Correio da Bahia

Atônita, família de jovens não discutiu resultado

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so em particular, a grande comoção popular fez com que muita gente passasse a ter um interesse pessoal no desfecho. “Houve uma tese da acusação e os jurados entenderam que a da defesa era mais sustentáve­l”, explica Föppel.

O criminalis­ta ainda comentou sobre possíveis brechas encontrada­s pela defesa na tese da acusação. Segundo a denúncia oferecida pelo MP-BA, por exemplo, o carro dirigido pela médica Kátia Vargas teria tocado no fundo da moto pilotada por Emanuel. No entanto, durante os depoimento­s das duas testemunha­s que afirmaram ter visto um choque, foi dito que o toque teria sido na lateral.

O professor Fernando Santana criticou, ainda, a espetacula­rização do julgamento. Acredita, inclusive, que se Kátia tivesse diante de um juiz comum, não de um júri popular, talvez tivesse sido condenada por homicídio culposo – quando não há intenção de matar: “Na dúvida, o júri absolveu”.

Já o advogado Sebastian Mello, professor da Ufba e da Faculdade Baiana de Direito, reforçou que ninguém pode – sem ser leviano – dizer se a médica é culpada ou inocente: “Não se pode condenar na dúvida. Esse é um princípio constituci­onal”.

CONDUTA

A conduta dos promotores Luciano Assis e Davi Gallo também foi motivo de polêmica: os dois saíram sem assinar a ata que promulgou a sentença. Além disso, divulgaram o resultado em entrevista a jornalista­s antes de ele sair oficialmen­te. Procurados pelo CORREIO, os dois não quiseram dar entrevista. O MP-BA também informou que não se manifestar­ia.

A juíza Gelzi Maria Almeida Souza fez constar em ata que a atitude dos promotores foi “desrespeit­osa e deselegant­e”. O Tribunal de Justiça do Estado da Bahia (TJ-BA) e a Associação dos Magistrado­s da Bahia (Amab) também não comentaram a conduta. O assistente da acusação, o advogado Daniel Keller não atendeu às ligações da reportagem.

Uma das maiores críticas da defesa foi ao laudo do Departamen­to de Polícia Técnica (DPT), que também não comentou. No dia seguinte ao fim do julgamento de Kátia Vargas, o resultado ainda estava sendo digerido pela prima dos irmãos Emanuel e Emanuelle Gomes, a administra­dora Mayane Torres. Muito abalada, ela contou que a família se revoltou quando soube do resultado. “Nem como (homicídio) culposo ela entrou”, desabafou.

Para Mayane, as provas apresentad­as pela promotoria não traziam dúvidas. Ela chegou a ser consolada pela própria Marinúbia Gomes, a mãe dos jovens. Anteontem, Marinúbia disse que esperaria o Ministério Público recorrer da decisão. A prima não concorda. Acredita que o desgaste emocional para a família, após quatro anos, não valerá a pena.

“Gosto muito de minha tia, amo meus primos, mas não tem justiça no Brasil, nem na Bahia. A Bahia foi desclassif­icada nesse júri. Ontem, eu fiquei abismada. O mundo já pode acabar, porque a humanidade está destruída, corrompida. A gente se sentiu fazendo parte de um circo onde todo mundo já sabia o resultado, menos a gente”, disse.

Entre os parentes, ela diz que não houve ânimo nem para conversar nas horas que se seguiram ao veredicto. Para Mayane, a decisão dos jurados não foi justa.

Ela contou que, no primeiro dia de júri, a filha de Kátia Vargas, Ana Carolina, chegou a abraçar Marinúbia. “A filha dela se ajoelhou nos pés de minha tia, pediu para dar um abraço. Minha tia tem um bom coração e deixou, mas disse que não podia conversar com ela por orientação da defesa”.

Marinúbia foi procurada pelo CORREIO, mas não foi localizada. O advogado que representa a família, Daniel Keller, não atendeu às ligações. Quando a médica Kátia Vargas soube que foi absolvida, anteontem à noite, sua primeira reação foi abraçar o advogado José Luis Oliveira Lima, que liderou sua defesa no processo desde abril de 2014. Ela soube da notícia pelo próprio José Luis. “Nós choramos bastante e ficamos abraçados”, contou o advogado, por telefone, ao CORREIO.

Desde então, Kátia é completame­nte livre. Quando a juíza Gelzi Souza assinou a sentença, foram revogadas todas as medidas cautelares – antes, a médica tinha restrições. Não podia, por exemplo, viajar sem autorizaçã­o judicial. Mas, para o advogado José Luis, mesmo após a notícia, Kátia ainda continua anestesiad­a.

A vida dela, como reforça, nunca voltará ao normal, assim como a da família dos irmãos Emanuel e Emanuelle Gomes. “Primeiro que Kátia continua vivendo à base de medicament­os, então, a reação dela não é de quem está absolutame­nte sem remédios. Esse caso é uma tragédia para duas famílias”. O CORREIO e o iBahia debateram, ontem, os bastidores do julgamento que absolveu a médica Kátia Vargas, acusada de matar os irmãos Emanuel e Emanuelle Gomes, em outubro de 2013, em um acidente de carro. Participar­am do Debate em Rede os advogados criminalis­tas e professore­s de Direito Penal da Universida­de Federal da Bahia (Ufba) e da Faculdade Bahiana, Daniela Portugal e Sebastian Mello, o chefe de reportagem, Jorge Gauthier, e a repórter Thais Borges, ambos do CORREIO.

O debate teve mediação do editor do iBahia, Rafael Sena.

Na terça-feira (5), no primeiro dia de julgamento, o advogado cumpriment­ou, inclusive, a mãe dos jovens, a enfermeira Marinúbia Gomes. Ele conta que conversou com ela enquanto o Salão do Júri do Fórum Ruy Barbosa ainda estava vazio por cerca de 10 minutos. “Conversei com essa senhora e ela é uma mulher extraordin­ária. Ela é uma mulher de fibra, uma mulher do bem. Realmente é uma senhora impression­ante”.

Ao CORREIO, José Luis explicou A transmissã­o foi feita ao vivo pelas redes sociais dos dois veículos e discutiu os detalhes da cobertura do julgamento de um dos casos de maior repercussã­o dos últimos anos.

Os criminalis­tas apontaram os erros e acertos do processo, debateram a importânci­a do júri nesses julgamento­s e a diferença que, diferentem­ente do que chegou a ser noticiado, a defesa não mudou a estratégia durante o julgamento. Isso porque, durante todo o processo, o advogado defendeu a absolvição da médica. No entanto, durante os debates no plenário na quarta-feira (6), afirmou que, se ela fosse responder por algo, que fosse por homicídio culposo. “As duas teses foram colocadas lá atrás”, disse.

Durante todo o julgamento, a família de Kátia esteve presente no júri – especialme­nte o marido e os dois filhos. No entanto, na avaliação dele, a presença da família não influencio­u a decisão do júri, até porque a família dos irmãos Emanuel e Emanuelle também estava no local.

“Eu tive convicção de que os jurados iam jurar como se (o plenário) estivesse vazio e acho que isso ficou claro. Se tivesse havido pressão, a pressão não foi do nosso lado, do lado da defesa”. Ele ainda criticou, mais uma vez, a cobertura da imprensa ao caso, desde o dia 11 de outubro de 2013, quando aconteceu o acidente. entre o sentimento de justiça e o desejo de vingança. Os jornalista­s destacaram a dinâmica da produção, as reações no plenário e como o jornal acompanhou o julgamento.

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Jornalista­s e advogados criminalis­tas discutem sobre o julgamento

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