Correio da Bahia

Ambiente de trabalho com risco extremo

- Alexandre.lyrio@redebahia.com.br

O local é repleto de riscos à saúde e à vida das mulheres: instalaçõe­s elétricas ficam próximas à produção da cachaça; 24 irregulari­dades trabalhist­as foram identifica­das. O barulho incomoda. Vem de um tanque de metal, um processado­r que mistura água e açúcar. Disjuntore­s e fios à mostra estão próximos a pequenas garrafas pet e mangueiras que contêm cachaça. O cheiro forte enjoa. De chinelos, saias e vestidos, elas não usam qualquer tipo de proteção, com exceção de algumas luvas, que, mesmo assim, não são usadas por todos os funcionári­os: cinco mulheres e um recém-admitido.

O lugar, sujo e improvisad­o, aparece em imagens de vídeo registrada­s há pouco mais de 20 dias pelo CORREIO. Com câmeras escondidas, a reportagem entrou no galpão onde funciona a produção da Indústria e Comércio de Vinho Veleiro de Ouro, como é registrada a empresa. A denúncia era de que o dono de uma fábrica de bebidas alcoólicas submetia mulheres a condições degradante­s de trabalho. Apesar do nome, a fábrica é de cachaça. E fica instalada em uma rua deserta no bairro de Ilha Amarela, Subúrbio Ferroviári­o.

Nila, Natércia, Elizete e Maude, nomes fictícios com os quais identifica­remos quatro das cinco mulheres, afirmaram que trabalham há anos sem férias, não podem ir ao médico sem ter o dia “cortado”, recebem R$ 400 por quinzena e são obrigadas a enfrentar um ambiente insalubre sem qualquer Equipament­o de Proteção Individual (EPI).

Entre elas está a própria esposa do dono da fábrica. A quinta funcionári­a, Leonice de Souza, 47 anos, não só autorizou a divulgação do seu nome como pediu para ele ser incluído na reportagem. “Quero usar como prova na Justiça para ter meus direitos”, disse ela. Há oito anos em múltiplas funções na Veleiro de Ouro, Leonice conta que não sente mais cheiro. Acredita que seu olfato está prejudicad­o pelo fato de trabalhar sem máscara em um ambiente sem ventilação e com forte odor de álcool.

Com diversos problemas de saúde, Leonice diz que sequer podia ir ao médico, senão R$ 30 eram abatidos do seu salário. “O patrão não aceita quando a gente precisa ir no médico. Quando libera, corta o dia”. Ela e as outras confirmara­m que trabalham sem EPIs. “A farda ele não dá. Na hora de tampar a cachaça, espirra no corpo. Não tem óculos, não tem máscara. Fico com os pés dentro da cachaça. Precisa de bota. Às vezes falta luva. Hoje em dia eu já nem sinto mais cheiro. Consumi tudo cheirando a cachaça.”

TOP CANA

No mercado de Salvador e de Feira de Santana, onde o único produto fabricado pela Veleiro de Ouro é comerciali­zado, a empresa utiliza o nome fantasia Top Cana. Nos registros da Serpro, a Top Cana é de propriedad­e de Genival Cintra Pinheiro. Após analisar as imagens registrada­s pelo CORREIO, o Ministério Público do Trabalho (MPT) realizou operação no local e identifico­u nada menos que 25 irregulari­dades trabalhist­as. As atividades da empresa foram suspensas (veja mais ao lado).

Ainda segundo as trabalhado­ras, a fábrica chega a envasar 6 mil litros de aguardente por dia. “É muita cachaça que a gente envasa. Às vezes, a gente envasa seis tanques de mil litros no dia. É muita garrafa para uma pessoa só ficar no pé da máquina tampando todos os dias”, denuncia Leonice.

Não há funções definidas. Leonice explica que todas as funcionári­as fazem de tudo. “Eu empacoto, eu tampo, eu

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