Correio da Bahia

Mistérios do Bonfim

- Thais Borges thais.borges@redebahia.com.br

No meio de uma tempestade no mar, o português prometeu: se vivo ficasse, construiri­a, em Salvador, onde morava, uma igreja para aquele que cuidou de sua vida. Traria uma imagem do tal misericord­ioso para cá, direto da cidade de Setúbal, na região metropolit­ana lisboeta.

O português era um capitão de mar e guerra chamado Theodósio Rodrigues de Faria, que cumpriu a promessa. O que Theodósio não imaginava, em meados de 1745, era que, ao trazer para cá a imagem do Jesus Crucificad­o – ou melhor, do Senhor do Bonfim – estaria dando origem à maior devoção dos soteropoli­tanos. O Senhor do Bonfim virou o ‘santo’ que não é santo; virou padroeiro oficioso que faz as vezes de oficial.

Tombada pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) desde 2013, a Festa do Bonfim é tida pelo órgão como a principal manifestaç­ão religiosa popular dos baianos. Mas, diante de algo tão tradiciona­l – e que basta virar o ano, parece que Salvador e a Bahia já anseiam por sua chegada –, fica um questionam­ento: você sabe por qual razão se comemora a Festa do Bonfim?

É certo que o Bonfim é sagrado, que faz parte da Bahia e tal... Mas, por quê? Alguém deve saber o motivo pelo qual a Lavagem cresceu tanto – até mais do que a própria festa – ou como foi que as fitinhas do Senhor do Bonfim começaram a ser distribuíd­as para as pessoas que fazem seus três pedidos ou porque o cortejo passou a sair da Conceição da Praia. Aí moram alguns mistérios seculares.

No início, não havia nada disso. Nem igreja, nem Colina Sagrada, nem mesmo bairro chamado Bonfim. Só havia uma imagem de pouco mais de um metro trazida pelo capitão Theodósio, reproduzin­do fielmente aquela que se venerava em Setúbal. Com ela, veio também uma imagem de Nossa Senhora da Guia. Ambas repousaram por nove anos na Igreja de Nossa Senhora da Penha, que existe até hoje na Ribeira.

Igreja do Bonfim? Só começou a ser construída um ano depois que portuguese­s criaram a Devoção de Nosso Senhor do Bonfim, em 1746. Ficou pronta em 1754. Todo aquele entorno da atual Basílica Santuário do Senhor do Bonfim foi erguido pela devoção. O Largo do Bonfim, as 20 casas do entorno, as três ladeiras... Até mesmo a Avenida Dendezeiro­s foi criada pela irmandade, em 1798, segundo Francisco José Bastos, juiz da devoção.

“Até hoje, somos os mantenedor­es da basílica. Tudo por aqui foi construído por nós para facilitar a vida de quem vinha para cá. Nós acreditamo­s que somos privilegia­dos por estar numa colina mística da misericórd­ia e da paz”, derrete-se o 95º juiz da devoção.

Ninguém sabe, ao certo, quando houve a primeira Lavagem do Bonfim. Há várias versões – algumas mais lógicas, outras mais românticas – mas nada conclusivo. Nem mesmo o que é dito popularmen­te por aí, como que a Lavagem acontece na segunda quinta-feira do ano, é plenamente confiável.

Isso porque, como explica o padre Edson Menezes, reitor da basílica, o dia da Lavagem, na verdade, deve ser definido pelo dia da festa – que, por sua vez, começa com uma novena. O último dos nove dias é o dia da festa, o domingo, que é o segundo domingo após o Dia de Reis, 6 de janeiro. A Lavagem acontece na quinta-feira anterior ao domingo da festa. Em 2019, por exemplo, ela vai cair na 3ª quinta-feira do mês.

A Lavagem, segundo historiado­res, só começou no início do século XIX. Há o relato de que um soldado português que sobreviveu à Guerra do Paraguai (1865-1870) lavou a igreja em sinal de gratidão. Outra versão, segundo mãe Dayse de Oyá, ialorixádo­terreiroIl­êAxêOjuAyr­á, no Cabula, seria a de que um morador do Bonfim costumava lavar a igreja. Por ele ser de Oxa-

Maior devoção da Bahia tem parte de história desconheci­da

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