos com protestos e rojões.
Os delatores a princípio teriam decidido que não passariam por exame no IML, mas mudaram de ideia e foram encaminhados ao instituto no final da tarde de ontem, onde ficaram por cerca de meia hora antes de voltarem para a carceragem.
Como são prisões temporárias, eles devem ficar presos, pelo menos, até a próxima sexta. As detenções, no entanto, podem ser prorrogadas ou transformadas em preventivas.