O BUNKER DE TEMER DERRETEU
Nenhum governo admite que pode perder uma votação no Congresso, mas, ainda assim, eles se diferenciam no grau de seriedade com que administram seus receios. Desde o início da tramitação da reforma da Previdência, o bunker do Palácio do Planalto, sob a regência de Temer com os ministros Moreira Franco, na flauta, Eliseu Padilha, no clarinete, e Henrique Meirelles, na tesouraria, seguiu em duas linhas. Primeiro dizia que o projeto, cheio de bodes, era intocável. Patranha, mas vá lá. Depois, inventou prazos. Até a tarde fatídica em que o país soube do grampo do Jaburu, o limite de 2017 parecia plausível. Depois do grampo, a prioridade do bunker passou a ser apenas salvação do mandato de Temer.
Tudo acabou num episódio de pastelão, com o senador Romero Jucá dizendo que a votação estava adiada para o próximo ano, sendo imediatamente desmentido por uma nota do Planalto. No dia seguinte veio o reconhecimento de que o jogo está adiado para fevereiro.
Nesse clima de barata-voa, chegou-se até ao ardil de pedir ao empresariado que pressionasse os parlamentares. Temer, Moreira, Padilha e Meirelles sabem perfeitamente que, a esta altura, se um empresário ligar para seu deputado levará uma facada em nome da campanha do ano que vem.
A capacidade de mentir do Planalto é infinita, mas ela deve ser calibrada pelo risco de se perder crédito até mesmo quando se diz a verdade. O bunker violou essa norma. Se num dia ele diz que Jucá está errado e, no outro, informa que a saúde do presidente vai bem, obrigado, no que se pode acreditar?
A presepada pode alegrar a maioria dos brasileiros que não confia no governo, mas ela em- bute um perigo. O derretimento do bunker pela aritmética da falta de votos e pela má qualidade de suas lorotas arrisca expandir-se. A contaminação de um governo fraco e impopular num ano de sucessão presidencial radicalizada adiciona à confusão uma instabilidade perigosa e desnecessária.